quarta-feira, 30 de setembro de 2020

"Biquínis da Discórdia" (Felicio Vitali)


Eis o lugar certo para essa gente!!!

Algumas coisas eu pensei que nunca mais iria ouvir, principalmente depois que o país saiu da nefasta ditadura militar. Mas duas delas foram ditas no final de semana que passou. 

A primeira foi: "Atentado ao Pudor". Tão velha que errei ao digitar e o corretor não soube corrigir e manteve "atentado ao pudir". 

A última vez que ouvi isso foi nos idos anos 70, quando Leila Diniz, em avançada gravidez, ousou, indo de biquíni à praia de Ipanema, para o horror das falsas moralistas das ratazanas de sacristia. 

A segunda frase foi: "Só converso com quem tem Berço". Caramba, então o cara deve passar o tempo todo numa creche ou numa loja de móveis? 

O interessante é que as duas frases foram ditas nas duas confusões em bairros "daselites" carioca e paulistana. 

Na confusão carioca, uma arquiteta simplesmente sentiu-se ultrajada e com direito a agredir fisicamente, com uma garrafa d'água e verbalmente com acusações de prostituição, uma moça que trafegava com um casal num carro conversível. As duas moças estavam de biquínis, ouviam música alto e também falavam alto. Sem dúvida, causando e aparecendo. 

Parece que chegaram a se beijar, o que provocou a ira descontrolada da arquiteta, que alega que só " queria proteger as duas crianças e os idosos que estavam com ela numa mesa de bar(?)". 

Eita!! Gurizada deste novo velho "brazil" varonil, mulheres de biquínis se beijando é feio, viu? Bonito mesmo é levar crianças ao bar à noite, provocar, xingar, jogar garrafas, sair no tapa e levar uma “trozobada” no pé da orelha. Tá combinado? 

Bem, é bom que se diga, que isso aconteceu em pleno bairro do Leblon, até então, penso que outrora foi reduto carioca da boemia, frequentado por formadores de opinião de tendências progressistas. 

Já a segunda frase, veio de uma briga num restaurante localizado nos Jardins, bairro "chique" de São Paulo, onde um médico queria, por que queria, junto com os amigos, fazer o seu pedido, faltando apenas dez minutos para o fechamento compulsório do restaurante, devido a pandemia. O que foi negado pelos funcionários e uma pressuposta dona do restaurante. 

No bate-boca, empurrões em uns aos outros, gritos exasperados, os egos transbordaram pra todos os lados. 

Verdade que não houve garrafadas e nem tapões no pé da orelha, mas teve o indecoroso: "Eu só falo com quem tem berço". 

Esta frase foi só uma entre todas as outras invocações de status de parte a parte, que terminou com ambos ameaçando um ao outro, vejam só, de suas alegadas amizades com delegados de polícia. 

Opa!!! É isso mesmo: Um ameaçava o outro com delegados que chamaram de "meus". Foi-se o tempo que o cidadão de bem, tratava o delegado de polícia com mais respeito e não como um "older brother" de crianças mimadas e mal-educadas. 

Mas essa gente não cansa de nos surpreender e, sinceramente, espero que fiquem por aí, pois já pensou se cada um deles começar a chamar pelo "meu" general? E aí, o que fará aquela fulaninha com o seu "Engenheiro formado e melhor que você"? 

Por Felicio Vitali

O latido de Bolsonaro, a "Anedota Búlgara" e os 143 mil mortos de Covid-19



Não se trata, por óbvio, de nenhuma metáfora agressiva, até porque não recorro a animais para apontar aspectos pouco apreciáveis nas pessoas. Aconteceu mesmo. O presidente da República latiu ao sancionar a lei que aumenta a pena para quem maltratar cães e gatos — só cães e gatos. O resto não conta. Antes, a pena era de três meses a cinco anos de reclusão; agora, de dois anos a cinco. Isso quer dizer que há o risco efetivo de o condenado ir para a cadeia.

Como é visível, está em curso a construção da figura reeleitoreira de um Bolsonaro, digamos, mais humano. E, para tanto, é preciso que se ele mostre mais doce com os bichos. Assim, a sanção da lei — um projeto original do deputado Fred Costa (Patriota-MG) — virou uma solenidade, com direito à presença de cachorros.

Em um dos trechos compreensíveis de seu discurso, afirmou o presidente:
"Não sei se o Sansão vai entender aqui, né? 'Au, au' quer dizer Parabéns, Sansão!"

Sansão é o nome de um pitbull que teve as patas traseiras decepadas a golpes de foice na cidade de Confins, em Minas, num desentendimento entre vizinhos. Deu apelido à lei.

Bolsonaro decidiu fazer uma graça, transformando Paulo Guedes numa espécie de primeira-dama do B:
"Eu nunca tive dúvidas se eu ia sancionar ou não até porque eu fiquei sabendo da aprovação do teu projeto pela primeira-dama (Michelle Bolsonaro). E ela perguntou em casa: 'Já sancionou?' Eu falei: 'Você tá dando uma de Paulo Guedes, que manda eu sancionar imediatamente os projetos que têm relação com a economia. O Paulo, eu obedeço. Quem (sic) dirá você".

Foi uma de suas raras deferências a Guedes em tempos recentes. Não sei quantas reivindicações Michelle tem conseguido emplacar ultimamente. O ministro da Economia tem perdido todas.

Nem sempre Bolsonaro esteve inclinado a sancionar o texto. Na "live" do dia 10 de setembro -- aquele de que participou uma garota de 10 anos, que é youtuber mirim, ele afirmou:
"O que eu pretendo fazer, vou botar no meu Facebook, o texto da lei para o pessoal fazer comentários. Só deixo avisado: quem for para baixaria, é banimento, não tem papo. Pode reclamar: 'A pena é excessiva, é pequena, é grande, tem que sancionar, tem que vetar'. Porque não é fácil tomar uma decisão como essa."

A dúvida do presidente: a pena para quem pratica abandono de incapaz, como um recém-nascido, por exemplo, é de seis meses a três anos. Pode ter sido a única dúvida razoável que Bolsonaro teve na vida...

Pelo visto, seu público foi simpático à ideia. E não se diga por aí que o presidente daquele país em que já morreram 143 mil pessoas de Covid-19 é insensível ao sofrimento de cães e gatos.

Para lembrar: no discurso que abriu a 75ª Assembleia Geral da ONU, na manhã do dia 22, Bolsonaro lamentou "cada morte" ocorrida no mundo. Mas não fez menção aos mais de 137 mil óbitos no território sob o seu governo. Ao contrário: ele atacou o distanciamento social, única medida conhecida que tem eficácia para conter a expansão do coronavírus, e cantou as glórias de drogas inócuas para combater a Covid-19. É seu jeito de amar a humanidade.

Ah, sim: a Lei Sansão não pune quem é omisso, por exemplo, diante das onças, cobras, jacarés e outros bichos crestados na grande pira em que se transformou o Pantanal. Nem quem, por palavras e atos, incentiva, na prática, queimadas e desmatamento, o que também mata bicho e gente.

Já temos um presidente humano, que se preocupa com cães e gatos. E seus admiradores nas redes sociais já podem exaltar este benfeitor dos pets.

Só me cumpre encerrar com o poema "Anedota Búlgara", de Carlos Drummond de Andrade:

Era uma vez um czar naturalista
que caçava homens.
Quando lhe disseram que também se caçam borboletas e andorinhas,
ficou muito espantado
e achou uma barbaridade.

Por Reinaldo Azevedo

Bolsonaro é o Ricardo III do reino das queimadas e da periferia da moral



O presidente Jair Bolsonaro parece ser o nosso candidato a Ricardo III, o de Shakespeare, o rei vilão dado a filosofadas de tal sorte imorais — ou amorais — que chega a despertar certo fascínio, não é?, porque, ao ouvi-lo ou lê-lo, a gente se dá conta de que aquilo que diz tem certa lógica interna e traduz uma forma de saber, embora este seja essencialmente falacioso, pautado pela malícia e pela má-fé autocentradas. Por que digo isso?

Há exatos 14 dias, Jair Bolsonaro tonitruou:
"Até 2022, no meu governo, está proibido falar a palavra Renda Brasil. Vamos continuar com o Bolsa Família e ponto final."

