domingo, 31 de maio de 2020

Brasileiro envia coroa de flores para o armamentismo


Bolsonaro simula uma arma de fogo. Foto: Agência Brasil

Certas ideias, por esdrúxulas, têm vocação para a morte. O armamentismo de Jair Bolsonaro, por exemplo, é uma dessas propostas que começam a morrer antes que o autor as pronuncie.

Em 22 de abril, durante a sessão de strip-tease administrativo que chamou de conselho de governo, Bolsonaro deu vida à tese segundo a qual é preciso armar o povo para evitar um golpe.

Bolsonaro enxergou o fantasma de um golpe atrás da política de isolamento social. Daí a ideia de armar o brasileiro, para que ele desafie a autoridade de governadores e prefeitos.

"Como é fácil impor uma ditadura no Brasil! Como é fácil!", disse Bolsonaro. "O povo tá dentro de casa. Por isso que eu quero, ministro da Justiça e ministro da Defesa, que o povo se arme! Que é a garantia que não vai aparecer um filho da puta pra impor uma ditadura aqui!"


Os brasileiros enxergaram na ideia do presidente tão pouca chance de sobreviver que enviaram uma vistosa coroa de flores. Segundo o Datafolha, 72% dos patrícios rejeitam a distribuição de armas.

É como se os governados fornecessem a Bolsonaro um valioso ensinamento: em meio a uma pandemia que produz cadáveres em escala industrial, quando um hipotético presidente não tem nada a dizer, o melhor a fazer é evitar traduzir em palavras o vazio da sua precariedade.

Por Josias de Souza

Para Bolsonaro, STF e PF usam filhos para atingi-lo


ADRIANO MACHADO

Alheio aos apelos da cúpula do Congresso, Jair Bolsonaro declara-se disposto a medir forças com o Supremo Tribunal Federal. Ele construiu uma teoria. Em privado, acusa ministros da Corte e uma ala da Polícia Federal de utilizar seus filhos para prejudicá-lo, inviabilizando sua Presidência. Promete reagir.

Em visita ao Planalto na última quinta-feira, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, aconselhou Bolsonaro a parar de "esticar a corda" com o Supremo. Ele respondeu que se considera "desrespeitado". Estaria apenas "reagindo". 

Neste sábado, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, insinuou numa videoconferência que Bolsonaro produz uma instabilidade que inibe inclusive os investimentos. "O ideal é que a gente consiga ter mais harmonia e menos conflito."

No gogó, Bolsonaro até concorda com a premissa constitucional de que Executivo, Legislativo e Judiciário devem operar de forma independente e harmônica. Mas ele diz a auxiliares que a coisa só funciona se houver "respeito mútuo."


Embora não utilize a palavra, Bolsonaro fala como se enxergasse a formação de complô para apeá-lo do Poder. Nessa versão, os filhos Flávio, Carlos e Eduardo Bolsonaro seriam usados como degraus para atingir o pai.

Na percepção do presidente, o primogênito Flávio Bolsonaro está prestes a ser arrastado para dentro do inquérito em que Sergio Moro o acusa de tramar uma intervenção política na Polícia Federal. O caso é relatado no Supremo por Celso de Mello.

Bolsonaro se diz convencido também de que os filhos Carlos e Eduardo são personagens ocultos do inquérito em que parlamentares, ativistas e empresários bolsonaristas são acusados de difundir fake news nas redes sociais. Nesse caso, o relator é Alexandre de Moraes.

Causou irritação a Bolsonaro uma petição encaminhada a Celso de Mello pela delegada federal Christine Correa Machado. Na peça, a doutora pede a prorrogação por 30 dias do inquérito que apura as acusações de Moro.

Ao justificar o pedido, a delegada alegou que precisa realizar novas diligências. Incluiu no rol de pendências a resposta a um ofício encaminhado à Justiça Eleitoral, no Rio de Janeiro. O documento requisita informações sobre investigação relacionada ao suposto enriquecimento ilícito de Flávio Bolsonaro.

A pretexto de negar que tivesse interesse em intervir na PF, Bolsonaro dissera que a superintendência do órgão no Rio jamais investigara sua família. Era lorota. A pedido da Justiça Eleitoral, a PF varejara transações imobiliárias do Zero Um. 

Flávio não foi indiciado. Mas o Ministério Público se negou a arquivar o processo. A investigação permanece aberta. Algo que reforçaria a suspeita de intervenção levantada por Moro.

Na petição enviada a Celso de Mello, a delegada da PF enumera outras diligências. E antecipa a intenção de interrogar o próprio presidente da República. 

