Há dez dias, a revista britânica “The Economist” chamou o presidente do Brasil de “BolsoNero”. O apelido resume o espanto global com o homem que governa o maior país da América Latina. Enquanto o mundo faz um esforço de guerra contra o coronavírus, o capitão insiste em tratar a pandemia como uma “gripezinha”, a ser curada com jejum, reza e declarações amalucadas.
Ontem Bolsonaro indicou que assumiria de vez o papel de piromaníaco. Ele riscou o fósforo no início da tarde, ao comunicar aliados que pretendia demitir o ministro da Saúde. Quando os bombeiros conseguiram conter o incêndio, o presidente já tocava harpa diante das labaredas.
Mandar Luiz Henrique Mandetta para casa significaria atear fogo às próprias vestes. Embora Bolsonaro o veja como ameaça, o ministro é quem ainda empresta alguma credibilidade a seu governo. Numa equipe repleta de aloprados e bajuladores, ele se destaca pela serenidade e pelo apego à ciência.
Na comparação com o chefe, o ex-deputado pantaneiro ganhou porte de estadista. Pesquisas mostram que ele já se tornou mais popular que o presidente. Ontem a notícia de sua possível demissão interrompeu a alta da Bolsa, freou a queda do dólar e antecipou o horário do panelaço.
Ao jogar Mandetta na fogueira, Bolsonaro não arrisca só a popularidade. O ministro costurou uma ampla rede de apoio, que une Congresso, Judiciário e setores do governo e da sociedade. Uma demissão humilhante teria potencial para mobilizar essas forças contra o Planalto. No limite, poderia custar o fim antecipado do mandato presidencial.
Para azar do capitão, a permanência do ministro não estanca sua sangria. Aos olhos dos políticos, Bolsonaro terminou o dia ainda mais esvaziado. Ele virou um presidente que não preside: ameaça demitir e não demite; anuncia que não tem medo de usar a caneta e refuga diante do papel.
Ainda há quem se anime a dançar ao som desta música. No domingo, o ministro da Educação voltou a ofender a China com um tuíte racista. Além de ser o maior parceiro comercial do Brasil, o país produz mais de 90% dos equipamentos que faltam aos hospitais. A irresponsabilidade de Bolsonaro e sua turma não produz apenas tumulto e vergonha. Também põe em risco as vidas dos brasileiros.
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