Passados 13 dias daquela declaração, o nome "Renda Brasil" foi substituído por "Renda Cidadã", querendo dizer a mesma coisa, e veio a público a proposta oficial para sequestrar e ampliar o alcance do "Bolsa Família". Como seria impossível operar a mágica sem furar o teto, então o Planalto deu um jeito de fazê-lo, mas de modo oblíquo. Mandou o dito-cujo pelos ares, mas fingindo que nada estava acontecendo.

Os recursos, então, do novo programa sairiam de uma pedalada dupla: dando um calote em parte dos precatórios e tungando um pedação do Fundeb. No primeiro caso, deixa-se de pagar uma dívida, para a qual há provisão orçamentária — e o passivo não desaparece, claro! — para jogar o dinheiro em despesas correntes. No segundo, apela-se a um dinheiro que não conta para efeitos de teto: é investimento social para colher resultado no longo prazo. Ocorre que o horizonte de Bolsonaro é bem mais curto.

Os tais "mercados" não são entes, digamos, pios, pautados pela moral da solidariedade. Reagiram mal. A Bolsa caiu. O dólar e os juros futuros subiram. Não exatamente porque Bolsonaro quer ampliar o programa de assistência social. Não exatamente porque ele pretende dar a dupla pedalada. Mas porque está claro que, se preciso, Paulo Guedes — o antes suposto garantidor das regras do jogo — pode apelar à contabilidade criativa para tentar garantir a reeleição do presidente. Junto com a patuscada, veio o anúncio de que a proposta de reforma tributária terá de esperar. Não passaria no Congresso. E assim é porque seu centro gravitacional é a criação de um imposto.

Guedes o justifica afirmando que, desse modo, pode desonerar a folha de salários para gerar empregos. É claro que isso soa como música aos ouvidos de parte do empresariado que pouco entende de economia além do seu negócio, mas quem conhece macroeconomia sabe que desoneração, por si, não gera postos de trabalho num país desorganizado. Há a memória recente do governo Dilma. Tal escolha deu com os burros n'água. Ampliou o déficit sem gerar empregos. Aqui e ali se lê que os especialistas têm dúvidas sobre a eficácia da medida. São poucas as dúvidas e é grande a certeza de que o expediente não funciona.

Shakespeare, já está comprovado, exagerou nas deformidades físicas de Ricardo III como recurso adicional para compor o perfil de uma personagem agressiva e calculista. Era um truque dramático. Bolsonaro não precisa de um autor que escreva a caricatura de um vilão. Ou precisa, mas, nesse caso, o redator está a serviço do soberano. Quem quer que tenha redigido a sequência de tuítes em que ele justifica as suas escolhas evidenciou que o presidente já está em plena campanha eleitoral, atuando para atingir e eliminar adversários, embora atribua a esses a iniciativa de acuá-lo. Estas palavras apareceram em sua conta no Twitter:

Ao longo da minha vida parlamentar nunca me preocupei com reeleição. Sempre exerci meu trabalho na convicção de que o voto era consequência dele.

- Minha crescente popularidade importuna adversários e grande parte da imprensa, que rotulam qualquer ação minha como eleitoreira. Se nada faço, sou omisso. Se faço, estou pensando em 2022.

- Na verdade, estou pensando é em 2021, pois temos milhões de brasileiros que perderam seus empregos ou rendas e deixarão de receber o auxílio emergencial a partir de janeiro/2021.

- A política do "fique em casa que a "economia a gente vê depois" acabou e o "depois" chegou. A imprensa, que tanto apoiou o "fique em casa", agora não apresenta opções de como atender a esses milhões de desassistidos.

- Os responsáveis pela destruição de milhões de empregos agora se calam. O meu governo busca se antecipar aos graves problemas sociais que podem surgir em 2021, caso nada se faça para atender a essa massa que tudo, ou quase tudo, perdeu.

- A responsabilidade fiscal e o respeito ao teto são os trilhos da Economia. Estamos abertos a sugestões juntamente com os líderes partidários.

- O Auxílio Emergencial, infelizmente para os demagogos e comunistas, não pode ser para sempre.

Como se vê, o presidente diz jamais ter se preocupado com a reeleição quando deputado. É mentira! Sua pauta sempre foi a de uma corporação — os militares da reserva —, buscando manter cativo esse eleitorado. Conseguiu.

Ele diz: "Se nada faço, sou omisso". Bem, é claro que sim! Esperaria o quê? "Se faço, estou pensando em 2022". Está. Mas o problema não é esse, e sim até onde pode chegar para realizar seu objetivo.

Atribuir, como ele faz, as dificuldades da economia brasileira ao distanciamento social é mesmo conversa de vilão. Talvez Shakespeare nem se ocupasse dele em razão do excesso de vulgaridade, ainda que a tirada seja compatível com a de um homicida em massa. Os mortos pela Covid-19 vão acenar para os 200 mil até o fim do ano, apesar dos esforços em favor do distanciamento social. Sem eles, o desastre seria certo.

O nosso Ricardo III da cloroquina e das queimadas atribuiu, de modo politicamente criminoso, a crise econômica criada pelo coronavírus, que varreu o mundo, a seus adversários internos. É de uma desonestidade política, moral e intelectual sem precedentes. Tivesse a esmagadora maioria dos brasileiros seguido a sua orientação, aí, sim, estaríamos mergulhados no caos.

Quanto ao auxílio emergencial, Bolsonaro deveria ser grato aos que ele chama "comunistas". Fosse pela vontade do Ricardo III de março deste ano, com o seu mau conselheiro, teriam sido pagas rês parcelas de R$ 200 aos informais, mandando para casa, sem salário, os trabalhadores com carteira assinada, com contratos, então, suspensos.

Bem, a esta altura, do candidato a monarca só sobraria a memória de um governante pendurado em praça pública, pelos pés. A exemplo do herói secreto de boa parte dos que habitam o Palácio do Planalto.

Por Reinaldo Azevedo

terça-feira, 29 de setembro de 2020

Governo reincide num par de tolices já cometidas



Virou uma espécie de parafuso espanado o debate sobre a proposta de reforma tributária do governo e a criação de um novo programa de renda mínima. As autoridades rodopiam a esmo em torno de tolices que já foram cometidas. E o Planalto tem dificuldades para sair do lugar. A reunião de Jair Bolsonaro com ministros e líderes partidários resultou em decepção e frustração, com reflexos no mercado financeiro.

Adiou-se uma vez mais o envio da proposta tributária ao Congresso. Os políticos voltaram a fazer careta para a ideia de Paulo Guedes de recriar a CPMF. O Renda Cidadã, novo nome para o velho Bolsa Família, foi escorado em fontes de financiamento que não ficam em pé. Deseja-se retirar parte da verba de rubricas destinadas ao pagamento de precatórios e ao Fundeb. No primeiro caso, seria um calote. No segundo, uma criatividade orçamentária que o Congresso já refutou.

Há um ano, Bolsonaro demitiu o economista Marcos Cintra da Secretaria da Receita Federal e desligou da tomada a CPMF, tributo que ele chamava de "desgraça", coisa de "cara de pau". Mas Paulo Guedes, sem um Plano B, insiste no argumento de que o gambá que ele deseja retirar da cartola pode virar um lindo coelhinho se for vendido como alternativa à desoneração da folha salarial. Ainda não colou.

Quanto ao novo Bolsa Família, formulado em cima do joelho, coube ao senador Márcio Bittar, relator do Orçamento, informar de onde viria a verba: uma parte da rubrica de precatórios. O que são os precatórios? São dívidas que a Justiça mandou o governo pagar. Os beneficiários aguardam na fila. Desviar verba dessa rubrica para o Renda Cidadã é um calote, um convite a uma derrota judicial.

Outra parte da verba viria do Fundeb, o fundo de financiamento do ensino básico. O Congresso já refutou essa ideia há dois meses, quando rejeitou a proposta do governo de destinar 5% do fundo educacional ao programa de renda mínima. Os gastos com o Fundeb não entram no cálculo do teto de gastos. Quer dizer: em vez de cortar gastos, o governo recorre à contabilidade criativa. Isso não é solução, é apenas a reiteração de conhecidas tolices.

Por Josias de Souza

Salles é peão, Bolsonaro gere boiada ambiental



Não é que o governo tem dificuldades para desfazer a crise que ele mesmo criou no setor do meio ambiente. A questão é que Jair Bolsonaro fez nessa área uma opção preferencial pela crise. A maior injustiça que se poderia cometer seria responsabilizar Ricardo Salles pelo desmantelo. O ministro é mero peão, um tocador de rebanho. Quem gerencia a boiada, definindo os bois que devem pular a cerca, é Bolsonaro.