O relator aguarda manifestação do procurador-geral da República Augusto Aras sobre o pedido da PF. Mas Bolsonaro dá de barato que Celso de Mello autorizará a prorrogação das investigações por 30 dias.

"Estão muito enganados se acham que o presidente Bolsonaro vai aceitar passivamente ser tratado como um novo Michel Temer", declarou o auxiliar do Planalto.

Considerando-se o que diz entre quatro paredes, Bolsonaro trata como favas contadas também o suposto interesse do ministro Alexandre de Moraes de implicar seus outros dois filhos —Carlos e Eduardo—no inquérito sobre fake news. "Para nós, é questão de tempo", diz o assessor.

Não é só. Bolsonaro sente cheiro de queimado no Tribunal Superior Eleitoral, que está sob nova direção. Acaba de assumir a presidência do TSE o ministro Luís Roberto Barroso. Ascendeu à vice-presidência o ministro Edson Fachin. 

Barroso e Fachin ocupam assentos também no Supremo. O primeiro atuou como algoz de Temer. O segundo é relator da Lava Jato. Suspeita-se no Planalto que a dupla levará à vitrine pedidos de cassação da chapa vitoriosa na campanha presidencial de 2018, acusada de praticar golpes baixos no WhatsApp e outras redes sociais.

Por uma trapaça sorte, Alexandre de Moraes, o relato do inquérito sobre fake news, também passará a dar expediente no TSE. Avalia-se que Moraes não hesitará em compartilhar com a Justiça Eleitoral dados colecionados no inquérito que corre no Supremo.

Maioria já vê código de barras no governo Bolsonaro


Maioria já vê código de barras no governo Bolsonaro - 30/05/2020 ...

De todas as notícias que o Datafolha trouxe para Jair Bolsonaro nos últimos dias, a mais simbólica ganhou as manchetes neste sábado: 67% dos brasileiros reprovam o casamento do capitão com o centrão

Significa dizer que praticamente sete em cada dez patrícios passaram a enxergar no governo um código de barras presumido, marca registrada do pacto demoníaco que rege as coligações no Brasil.

Bolsonaro ainda faz pose de limpinho. Alega que negocia cargos de escalões inferiores, não ministérios ou estatais. Tolice. No fisiologismo, integridade é como virgindade. Não existe pela metade. Também não dá segunda safra. Perdeu, perdida está.

O presidente comporta-se, de resto, como um gestor idealista que se rende à realidade. Nessa versão, Bolsonaro seria apenas um presidente bem-intencionado forçado a lidar com uma classe política viciada. 

Assim, Bolsonaro adotaria os meios dos parceiros apenas para obter suas nobres finalidades. Bobagem. O capitão se rende para evitar que apertem a corda que ele amarrou ao redor do seu próprio pescoço.

Outra alegada diferença entre o toma-lá-dá-cá de Bolsonaro e o escambo dos antecessores seria a "exigência" de que os partidos do centrão façam indicações técnicas. Conversa mole.

Na máquina estatal, não basta ser técnico. É preciso saber a serviço de quem estarão as habilidades técnicas dos apadrinhados. Se Sergio Moro ainda fosse ministro, Bolsonaro poderia chamá-lo para uma conversa.

Moro relataria uma experiência que viveu como juiz da Lava Jato. Deu-se no interrogatório do primeiro depoimento do delator Paulo Roberto Costa. Ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulinho, como Lula o chamava, foi inquirido em outubro de 2014.

Funcionário de carreira da Petrobras, o réu chegou à diretoria por indicação do PP, um dos partidos que agora se achegam aos cofres da gestão Bolsonaro. Antes de dar por encerrado o interrogatório, Moro perguntou se Paulinho gostaria de "dizer alguma coisa". 

E o réu: "Queria dizer só uma coisa, Excelência. Eu trabalhei na Petrobras 35 anos. Vinte e sete anos do meu trabalho foram trabalhos técnicos, gerenciais. E eu não tive nenhuma mácula nesses 27 anos. Se houve erro —e houve, não é?— foi a partir da entrada minha na diretoria por envolvimento com grupos políticos, que usam a oração de São Francisco, que é dando que se recebe. Eles dizem muito isso. Então, esse envolvimento político que tem, que tinha em todas as diretorias da Petrobras, é uma mácula dentro da companhia."

Ou seja: em meio a muitas dúvidas sobre o modo como Bolsonaro administra o balcão, só uma coisa é certa: ainda que o centrão retirasse coelhos de suas cartolas, o objetivo do grupo seria transformá-los em gambás.

De acordo com o Datafolha, 64% dos entrevistados disseram que Bolsonaro descumpre o que prometera na campanha de 2018 sobre o modo como se relacionaria com o Legislativo. Esse sentimento coletivo tem um nome na política. Chama-se estelionato eleitoral.

Por Josias de Souza

sexta-feira, 29 de maio de 2020

Bolsonaro sofre: ignorância, truculência e baixa autoestima roem-lhe a alma


Acabou, porra': as reações de Bolsonaro e aliados um dia após ...

O senhor Jair Bolsonaro é um falastrão, um sectário vulgar, um chefete de facção. Seu discurso desta quinta às portas do Palácio do Alvorada, com aquele teatral "Chega, porra!", é prova da sua fraqueza, não da sua força. Quase ao mesmo tempo em que ele soltava seus perdigotos de ignorância reacionária, militares os mais variados descartavam a chance de um golpe de Estado. E que fique claro! Não é que Bolsonaro não queira a ruptura institucional. Ele quer, sim! Só que ele não pode.

Seu faniquito desta quinta era, reitero, evidência de fragilidade, não de potência — ao menos para seus propósitos. Como ele, de fato, não assimilou os fundamentos da democracia; como é um autoritário bronco e grosseiro; como é incapaz de se adequar a normas e regras — incluindo as do Exército, de onde foi chutado por ser mau militar —, não pode compreender que os outros não façam as suas vontades. 

A INVENÇÃO DE BOLSONARO
Será que existe nele alguma crença consistente, um conjunto de valores, uma ideologia? Só as do oportunismo. Se notarem, ele converte em valor universal tudo o que limita o seu espírito de chefete de quarteirão. O "Bolsonaro defensor da família", por exemplo, é tão "fake" como o "Bolsonaro liberal". Ele foi amealhando crenças e convicções alheias aqui e ali e inventou uma personalidade política em tempos de Internet.

"Homem de família"? No mínimo, de "famílias", o que falseia o conservador que, a um só tempo, não cederia e seria inexcedível na estreiteza de costumes. Conversa mole. Não, eu não tenho nada contra a que as pessoas se casem e se descasem quantas vezes julgarem necessário. Mas não podem se apresentar como exemplo de padrão cuja virtude estaria em não mudar. 

Observem como Bolsonaro adula o eleitorado evangélico, sem se converter ele próprio, preferindo dizer-se católico, denominação cristã de vivência, senão de critérios doutrinários, mais lassos, mais elásticos. Com a devida vênia, não conheço um só religioso que vislumbre nele uma centelha que seja de iluminação metafísica. Não pode haver as virtudes essenciais da tolerância e da caridade onde falta empatia com os que sofrem. E ele não tem nenhuma.

Assim, "Deus acima de todos" não é uma crença, mas um lema publicitário que, com efeito, seduz milhões de pessoas que reagem à progressiva laicidade do mundo apegando-se a quem promete fazê-lo marchar para trás. O fenômeno não é nacional. Manifesta-se em boa parte das democracias ocidentais. Alguém é realmente capaz de imaginar um Bolsonaro que reza por si mesmo, em busca de contenção, e pelo outro?

A esse conservadorismo "fake" de estranhas noções de Deus e de família, ele juntou, na reunião do dia 22 de abril, a economia de mercado — mal tem noção do que seja — e a obsessão pelas armas. Nem vou especular aqui se tal discurso é gratuito ou pago. O certo é que transformar a questão num dos nortes do seu governo evidencia uma escolha mais ampla: não existem adversários, só inimigos. E estes têm de ser eliminados. Por isso confessou na tal reunião que arma a população de olho numa guerra civil.

AINDA COM APOIO
Sim, esse discurso atrai hoje milhões de pessoas. O número é decrescente, mas ainda é grande. E evidencia resiliência. E, para estes, ele precisa alimentar a fantasia do Super-Homem que grita com os ministros do Supremo: "Chega, porra!". A bravata quer dar a entender que ele já aplicou uma chave de braço no tribunal, que, doravante, não tomaria mais decisões que não fossem do seu agrado.

Sabem por que Bolsonaro esbraveja contra o Supremo? Justamente porque é a única coisa que lhe resta a fazer. Incapaz de responder às múltiplas crises em curso, sobra-lhe apenas essa permanente reafirmação de autoridade, o que, convenham, evidencia justamente a deterioração da sua... autoridade.