Em meio às cinzas do Pantanal e da Amazônia, o presidente achou que seria uma boa ideia revogar duas portarias que protegiam uma área estimada em cerca de 1,6 milhão de hectares de restingas e manguezais. Eram áreas de preservação permanente —bois que interessam, por exemplo, a especuladores imobiliários e redes hoteleiras.

Além de atiçar uma polêmica ambiental que deveria resfriar, Bolsonaro tornou-se candidato a uma nova derrota no Judiciário. A movimentação reforça a vocação antiambiental da gestão Bolsonaro. Meio Ambiente virou uma questão econômica. O risco de perda de investimentos estrangeiros preocupa até o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Mas Bolsonaro dá de ombros para os riscos.

Desde o início do governo, há um ano e nove meses, Bolsonaro assegura que não há problema ambiental no Brasil. Tudo não passa de um complô do Inpe com ONGs, mancomunadas com a imprensa impatriótica e com os governos da Noruega e da Alemanha, que escondiam segundas intenções atrás de doações bilionárias. Sem contar os chefes de estado estrangeiros que tramam contra a soberania nacional. Não há o menor risco de um enredo assim terminar bem.

Suponha que a mesma lógica negacionista de Bolsonaro fosse aplicada à área econômica. O presidente passaria a questionar os dados oficiais sobre o déficit público, colocaria em dúvida a existência do rombo previdenciário que justificou a reforma da Previdência, ordenaria o afrouxamento dos mecanismos de controle dos gastos, e promoveria um estouro de boiada no Tesouro Nacional. Mal comparando é mais ou menos isso o que acontece no Meio Ambiente.

Por Josias de Souza

Plano de Reeleição de Bolsonaro, prevê pedalada dupla. É um vexame!



A proposta feita pelo governo nesta segunda para viabilizar o tal Renda Cidadã, que é o sequestro político do Bolsa Família, em versão ampliada, é de tal sorte esdrúxula, de tal sorte absurda, de tal sorte acintosa que só se pode concluir uma coisa: Paulo Guedes aceitou dividir com Jair Bolsonaro a responsabilidade pelo despropósito porque hoje faz qualquer coisa para não ser chutado do governo. Conduzido pelo braço por um general, como fez outro dia Luiz Eduardo Ramos, coordenador político do governo, ele já é — antes que diga inconveniências...

Então o tal Renda Brasil, que agora é Renda Cidadã, do qual ninguém mais falaria até 2022, segundo o próprio presidente, ressurgiu. E como fazer para viabilizá-lo sem furar o teto de gastos? Ora, furando o teto de gastos! Mas tentando enganar as pessoas, fingindo que não está fazendo a maracutaia.

Uma nota antes que avance: o "valor" do teto não é uma lei divina, gravada na pedra. Entendo que não apenas pode como deve ser mudado, dadas as circunstâncias. Já escrevi isso aqui. Basta que a coisa seja feita de maneira ordenada, conversando com o Congresso, com a sociedade, com o mercado. Houvesse um plano de voo, um projeto, uma noção do que fazer, seria possível operar a mudança sem traumas. Mas não há nem rascunho.

Então vem o golpe baixo. O governo anuncia que vai ampliar o tal Renda Cidadã, aquele do qual não falaria até 2022, usando uma parcela do dinheiro reservado ao pagamento de precatórios e mordendo uma parte do Fundeb. Na prática, é pedalada dupla. Precatório é dívida já com trânsito em julgado. A União tem de pagar. Se não o faz, cresce a sua dívida consolidada. Assim, aumenta-se o estoque da dita-cuja, com pagamento previsto no Orçamento, para arcar com custos correntes.

Se o truque é menos evidente nesse caso, no do Fundeb, aí é tentativa explícita de trapaça. Como o dinheiro não conta para efeitos de teto, então o governo anuncia que vai surrupiar uma parte desses recursos para sustentar o PRB: o Plano Reeleitoral de Bolsonaro.

A reação do mercado foi imediata — e, obviamente, ruim. A Bolsa, que operava em alta de mais de 1% até o anúncio das pretensões do governo, inverteu a trajetória e fechou em queda de 2,4%. O dólar subiu 1,5%, a R$ 5,6390, maior valor desde 20 de maio. Agora, Bolsonaro ficou ainda mais longe da mentira contada em seu discurso para a ONU: os tais mil dólares do auxílio emergencial.

As pedaladas, por si, são um problema — que, de resto, correm o risco de judicialização. Mas elas também são um sintoma. É evidente que o "governo das reformas" já não sabe como avançar com elas. Não tem mais o que fazer. Esgotou os seus recursos e seus truques. A ideia fixa de Paulo Guedes é uma só: a volta vitaminada da CPMF.

"Emenda constitucional pode mudar o teto de gastos? Juridicamente, claro que sim. O problema é o significado político para o compromisso com gestão fiscal responsável. Emenda constitucional pode tirar dinheiro do Fundeb para mascarar mudança do teto? Pode, mas por que tergiversar?"

Quem fez essas indagações e deu essas respostas em redes sociais foi o ministro Bruno Dantas, do Tribunal de Contas da União. É um sinal do descrédito da proposta já na largada e mais uma evidência de que estamos vivendo de remendos. E por que o Planalto não apresentou a proposta inteira de reforma tributária?

Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara, foi bastante transparente a respeito:
"Vamos construir alternativas para construir uma maioria que garanta pelos menos 340 votos a fim de ter segurança para pôr a proposta em votação. Foram propostos 18 itens, e eu não vou dizer qual tem maior resistência. Podemos alterar o texto, mas isso precisa passar pelo presidente Jair Bolsonaro, pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, e pelos líderes dos partidos".

Ou por outra: o governo não tem uma proposta de reforma tributária factível. É simples. Se pusesse em votação o que pensou, seria derrotado. Até porque o único pulo do gato de Guedes é mesmo a volta da CPMF, e o imposto não passa pela goela do Congresso. Não hoje ao menos.

Então não seria o caso de deixar o Renda Cidadã para o ano que vem, observando o comportamento da economia nessa fase de retomada? Acontece que Bolsonaro não tem um plano de governo ou um desenho para a volta à normalidade. Sua preocupação é uma só: a reeleição.

Por Reinaldo Azevedo

segunda-feira, 28 de setembro de 2020

"Lei de Gerson" – Felicio Vitali

 

Eu não sei até onde este governo é deficiente nas interpretações das leis ou só se faz de morto para se aproveitar de uma eventual distração do coveiro.

A hipótese mais provável é pra coveiro se colocar "discostas" pra parede, porque além do presidente interpretar que o STF tirou-lhe a responsabilidade pela pandemia, agora vem o ministro da educação, dizer que a responsabilidade pelo ensino médio, de acordo com a sua interpretação da lei, é unicamente dos estados e dos municípios.

Na mesma entrevista o cara também diz que a "homossexualidade é causada pelos desajustes familiares". Deduzo que da mesma forma que interpreta a lei, ele também interpreta a contemporaneidade, a ciência e não tem a menor noção de família, para emitir tão desajustada opinião.

Quando penso que o cara foi reitor do Makenzie, lembro do que me disse um renomado empresário, presidente de uma das nossas maiores empresas: "Em muitos casos, diploma não encurta as orelhas e só faz aumentar a língua".

Outro que interpreta de acordo com a conveniência, mas aí é por oficio mesmo, é a Advocacia Geral da União. Só que quando o faz em causa própria, acaba que passa vergonha.

Pois de acordo com a sua interpretação da lei, não é que mandou correr um aumentinho de salário para os seus 606 procuradores?

Se fosse a AGU uma tribo, seria o único caso de uma tribo só de caciques, sem índios pra servir o cafezinho ou até pra botar fogo nas matas.

Mas o pior de tudo isso é que a aprovação do governo cresce. Cresce tanto quanto o nariz do Pinóquio fazendo discurso na ONU. E o incrível é que cresce mesmo num ambiente "familiarmente ajustado" às compras de imóveis com DINHEIRO VIVO. E tem quem interpreta que todo este dinheiro tem origem só nas rachadinhas. Ah vá?

Por isso tudo ninguém se espanta que neste país a única lei bem interpretada POR TODOS é a tal "Lei de Gerson". Aquela em que os "cidadãos de bem" se baseiam para tirar uma casquinha de vantagem.