Não é por acaso que Bolsonaro se mostra incapaz de uma convivência civilizada com os outros Poderes. Isso supõe relação de trocas simbólicas — não aquelas que faz o Centrão —, o que significa que o chefe do Executivo precisa de algo a oferecer: um caminho, uma direção, uma ideologia que fosse. E Bolsonaro não tem nada porque não pensa nada.

BAIXA AUTOESTIMA
Ele não se vê como um presidente que é expressão de um sistema que existia antes dele e que sobreviverá a ele. Na sua mentalidade estreita, ou o Brasil triunfa com ele, o que implicaria a submissão dos demais Poderes, ou ambos mergulham no abismo. Não que devamos necessariamente nos compadecer, mas uma coisa eu lhes asseguro: ele sofre bastante, sim! Seu rosto espelha isso.

Imaginem a tortura psicológica em que vive um indivíduo que sabe estar no topo de algo cujo funcionamento desconhece; entregue a circunstâncias que jamais serão de seu controle — e não me refiro à indeterminação da história a que todos estamos sujeitos, mas à rotina da administração e às escolhas estratégicas que um governante faz —, esmagado pela ignorância em sentido amplo e específico; obrigado a conviver com problemas que, a cada dia, pedem respostas que ele não pode dar.

Onde está o conforto? Em refugiar-se na sua bolha de autocomplacência, cercado por eunucos aduladores que, não obstante, têm seus próprios interesses, pregando a uma grei de fanáticos do nada, cuja única pauta e reprimir os conspiradores, que vêm a ser nada menos do que o resto da humanidade.

Ele não vencerá a batalha do golpe. Mas, acima de tudo, não conseguirá vencer a si mesmo. Tamanha agressividade, de resto, revela uma baixíssima autoestima, o que faz dele, sim, um sujeito perigoso. Não porque tenha condições de liderar um golpe, mas porque seu comportamento nocivo corrói a institucionalidade.

Por Reinaldo Azevedo

Ele grita a sua impotência. Ou: Vamos ver como seria o "gorpe do Parmito"


Reprodução/Disney

Quanto mais o presidente Jair Bolsonaro grita, mais revela a sua incapacidade de realizar aquilo com que nos ameaça: desfechar um golpe de estado. É claro que seu comportamento nesta quinta foi execrável. Em que democracia do mundo o chefe do Poder Executivo, seja exercido por um presidente, seja por um primeiro-ministro, se refere ao Poder Judiciário naqueles termos? Não existe. Faz mal ao país. Cria tensões internas e prejudica sua imagem no mundo, o que afasta investimentos. Golpe? Não! Não haverá.

Mas especulemos sobre tal cenário para dar relevo à sandice. Então vamos lá: os senhores oficiais-generais botam seus tanques na rua, seus aviões nos ares e decretam um bloqueio marítimo. Soldados invadem emissoras de televisão e rádio e as redações de jornais e portais. Blindados cercam o Congresso Nacional e o Supremo, e ordens de prisão são expedidas para os 11 ministros do tribunal e os presidentes das respectivas Casas Legislativas. 

Nos Estados, suponho, os respectivos comandantes das Polícias Militares, aderindo ao golpe com suas tropas, teriam de dar voz de prisão, numa primeira conta, a pelo menos 18 governadores. Enquanto isso, o general Eduardo Pazuello, ministro da Saúde, num esforço de guerra — ou de golpe — converteria o setor metalúrgico à produção de contêineres frigoríficos para juntar os cadáveres da Covid-19 com os da resistência à quartelada. O Zero Um, o Zero Dois e Zero Três se dedicariam a redigir os atos institucionais.

O que diria o mundo? Bem, de imediato, o Brasil seria expulso do Mercosul, com a Argentina fechando as suas fronteiras, cessaria todo o comércio com a União Europeia, e Donald Trump pouco poderia fazer pelo "Capitão" porque teria se enfrentar o Congresso dos EUA. O Brasil seria uma ilha de coronavírus cercada de generais por todos os lados, a bater continência para um capitão golpista. O dólar escalaria o Everest, as empresas com ação em Bolsa iriam para o vinagre, e as elites empresarial e financeira que hoje toleram Bolsonaro lhe dariam um pé no traseiro. Quantos dias — não meses — duraria a aventura? Poucos. Terminariam todos na cadeia.