Só não percebem que neste teatro de interpretações esdrúxulas, só lhes cabem o papel de coveiro. E olhe lá...!

Por Felicio Vitali

Principal mal da política é odor, não cor ou sexo



Disputam as poltronas de prefeito e de vereador neste ano de 2020 pelo menos 526 mil candidatos. A Justiça Eleitoral celebra duas novidades: um recorde no número de candidaturas femininas (34%) e o fato de a maioria dos postulantes (51%) ter se autodeclarado preto ou pardo. Pode-se soltar fogos pela consolidação das cotas de raça e de gênero. Mas quem não quiser perder o foco deve levar em conta o seguinte: o principal problema da política brasileira é o cheiro, não a cor ou o sexo.

Se a sensibilidade auditiva fosse transportada para o nariz, o eleitor sentiria um mau cheiro insuportável sempre que tivesse que confrontar as promessas dos candidatos com as desculpas que os eleitos oferecem quando pilhados em flagrantes de incoerência, de ineficiência ou de corrupção. O estelionato político, a ineficácia administrativa e a safadeza não costumam fazer distinção entre negros e brancos, homens e mulheres.

Na campanha federal de 2018, o eleitor chutou o balde. As urnas rechaçaram parte do elenco que respondia à fome do eleitorado por limpeza com malabarismo verbal e ilusionismo ideológico. No varejo, houve o voto antipetista. No atacado, o voto hostil aos políticos. Decorridos menos de dois anos, o eleitor constata que elegeu muito pão dormido disfarçado de nova política.

Nos estados, governadores novatos roubam ou deixam roubar até verbas da saúde. Em Brasília, o presidente que se vendia como um lavajatista antissistema revela-se um chefe de organização familiar que transforma em heróis da resistência prontuários do sistêmico centrão. A bancada do rebotalho prevalece com folga no Legislativo sobre a banda da hipotética renovação.

De duas uma: ou o eleitor entrega os pontos ou transforma 2020 em antessala de 2022, renovando a disposição para varrer a mediocridade e a falta de caráter. No Brasil, as eleições são como loterias sem prêmio. Voto vai, voto vem, o eleitor é compelido a renovar a ilusão de que é possível começar tudo de novo, do zero, para ver se finalmente dá certo.

Num ambiente assim, tão malcheiroso, até a fixação de cotas é um convite para o malfeito. Proliferam as candidatas laranjas, lançadas com o propósito de desviar verbas públicas do fundo eleitoral. O mesmo Judiciário que demora a punir a perversão das candidaturas femininas de fancaria substitui o Legislativo na criação da cota racial —um convite a novas fraudes. O fedor, que já é lancinante, tende a aumentar.

Por Josias de Souza

domingo, 27 de setembro de 2020

Campanhas eleitorais começam neste domingo (27); veja as regras


Candidatos às eleições municipais poderão pedir votos e expor projetos na rua e
na internet, mas fiscalização será rigorosa

As campanhas dos candidatos às eleições municipais se iniciam neste domingo (27) em todo o Brasil e se estenderão, para algumas modalidades, até a véspera do pleito, que ocorrerá, em primeiro turno, em 15 de novembro. Os candidatos a prefeito e vereador estarão autorizados a pedir votos e divulgar propostas nas ruas, na internet e na imprensa escrita. A propaganda gratuita em rádio e televisão só terá início em 9 de outubro.

A internet será ferramenta indispensável para as campanhas, que terão que se adaptar às recomendações de isolamento social em decorrência da pandemia de COVID-19. No ambiente virtual, a publicidade eleitoral poderá ser feita nos sites dos partidos e dos candidatos, em blogs, postagens em redes sociais e aplicativos de mensagens, como WhatsApp e Telegram.

A Justiça Eleitoral, porém, formulou regras para a campanha online, que deverão ser observadas rigorosamente pelos partidos, candidatos e suas equipes. Estão vedados, por exemplo, os impulsionamentos de publicações feitas por terceiros, o disparo em massa de mensagens e a propaganda em sites de quaisquer empresas, organizações sociais e órgãos públicos.

Os candidatos também serão responsabilizados por conteúdo enganoso ou descaracterizado que forem utilizados em suas ações de campanha.

As propagandas estimuladas nos sites de relacionamento, permitidas quando realizadas pelos candidatos ou partidos, deverão ser sinalizadas claramente como conteúdo de divulgação.

Nas ruas, será permitido o posicionamento de mesas com material impresso e bandeiras móveis entre 6h e 22h, desde que não atrapalhem o trânsito de veículos e pedestres. Os carros de som só serão permitidos em carreatas, passeatas ou durantes comícios e reuniões.

A Justiça Eleitoral vem estimulando a população a fazer o controle social da propaganda eleitoral. Além da possibilidade de denúncias nos cartórios eleitorais e no Ministério Público Eleitoral, será lançado em 27 de setembro o aplicativo Pardal, específico para informar irregularidades de campanhas. Todas as denúncias requerem identificação do cidadão denunciante.

Veja as principais permissões e vedações de atividades de campanhas a partir de domingo (27): 
  • A distribuição de santinhos e adesivos será permitida até as 22h da véspera das eleições (14 de novembro);
  • Adesivos são liberados em bens privados (automóveis, caminhões, motocicletas e janelas residenciais), desde que não excedam a dimensão de 0,5m2. O material deve conter o CNPJ ou CPF do responsável pela confecção, bem como de quem o contratou, e também a respectiva tiragem;
  • Anúncios na imprensa escrita são permitidos até 13 de novembro e devem respeitar o tamanho máximo do anúncio por edição;
  • Alto-falantes ou amplificadores de som podem ser utilizados das 8h às 22h, até o dia 14 de novembro (um dia antes da eleição), observando-se as restrições de local;
  • Bandeiras e mesas para distribuição de materiais são admitidas ao longo das vias públicas, desde que móveis e que não dificultem o trânsito de pessoas e veículo;
  • Comícios são permitidos até 12 de novembro, entre 8h e 0h e com prévio aviso à autoridade policial em, no mínimo, 24 horas. Apresentação de artistas estão vedadas;
  • Carros de som ou minitrios são permitidos apenas em carreatas, caminhadas, passeatas ou durante reuniões e comícios, respeitando o limite de 80 decibéis e restrições de local;
  • São proibidas as propagandas via telemarketing em qualquer horário, bem como por qualquer meio de disparo em massas de mensagens instantâneas sem anuência do destinatário.

Na Internet 

  • Propagandas eleitorais são permitidas em sites dos candidatos, partidos e coligações. O endereço eletrônico deve ser comunicado à Justiça Eleitoral e hospedado em provedor estabelecido no país;
  • É proibida a veiculação de propaganda eleitoral em sites de pessoas jurídicas, com ou sem fins lucrativos, e em portais oficiais ou hospedados por órgãos ou entidades da administração pública direta ou indireta;
  • Mensagens eletrônicas são permitidas apenas para endereços previamente cadastrados gratuitamente pelo candidato, partido político ou coligação;
  • A campanha pode ser feita por meio de blogs, redes sociais, aplicativos de mensagens instantâneas, mas o conteúdo deve ser gerado ou editado pelos candidatos, partidos ou coligações. Todo impulsionamento deverá conter, de forma clara e legível, o número de inscrição no CNPJ ou CPF do responsável, além da expressão "Propaganda Eleitoral”;
  • São vedados impulsionamentos de posts e mensagens por terceiros.

Mais detalhes podem ser conferidos no Guia da Propaganda, no portal das Eleições 2020.

"Lindinhas". E sensuais? O filme que Damares quer censurar na Netflix



Não se nasce mulher. Torna-se mulher. Essa frase, do livro ‘O segundo sexo’, de Simone de Beauvoir, tem 71 anos. E continua atual. Poderia até servir de subtexto para o filme mais polêmico hoje na Netflix, “Lindinhas”, do francês original “Mignonnes”, ou “Cuties” em inglês. Premiado no Festival de Sundance, o filme foi chamado de pervertido por mostrar a erotização precoce de meninas. 

“Lindinhas” foi acusado de apologia à pedofilia, por exibir as garotas treinando para um concurso de dança em pleno “twerk”, com movimentos radicais de quadris e agachamentos, ficando de quatro com dedinho na boca. O “twerk” mistura funk e hip-hop e o foco é o bumbum. O Brasil é mestre nisso (lembram o grupo “é o tchan”?) e há até igreja evangélica tentando atrair jovens com o “funk gospel das novinhas”. Nas comunidades, em escolas, em festas, em tutoriais na internet e mesmo em lares, a dancinha e o rebolado infantis são reais.

A diretora é senegalesa, Maïmouna Doucouré. O filme conta a história de uma menina muçulmana de 11 anos, Aminata, que cresce em um subúrbio de Paris com sua família imigrante do Senegal. Amy, seu apelido na França, se sente dividida entre três culturas: a religiosa africana, a europeia ocidental e a hiperficção das redes sociais. Se já é difícil para qualquer um adolescer, imagine para Amy. Ela participa de cultos com os cabelos cobertos, enquanto as populares da escola usam colantes brilhantes, tops de barriga de fora e jeans rasgados, saltos plataforma, maquiagem, cabelos tingidos de todas as cores. Amy inveja o que lhe parece liberdade.

Amy cuida de dois irmãos pequenos. Vê a mãe chorar porque o marido vai trazer uma segunda esposa do Senegal. Não lhe parece justo perder seu quarto para a nova mulher do pai. Não lhe parece justo que ela e a mãe preparem a festança da boda bígama. Em uma cena, a tia manda Amy descascar sacas de cebolas: “Hoje vou ensiná-la a ser mulher”. 

O que é ser mulher? “Lindinhas” ensina no culto: “As mulheres têm de ser devotas porque no inferno elas serão bem mais numerosas do que os homens. Por isso devemos seguir as recomendações de Alá. O espírito do mal se expressa nas mulheres seminuas. É preciso lutar para não perder o pudor. Devemos obediência a nossos maridos”. 

Por um momento, penso ouvir Damares. Igual a citações dela. É natural que a ministra da Família e ex-pastora da Igreja do Evangelho Quadrangular tenha se sentido ofendida. O que não é natural é pedir a suspensão de “Lindinhas” na Netflix. A censura não muda a realidade. Não alerta. Não ensina. Além de inconstitucional, é obscurantista. O governo francês defendeu o filme, as ministras da Cultura e de Igualdade de Gênero também. 

O filme perturba, mas não tem nudez nem pedofilia. Faz refletir. É proibido para menores de 16 anos. Amy faz um nude genital que não nos é exibido e posta a imagem nas redes, como rebeldia. E por isso é castigada por seus pares, até por sua melhor amiga, a hispânica Alice. Por ter exagerado na transgressão. Um imã (sacerdote muçulmano) é chamado para exorcizar o demônio dentro de Amy. Não encontra nada.

Não foi só Damares que gritou contra “Lindinhas”. Milhares nos Estados Unidos e no Brasil assinaram petição online contra o filme – mesmo sem assistir. Muitos grupos cristãos. O pôster da Netflix, apelativo e sexualizado, foi trocado pelo cartaz original e divertido do filme. A rede pediu desculpas pela propaganda inapropriada. E também mudou a descrição. Amy não é mais uma menina “que explora sua feminilidade”, mas que “se rebela contra valores tradicionais familiares”. A polêmica inflou a audiência do filme. E levou a cineasta Maïmouna a gravar um vídeo, explicando que a ideia surgiu quando viu pré-adolescentes dançando em Paris.

“Elas disseram que quanto mais sexualizadas as mulheres são nas redes sociais, mais são bem sucedidas. Elas imitam o que veem. Sem entender o significado. Sim, é perigoso. Lembrei de mim mesma, crescendo entre as duas culturas que criaram meus valores. Era obcecada em saber o que significava se tornar mulher. Via injustiça. Sentia raiva. Podemos ver a opressão das mulheres em várias culturas, como a muçulmana. Mas a objetificação do corpo das mulheres no Ocidente não é outra forma de opressão? Essa idade de 11 anos é incrível porque você tem toda a ingenuidade e inocência, imaginação ilimitada, mas ao mesmo tempo tem acesso fácil a conteúdos adultos. Nós podemos, como mulheres, realmente escolher quem queremos ser? Para além dos exemplos impostos pela sociedade? ‘Lindinhas’ é um filme profundamente feminista, com uma mensagem ativista. Um espelho de nossa sociedade. Pode ser difícil olhar para ele. Mas é real”.

Todas nós tivemos 11 anos e sabíamos sentir excitação e desejo. Amy menstrua enquanto ainda se entope de balas e tem bichos de pelúcia. Para mim, o mais perturbador no filme foi a violência física entre as garotas e o bullying, também reais. Amy encontra seu caminho. Nem todas as meninas encontram. Questões da sexualidade feminina seguem sem resposta fácil. Para as garotas e para seus pais. A resposta é simplista para quem acha tudo pecado ou para o outro extremo, os crentes da sociedade de consumo e espetáculo. 

É impossível negar a sensualidade infanto-juvenil. Uma repressão severa pode tornar o sexo uma prática doente e suja, e mesmo impedir o orgasmo. Como educar nossas filhas e netas para o exercício gratificante do sexo? Como ajudá-las a se defender de predadores? Dos que distorcem a pureza da sensualidade? Como ajudá-las a não sucumbir ao patrulhamento do prazer? 

O cenário piora com a obsessão por seguidores e curtidas. Nem precisa chegar à pré-adolescência. Aos sete anos já. Criança não tem celular nem iPad mas usa os dispositivos dos pais. A diretora de “Lindinhas” diz: “Todos nós, pais e mães, professores, políticos, precisamos criar um espaço mais bonito, libertador e saudável para que as crianças cresçam se tornando a melhor versão de si mesmas”. Não querer ver nem ouvir é sempre o pior caminho. Não se nasce censor. Torna-se.

Por Ruth de Aquino

Equipamentos 3D são capazes de imprimir de tudo — agora, até carnes


BIFE SINTÉTICO - Proteína fake: equipamentos são capazes de imprimir até 20 quilos de carne por hora

Em 1984, um estudante de engenharia perguntou ao americano Chuck Hull, inventor da impressora 3D, qual seria o futuro da máquina que, àquela altura, reproduzia formas rudimentares de resinas. “Vai chegar o dia em que seremos capazes de imprimir qualquer coisa, até mesmo um automóvel”, disse Hull. Ele estava certo, mas nem tanto. Na verdade, as máquinas foram muito além do que a sua imaginação pôde conceber. Atualmente, a tecnologia, de fato, é capaz de produzir qualquer tipo de objetivo inanimado — qualquer um mesmo. De barcos a casas. De próteses a armas. Isso, porém, não é exatamente novidade. A mais recente aplicação das impressoras 3D é ainda mais surpreendente e pode levar a caminhos inesperados. Os cientistas descobriram que os aparelhos são capazes de dar vida a suculentas carnes sintéticas, desde que sejam utilizados os ingredientes corretos.

A iniciativa é liderada pela empresa israelense Redefine Meat, que apresentou recentemente ao mercado a sua inédita impressora. As máquinas devem ser alimentadas com uma combinação de plantas e moléculas bovinas. Alguns minutos depois, elas imprimem filés que, pelo menos visualmente, são idênticos aos bifes tradicionais. Segundo a Redefine, startup criada em 2018 com a ambição de revolucionar o setor de alimentos, o sabor remete a carnes de verdade, nem de longe lembrando um produto sintético. “Conseguimos obter a mesma consistência de um bife convencional, inclusive imitando músculos e gorduras”, diz Alexey Tomsov, engenheiro da companhia. As máquinas foram concebidas para imprimir 20 quilos por hora, o suficiente para abastecer um restaurante de porte médio. A ideia é inicialmente levar a novidade para pequenos bistrôs ainda em 2020, e oferecer o equipamento ao mercado, para qualquer um que quiser comprá-lo, no começo de 2021. O preço não foi definido.

As grandes empresas estão atentas ao novo segmento. A rede americana de fast food KFC, uma das maiores do mundo, vai testar no mercado russo, em parceria com a startup 3D Bioprinting Solutions, nuggets feitos por impressoras. Assim como o equipamento da Redefine Meat, as máquinas usam como ingredientes plantas e, nesse caso, moléculas de frango. Em poucos minutos, imprime-se um balde cheio de nuggets, com a vantagem adicional de que nenhum animal precisou ser sacrificado. Eis aí o fator que encanta ambientalistas: as carnes fake, obviamente, têm potencial para preservar milhões de vidas. “Sempre haverá pessoas criando e comendo animais”, disse em uma palestra nos Estados Unidos o cardiologista Uma Valeti, fundador da startup Memphis Meats, uma das principais empresas de carnes sintéticas do mundo. “Mas, pela primeira vez na história da humanidade, estamos perto de oferecer em larga escala um bife suculento, igualzinho à carne da vaca que estava pastando no campo, mas que foi 100% criado em laboratório.”