Sem contar que o Exército, na hipótese de topar a quartelada, teria de dar um golpe também na Aeronáutica e na Marinha, que estão voando e navegando para Bolsonaro. Há, sim, radicais e porras-loucas entre os militares, como há entre civis, mas essa é uma conversa de insanos. Quando o general Fernando Azevedo e Silva, ministro da Defesa, simula a ordem unida com os desvarios do capitão, dá a ele a ilusão de que um golpe seria possível, o que o leva a radicalizar o discurso.

Digo, e muitos não gostarão de ler, que o golpe seria o caminho mais curto para Bolsonaro ser espirrado do poder. Só não é desejável porque pessoas morreriam, ficaríamos ainda mais pobres e levaríamos algumas décadas para nos levantar do opróbrio internacional. Agora vamos ao Bolsonaro às portas do Alvorada:
"Acabou, porra! Me desculpem o desabafo. Acabou! Não dá para admitir mais atitudes de certas pessoas individuais, tomando de forma quase que pessoal certas ações."

Estava se referindo, claro, ao Poder Judiciário, como se, a partir de gora, o Supremo não mais tivesse autonomia para tomar decisões.

Qual é a verdade? Todas as vezes em que ele tentou ultrapassar a linha da legalidade, é bom que fique claro, foi, sim, tolhido pelo tribunal. Daí o seu rancor. Quanto vale o seu "acabou, porra"? Uma nota de R$ 3. Os ministros podem, se quiserem, endurecer ainda mais o jogo? Podem. Por que não o fazem? Porque gera tensão interna, que reflete nos indicadores da economia e podem tornar ainda mais ineficiente um governo já sofrível, o que faz ainda mais difícil a vida dos pobres.

O faniquito de Bolsonaro é o faniquito da impotência.

Ele grita a sua impotência. Ou: Vamos ver como seria o "gorpe do Parmito".

Por Reinaldo Azevedo

STF faz a sua parte em defesa das instituições - Congresso tem sido omisso


Davi Alcolumbre e Rodrigo Maia, presidentes, respectivamente, do Senado e da Câmara. O segundo tem cumprido o seu papel; o primeiro tem sido omisso no combate aos arreganhos autoritários de Bolsonaro - Reuters

Se o Supremo tem resistido às investidas autoritárias de Jair Bolsonaro, o mesmo não se pode afirmar sobre, por exemplo, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, que preside também o Congresso. Rodrigo Maia, que comanda a Câmara, tem reagido com a devida presteza aos insultos à ordem legal.

Num dia como ontem, com o presidente berrando contra o Supremo e Eduardo, um de seus filhos, a sair por aí fazendo pregação golpista, Alcolumbre foi ao Palácio do Planalto para pregar entendimento entre os Poderes. Ao falar com colegas, afirmou que a conversa com Bolsonaro tinha sido boa, seja lá o que isso signifique. 

Maia tem sido claro em repelir arreganhos golpistas, mas o Congresso, como Poder, está se aviltando. Deputados como o próprio Eduardo e Bia Kicis têm de ser cassados. A pregação golpista que fizeram na quarta-feira em live na Internet não está coberta pela imunidade do Artigo 53 da Constituição. São imunes, sim, por "opiniões, palavras e votos": pregar golpe de Estado, anunciar articulações com essa finalidade, sustentar que a ruptura com a ordem democrática — e a consequente vinda do caos — não é mais uma questão de "se", mas de "quando" é, além de crime, quebra do decoro parlamentar.

O próprio Supremo já deixou claro — e Bolsonaro é réu lá duas vezes — que um deputado é inimputável por suas palavras e opiniões desde que crimes não estejam sendo cometidos; a imunidade existe para o exercício da função, não para atuar à margem da lei. Mas notem: não teria de ser um outro Poder a espirrar esses tipos da vida pública: é uma tarefa da própria Câmara. Ou será que um Poder pode abrigar representantes que, na prática, pregam o seu fechamento?

Enquanto o Congresso tolerar tipos que agridem a essência da representação democrática, que flertam abertamente com atos terroristas, que fazem a política da ameaça e da chantagem, o que se tem é a progressiva degradação da democracia. Não vai ter golpe, não. Mas só isso não resolve. É preciso que se estabeleçam as linhas do aceitável e do inaceitável.

Na verdade, já estão estabelecidas. O Código de Ética da Câmara e o do Senado punem com cassação comportamento como o desses senhores. No Senado, note-se, inexistem arreganhos dessa natureza. Sabem como é... Flávio tem de seus ocupar de seus fabrícios... Urge que se inicie a formação de uma frente suprapartidária, independentemente de corte ideológico, em defesa do Código de Ética da Câmara e, pois, de sua aplicação.