As carnes produzidas em laboratório podem levar a uma radical transformação na indústria de alimentos. Uma pesquisa feita pela Universidade de Oxford, no Reino Unido, identificou trinta empresas que tentam recriar em laboratório carnes idênticas às consumidas hoje em dia. Antes das impressoras 3D, porém, os projetos eram caros e demorados, o que inviabiliza a execução. Com os equipamentos de impressão, espera-se que o setor ganhe novo dinamismo, e provavelmente não vai demorar para que as carnes fake fabricadas por uma máquina instalada no fundo de uma cozinha constem no cardápio de restaurantes estrelados. Não à toa, jovens companhias como a Memphis Meats, uma das maiores do ramo, contam com investidores pesos-pesados. Entre eles, Bill Gates, fundador da Microsoft, e Richard Branson, criador da Virgin. Uma das principais empresas de alimentos do mundo, a americana Cargill desembolsou dezenas de milhões de dólares para alavancar a Memphis Meats.

O avanço das impressoras pode levar à impressão de carne de verdade. Um artigo publicado pela revista científica Science apresentou detalhes de um experimento realizado na Estação Espacial Internacional. O cosmonauta russo Oleg Kononenko imprimiu no espaço células de cartilagem humana usando um equipamento criado pela empresa russa de biotecnologia Bioprinting Solutions. O método baseia-­se em imitar o processo natural de regeneração do tecido muscular, mas sob condições controladas. Segundo Kononenko, a máquina 3D também foi capaz de produzir no espaço glândulas tireoides de ratos. Trata-se de algo realmente espetacular. Significa que, no futuro, as tripulações poderão imprimir seus próprios alimentos, incluindo carnes de laboratório. Se tudo der certo, elas serão tão saborosas quanto um belo pedaço de picanha.

Publicado em VEJA de 30 de setembro de 2020, edição nº 2706

sábado, 26 de setembro de 2020

Bolsonaro escolhe ministro do STF por fidelidade



Celso de Mello antecipou sua aposentadoria em três semanas. Sairia em 1º de novembro, ao fazer aniversário de 75 anos. Adiantou o relógio para vestir o pijama em 13 de outubro. Jair Bolsonaro terá a oportunidade de fazer sua primeira indicação para o Supremo Tribunal Federal. Escolherá o substituto guiando-se pelo critério da fidelidade. Muitos torcerão o nariz. Mas o capitão não será o primeiro presidente a desprezar a neutralidade como parâmetro de escolha.

O que diferencia Bolsonaro dos antecessores é que ele age como se desejasse testar a fidelidade dos pretendentes à toga antes da nomeação. Enredado entre inquéritos que roçam a sua Presidência, os filhos e os amigos, dispõe de farto material para a testagem: o inquérito em que é acusado de aparelhar a PF, o foro especial reivindicado pelo primogênito, os depoimentos do Zero Dois e do Zero Três, as aflições do amigo e gestor de rachadinhas Fabrício Queiroz...

Bolsonaro gostaria de colocar um subordinado na poltrona do seu algoz Celso de Mello. Constam de sua lista os ministros Jorge Oliveira (Secretaria-Geral da Presidência) e André Mendonça (Justiça). Arrisca-se a ser processado por plágio. Onde trabalhava Gilmar Mendes quando FHC o indicou? Chefiava a Advocacia-Geral da União. Dias Toffoli ocupava o mesmo posto no instante em que Lula o escolheu. Alexandre de Moraes, ungido por Michel Temer, era ministro da Justiça.

O presidente diz, em privado, que dispõe de opções. Entre elas o procurador-geral da República Augusto Aras e o ministro do STJ João Otávio Noronha. Aras não hesita em mostrar-se útil. Nos últimos dias, fez isso em dois ofícios protocolados no Supremo.

Num dos ofícios, Aras posicionou-se contra o acatamento de ação que questiona o foro privilegiado concedido a Flávio Bolsonaro pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro no caso da rachadinha. Noutro, posicionou-se a favor do pedido de Bolsonaro para depor por escrito no inquérito em que é acusado de tramar o aparelhamento político da PF.

Otávio Noronha, um magistrado por quem Bolsonaro disse nutrir "amor à primeira vista", também encantou o presidente e sua família ao transferir Fabrício Queiroz do ambiente inóspito de uma cela no presídio carioca de Bangu 8 para o conforto da prisão domiciliar. Fez mais: estendeu o refresco à foragida Márcia Aguiar. Mulher do operador de rachadinhas, Márcia flertava com a delação.

Na prática, trava-se uma competição pela vaga de ministro do Supremo. Nada de novo sob o Sol. A diferença é que a agora a disputa se desenvolve na frente das crianças. A fidelidade prévia não assegura o alinhamento futuro. Lula indicou oito ministros para a Suprema Corte. Acabou na cadeia. No julgamento do mensalão, ministros como Joaquim Barbosa e Ayres Britto portaram-se com rigor inaudito. Perfilaram do lado da moralidade.

Dilma Rousseff nomeou ministros como Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Luiz Fux. Nos julgamentos relacionados ao petrolão, a trinca notabilizou-se pelo apoio à Lava Jato. Nos julgamentos sobre a prisão de condenados na segunda instância, os três votaram invariavelmente a favor da tranca, inclusive a de Lula.

Hoje, prevalece no Supremo, por 6 votos a 5, a banda da Corte adepta da política de celas abertas. Afrouxou-se a regra sobre a prisão num instante em que aguardavam na fila por uma condenação pessoas como Aécio Neves e Michel Temer, amigos de Gilmar Mendes. E sonhavam com a reconquista do meio-fio um personagem como Lula, amigo de Ricardo Lewandowski e ex-superior hierárquico de Dias Toffoli.

Dá-se de barato que o escolhido de Bolsonaro fechará com o pedaço do Supremo que abre as celas, elevando a maioria que se autoproclama "garantista" um placar de 7 a 4.

Com a aposentadoria de Celso de Mello, o novo decano da Suprema Corte será Marco Aurélio Mello. Ele costuma dizer que magistrados não deveriam "agradecer com a toga." Ele próprio, indicado pelo primo Fernando Collor de Mello, declarou-se impedido, por razões de consciência, de participar de julgamentos que envolviam Collor. Entretanto, isso está longe de ser um padrão.

Por Josias de Souza

Dia D da Cloroquina ofende a inteligência alheia





Quando a posteridade puder falar sobre a pandemia sem o risco de produzir efeitos colaterais constrangedores, a história da megacrise sanitária será um relato das coisas que poderiam ter sido evitadas. O que já foi feito não pode ser refeito. Mas certas providências poderiam ser abortadas. Jair Bolsonaro acaba de fazer um gol ao incluir o Brasil na aliança internacional por vacinas contra a Covid-19, coordenada pela OMS. Depois de muita hesitação, ele liberou R$ 2,5 bilhões para esse projeto, que aproxima o Brasil do desenvolvimento de nove vacinas.

A arquibancada ainda nem teve tempo de comemorar e surge a notícia de que o governo se equipa para fazer um gol contra. O Ministério da Saúde cogita realizar em 3 de outubro o Dia D do enfrentamento à Covid-19. Essa terminologia —Dia D— costuma ser usada em campanhas de vacinação. Na falta de uma vacina, pretende-se intensificar a distribuição do kit Covid, um embrulho que inclui a cloroquina, a hidroxicloroquina, a azitromicina e a ivermectina. O que se diz é que o presidente pode inclusive bater bumbo num pronunciamento em rede nacional de rádio e TV. É uma ofensa à inteligência alheia.

Tudo isso ocorre contra um pano de fundo manchado pela presença de quase 140 mil mortos. Uma evidência de que ou a comunidade médica enlouqueceu ao ignorar a genialidade sem comprovação científica de Bolsonaro ou o kit cloroquínico do governo não tem serventia. Simultaneamente, veio à luz um livro em que o ex-ministro Henrique Mandetta se dedica a falar bem de si mesmo e a expor as mazelas do combate à pandemia no Brasil.

Mandetta relata, por exemplo que expôs em 27 de março numa reunião com a presença de Bolsonaro cenários que indicavam que o coronavírus poderia matar até 180 mil pessoas no Brasil. Mal comparando, o livro de Mandetta surte o efeito de outro livro recém-lançado nos Estados Unidos pelo jornalista Bob Woodward.

Numa série de entrevistas gravadas, Donald Trump admitiu, ainda em fevereiro, ter ciência do grau de letalidade do coronavírus, que seria "até cinco vezes mais mortal". Nos Estados Unidos, o livro rendeu críticas a Trump e também ao jornalista, que sonegou ao público informações vitais. No Brasil, é preciso perguntar a Mandetta se, em meio a tantas autopsias, ele também não poderia ter aproveitado o livro para fazer algum tipo de autocrítica.

Por Josias de Souza

sexta-feira, 25 de setembro de 2020

Editorial do Estadão - Um governo irrelevante



O ministro da Educação, Milton Ribeiro, disse, em espantosa entrevista ao Estado, que temas como a volta às aulas em meio à pandemia de covid-19 e a dificuldade de muitos alunos pobres de acompanhar aulas a distância por limitações técnicas não dizem respeito ao MEC.

“A lei é clara. Quem tem jurisdição sobre escolas são o Estado e o município. Não temos esse tipo de interferência. Se eu começo a falar demais, (governadores e prefeitos) dizem que estou querendo interferir; se eu fico calado, dizem que se sentem abandonados”, declarou o ministro.

De fato, a lei é clara: no artigo 211 da Constituição está escrito que “a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino”. Ou seja, a interpretação dada pelo ministro Milton Ribeiro ignorou a obrigatoriedade da colaboração entre os entes da Federação, resguardados os princípios federativos. O MEC não pode simplesmente lavar as mãos como sugeriu o ministro. Deve, ao contrário, como parte do governo federal, coordenar-se com os entes federados para superar tão graves desafios, que prejudicam a educação brasileira há muitos anos. Se isso não é tema para o MEC, é difícil saber qual seria a serventia desse Ministério.

Mas a atitude do ministro Milton Ribeiro não surpreende, num governo cujo próprio presidente da República frequentemente rejeita as responsabilidades inerentes a seu cargo. O presidente Jair Bolsonaro vive a dizer, por exemplo, que nada pode fazer em relação aos esforços para conter a pandemia de covid-19 nos Estados e municípios porque foi impedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o que é uma grossa mentira – mas muito conveniente.

Dentro da estratégia demagógica bolsonarista, o presidente tratou a pandemia como coisa sem importância, e as medidas de isolamento social adotadas pelos Estados como parte de uma conspiração para prejudicar seu governo. Na verdade, Bolsonaro queria poder total para ordenar o relaxamento das medidas, em nome de alegados imperativos econômicos. Quando o STF lhe negou esse poder, por ser inconstitucional, passou a posar de defensor dos pobres que precisavam trabalhar e, segundo dizia, estavam sendo impedidos por governadores inescrupulosos e por juízes inconsequentes.

Agora é a vez dos estudantes: “Não tínhamos por que fechar as escolas, mas as medidas restritivas não estavam mais nas mãos da Presidência da República. Por decisão judicial, elas competiam exclusivamente aos governadores e prefeitos”, declarou recentemente Bolsonaro.

Em vez de assumir seu papel como chefe do Poder Executivo federal, responsável pela articulação dos entes subnacionais e pela negociação com o Congresso especialmente em tempos de crise, o presidente Bolsonaro preferiu o caminho fácil do populismo e da irresponsabilidade – que lhe parece natural, dado seu histórico na política. Age assim tanto em relação à pandemia como em relação a todo o resto: sem ter qualquer ideia do que é governar e do que pretende para o País, ausenta-se do debate das grandes questões nacionais e espera viver do lucro eleitoreiro de ações demagógicas e, no mais das vezes, desimportantes.

É com esse espírito que trabalha seu ministro da Educação. Na entrevista, Milton Ribeiro disse que “são o Estado e o município que têm de cuidar disso aí” e “não foi um problema criado por nós”, referindo-se à desigualdade educacional que afeta estudantes sem acesso à internet. Ao mesmo tempo, pareceu muito mais preocupado com a orientação sexual dos alunos, tema que mobiliza a militância bolsonarista nas redes sociais, do que com seu bem-estar e seu aprendizado em meio à pandemia.

Assim, o MEC – que já está em seu terceiro ministro – continuará irrelevante, justamente no momento em que é mais necessário. Nada surpreendente, num governo em que o Ministério da Saúde se ausenta em plena pandemia e em que o Ministério do Meio Ambiente se omite em meio a queimadas e ao avanço do desmatamento, entre outras barbaridades. Tudo à imagem e semelhança de seu chefe.

Família Bolsonaro odeia transferências bancárias



Num universo convencional, ninguém sai carregando dinheiro graúdo pelas ruas de uma cidade como o Rio de Janeiro. No passado remoto, havia o cheque. Hoje, existe a TED, sigla de 'Transferência Eletrônica Disponível'. Não há forma mais rápida e segura de enviar valores de uma conta bancária para outra. Entretanto, a família Bolsonaro tem aversão a essa comodidade.

Os Bolsonaro revelaram-se cultores de inusitados hábitos. Adeptos da rachadinha, eufemismo para peculato, recorrem à forma mais primitiva e sigilosa de poupança: o colchão. Compram até imóveis em dinheiro vivo. Expostos em inquéritos e nas manchetes, reagem inadequadamente. Ora silenciam, ora tocam trombone sob um imenso telhado de vidro para sustentar que são perseguidos.

Jair Bolsonaro e seus filhos Flávio, Carlos e Eduardo ainda não perceberam. Mas, guardadas as devidas proporções, começam a se assemelhar a encrencados como Michel Temer, Aécio Neves e Lula. Na era do dinheiro transportado em malas, mochilas e caixas eles têm em comum a mesma aversão à TED e uma certa mania de perseguição. De resto, exibem a idêntica presunção de que lidam com um país de bobos.

Por Josias de Souza

AGU suspende promoção em massa que levou procuradores ao topo da carreira




A Advocacia-Geral da União (AGU) decidiu suspender, nesta quinta-feira, 24, a promoção em massa que levou 606 procuradores federais do órgão ao topo da carreira -com salários acima de R$ 27,3 mil. A decisão é do procurador-geral Federal, Leonardo Lima Fernandes.

Na última sexta-feira, 18, uma portaria da AGU promoveu 607 servidores, dos quais 606 passaram a integrar o topo da carreira da procuradoria federal - a informação foi revelada pelo site Poder360. A medida, segundo a advocacia-geral, seguiu os critérios de antiguidade e merecimento. (...)

Leia íntegra no Estadão.

quinta-feira, 24 de setembro de 2020

Brasil amarga uma fuga recorde de investidores




Ao discursar na abertura da Assembleia Geral da ONU, Jair Bolsonaro insinuou que o fluxo de investimentos no Brasil "comprova a confiança do mundo em nosso governo." Os arquivos do Banco Central armazenam dados que não ornam com o otimismo presidencial. Notícia veiculada pelo jornal O Globo informa:

1. Entre janeiro e agosto deste ano, US$ 15,2 bilhões deixaram o Brasil. Trata-se do maior volume para o período desde 1982, quando o Banco Central começou a colecionar a estatística.

2. Os investidores estrangeiros retiraram R$ 87,3 bilhões da Bolsa brasileira entre 1º de janeiro e o último dia 17 de setembro. A cifra corresponde a quase o dobro dos R$ 44,5 bilhões que saíram durante todo o ano passado. É a maior fuga da série, inaugurada em 2008.

Em janeiro de 2019, quando Bolsonaro tomou posse. Os bumbos do novo governo anunciavam que as reformas do Posto Ipiranga e as privatizações impulsionariam a economia brasileira. Aprovou-se a reforma da Previdência. Nenhuma estatal foi passada nos cobres. Produziu-se um pibinho de 1,1%. Os dólares que rodavam pelo mundo esperando o nascer do Sol no Brasil espantaram-se com a penumbra.

O coronavírus infectou 2020. Além dos quase 140 mil mortos e da recessão, há na linha do horizonte a fumaça que vem da Amazônia e do Pantanal. Num ambiente assim, um presidente que terceiriza 100% dos desacertos sanitários aos governadores e atribui as queimadas a índios e caboclos não contribui para restaurar a confiança. É como se quisesse mostrar ao dinheiro estrangeiro a porta de saída.

Por Josias de Souza

Senado reúne número mínimo de assinaturas para CPI sobre queimadas e desmonte ambiental



O recolhimento das assinaturas foi capitaneado pela senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), coordenadora da Frente Ambientalista no Senado. Segundo Eliziane, o objetivo é investigar o "desmonte da governança ambiental" no Poder Executivo, além das queimadas na Amazônia e no Pantanal.

“Culpar índios e caboclos pelos incêndios na Amazônia e no Pantanal, como fez Bolsonaro no discurso para a ONU, é um acinte à inteligência nacional e internacional, uma agressão aos fatos, ao não falar de madeireiros, grileiros e especuladores impatrióticos”, criticou a senadora durante discurso no plenário, nesta quarta.

O número de 27 assinaturas corresponde a um terço dos 81 senadores com mandato, mínimo necessário para a abertura de uma CPI. O pedido foi protocolado na Mesa Diretora do Senado, mas a comissão só pode ser instalada se houver autorização de Alcolumbre.

A senadora Eliziane Gama criticou a condução da política ambiental pelo governo federal, em especial pelo Ministério do Meio Ambiente.

“Os dados apontam que tivemos apenas 0,4% de execução orçamentária do recurso para o meio ambiente, ou seja, nós temos pouco dinheiro para o meio ambiente, e o pouco dinheiro que temos ainda não é aplicado, o percentual, de fato, muito baixo”, declarou.

Em geral, as CPIs instaladas no Congresso têm prazo de 180 dias para funcionamento e, ao final, emitem um relatório para embasar processos das polícias e do Ministério Público.

A CPI tem poder de investigação similar ao das autoridades judiciais. Pode, por exemplo, determinar diligências, ouvir indiciados e testemunhas e requisitar serviços policiais.

Convite a autoridades

Também nesta quarta, a comissão do Senado que acompanha os incêndios no Pantanal aprovou convites para que quatro autoridades federais visitem as áreas afetadas pelo fogo.

Foram convidados o vice-presidente da República, Hamilton Mourão, e os ministros Ricardo Salles (Meio Ambiente), Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional), e Tereza Cristina (Agricultura). Por ser um convite, o atendimento dessas autoridades é opcional.

A comissão também aprovou um requerimento para realizar uma audiência pública com a presença do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux. A reunião ainda não tem data para acontecer.

No G1

Veja por que a família Bolsonaro pretende levar os bancos à falência...


Flávio, Jair, Carlos e Eduardo Bolsonaro. Os defensores da dita família tradicional conseguem ter uma relação
bem pouco, digamos, ortodoxa com o dinheiro. E assim era quando estavam fora do poder...

Joseph Safra é o homem mais rico do Brasil. Se a maioria das pessoas fosse como os Bolsonaros, o banqueiro teria de procurar outro meio de ganhar dinheiro. A intrépida família não confia em banco. Gosta mesmo é de lidar com dinheiro vivo. Parece ser algo que está no sangue. E não é de hoje. Pode-se falar que uma verdadeira dinastia se criou na política nota sobre nota. Como se sabe, é mais difícil rastrear a origem de dinheiro vivo

A vida financeira do primogênito, o senador Flávio, tem sido escrutinada. É um verdadeiro show de bizarrices. Até havia pouco, não se conhecia quase nada sobre a formação de patrimônio do Zero Três, o deputado Eduardo, uma espécie de ideólogo e pensador da família. É aquele que julga conhecer o pensamento do astrólogo Olavo de Carvalho e que pretende fundar no Brasil o braço da Internacional de extrema direita liderada pelo americano Steve Bannon, que já foi em cana nos EUA, acusado de fraude. Saiu do xilindró depois de pagar fiança de US$ 5 milhões. Adiante!

O jornal O Globo revelou que Eduardo comprou dois imóveis entre 2011 e 2016. Na soma, desembolsou R$ 150 mil em dinheiro vivo — ou R$ 196,5 mil em valor corrigido. As informações constam das escrituras públicas desses imóveis obtidas pelo jornal em dois cartórios da cidade.

Informa o texto:
A compra mais recente foi feita por Eduardo em 2016, quando ele estava no seu primeiro mandato como deputado federal. No dia 29 de dezembro de 2016, ele esteve no cartório do 17º Ofício de Notas, no Centro do Rio, para registrar a escritura de um apartamento comprado em Botafogo no valor de R$ 1 milhão. No documento ficou registrado que ele já tinha dado um sinal de R$ 81 mil pelo imóvel e que estava pagando "R$ 100 mil neste ato em moeda corrente do país, contada e achada certa".

Para registro. Em 2016, Eduardo estava apenas no segundo ano de seu primeiro mandato. Antes, era só um escrivão da Polícia Federal. Como já observei aqui, a família que veio para revolucionar o capitalismo brasileiro não gosta de ser testada na iniciativa privada, não é mesmo? Todos eles procuram um emprego público — pelo voto, é certo, mas os proventos que recebem têm origem no Estado. E púbicos eram também os recursos que foram parar nas contas dos funcionários de Flávio quando este era deputado federal. Parte da grana migrava depois para a conta de Fabrício Queiroz.

Uma coisa é inequívoca: os Bolsonaros são unidos. Um por todos, e todos por um. O mais iracundo deles, o vereador Carlos, também tem o que explicar, embora prefira o silêncio. É aquele rapaz que apela a metáforas eloquentes e viris como "movimento antidemocrático são meus ovos da goela". Como diria Faustão, "O loco, meu!" Ninguém entendeu se ele se referia a um deslocamento exógeno ou endógeno. Em sendo endógeno, é doença grave. Em sendo exógeno, além de antidemocrático, pode ser crime se não for consensual... Mas falemos de seus folguedos financeiros, não de outros.

Segundo informou o Estadão, Carlos comprou um apartamento quando tinha apenas 20 anos. E pagou como? Ora, no esforço da família para empobrecer o bilionário Joseph Safra, a operação se deu em dinheiro vivo. O jornal teve acesso ao documento de compra e venda do imóvel. Na época, em 2003, pagou R$ 150 mil pelo apartamento — que ainda pertence a ele — na Tijuca, no Rio. Foi o primeiro "AP" de Carlos, para empregar o termo que o bolsonarista Latino gloriosamente rimou com "bundalelê". Em valores corrigidos, seria como se um gajo de 20 anos pagasse R$ 370 mil em dinheiro vivo pelo bundalelê.

Lembra o Estadão:
Carlos Bolsonaro é investigado por suspeita de nomear no seu gabinete funcionários que lhe repassariam, totalmente ou em parte, seus salários. Ao todo, 11 servidores estão sob investigação do Ministério Público. A maioria é ligada a Ana Cristina Siqueira Valle, que não é mãe de Carlos, mas foi casada com o pai do vereador."

Se há coisa de que não se deve desconfiar em matéria de família Bolsonaro é que jaca não cai longe da jaqueira. Os filhos não decepcionam o pai. Reportagem da Folha evidenciou que, entre 2008 e 2014, o clã fez várias doações eleitorais em dinheiro vivo às respectivas candidaturas: R$ 100 mil no total — ou R$ 163 mil em valores corrigidos.

Informa o jornal:
Reportagens e dados obtidos por órgãos de investigação mostraram que a família Bolsonaro, especialmente na figura do senador Flávio Bolsonaro, já movimentou mais de R$ 3 milhões em dinheiro vivo nos últimos 25 anos. Entre as operações em espécie, segundo as apurações, estão a compra de imóveis, a quitação de boletos de planos de saúde e da escola das filhas de Flávio, o pagamento de dívidas com uma corretora e depósitos nas contas da loja da Kopenhagen da qual o senador é dono.

Os passadores oficiais e oficiosos de pano nas lambanças dos Bolsonaros logo dizem: "Ah, vai querer comparar esses valores com os escândalos do petrolão?" Ah, não! Não estou comparando nada com nada. Estou falando de moralidades e imoralidades em si. De resto, os acusados do petrolão estão pagando caro até quando não há provas. A família não poderia ser protagonista de tal escândalo porque estava fora do poder, não é?

Os Bolsonaros movimentaram essa bolada toda em grana viva sendo marginais da política. O que ainda nos dirá o tempo, agora que estão no centro? Uma coisa é certa: eles fazem o diabo para que nada seja investigado.

Se o mundo fizesse como os Bolsonaros, os bancos iriam à falência.