É evidente que também a Procuradoria Geral da República deveria se ocupar de tais atos na esfera penal. Mas não esperemos que Augusto Aras se mova, como já resta evidente. Por ora, ele se comporta mais como advogado de Bolsonaro do que como expoente máximo de um ente cuja tarefa fundamental é ser fiscal da lei.

O Supremo, com erros aqui e ali, tem feito a sua parte na defesa das instituições. O Congresso está tergiversando e sendo condescendente com pistoleiros contra a democracia e o estado de direito. É claro que há lá muita gente boa e preocupada. Faz-se necessária, no entanto, uma reação institucional e prática: pregar golpe de Estado tem de começar a gerar prejuízos efetivos aos golpistas.

Insisto na questão e na resposta: há risco de golpe? Não! Mas esse não é o único mal que pode acontecer ao Brasil.

Por Reinaldo Azevedo

Embraer atrai interesse estrangeiro após fracasso com Boeing


Embraer culpa queda em entregas de jatos a acordo fracassado com ...

Fabricantes estrangeiros de aviões estão rondando a Embraer semanas após a Boeing abandonar os planos para uma combinação histórica na aviação comercial, disseram pessoas familiarizadas com o assunto.

O chinesa COMAC sinalizou interesse em cooperação com a unidade comercial da terceira maior fabricante de jatos do mundo, disseram duas pessoas. A Irkut, da Rússia, também estudou o caso, disseram outras duas, apesar de a empresa negar interesse na Embraer.

A Índia, outra potência aeroespacial em ascensão focada principalmente na defesa, mas com um enorme mercado civil, também sinalizou interesse ao estudar o assunto, disseram fontes.

Isso coloca o destino da Embraer no centro do chamado grupo de nações do BRIC, com cada um exibindo seus palpites, enquanto gigantes ocidentais Airbus e Boeing se recuperam da crise dos coronavírus.

A COMAC e o ministério da aviação civil da Índia não responderam aos pedidos de comentários. Uma porta-voz da Irkut negou qualquer interesse ou conversa sobre a Embraer.

A Embraer não comentou.

A COMAC e a Irkut estão desenvolvendo aeronaves para competir diretamente com a Airbus e a Boeing no movimentado mercado de até 150 assentos. Os planos da China são vistos como os mais avançados.

Um acordo com a Embraer agregaria experiência em engenharia e suporte global, mas também entraria em conflito com jatos regionais menores e comercialmente menos bem-sucedidos desenvolvidos pelos dois países.

Uma fonte da indústria russa disse que a controladora da Irkut, a Rostec, está se concentrando nos programas existentes MS-21 e Superjet.

Embora tenha investido pesadamente em peças e manutenção, a Índia é o pretendente menos visível no setor aeroespacial comercial, sem outro projeto ativo de uma aeronave de 14 lugares chamada SARAS.

Mas existe um requisito potencial para o desenvolvimento de um jato regional de 80 a 90 lugares - uma categoria ocupada pela Embraer - para o projeto UDAN, assinado pelo primeiro-ministro Narendra Modi, para expandir os serviços aéreos para pequenas cidades.

R.K. Tyagi, ex-presidente da Hindustan Aeronautics, estatal, disse que escreveu ao governo pedindo que ele se movesse rapidamente.

"Qualquer país com ambições analisará isso. Sinto que essa é uma boa oportunidade. O preço (valuation) está baixo e se conseguirmos o controle de um programa de aeronaves moderno e comprovado, será um grande salto."

Funcionários do governo Modi e um grupo de estudo do governo estão juntando uma nota, mas nenhuma representação formal foi feita no Brasil até agora, disse um funcionário ciente dos planos.

AVALIAÇÃO

Um alto executivo da Embraer disse à Aviation Week em 1º de maio que não havia iniciado conversações com ninguém, mas que não podia "legislar para as chamadas de entrada que poderiam vir".

A Embraer disse que considerará os próximos passos com cuidado. Uma das principais dores de cabeça é o seu valor de mercado, que caiu 64% este ano, abaixo do desempenho do setor de aviação atingido pela crise.

A Embraer relutará em vender muito barato em um mercado deprimido pelo coronavírus, mas suas opções são limitadas, embora seja o único fabricante em larga escala disponível, disse Richard Aboulafia, analista do Teal Group.

"A Embraer é uma empresa comercial fantástica, mas poucas pessoas estão tentando comprar uma empresa comercial", disse ele.

No Extra

Inquérito das fake news pode abrir caminho para cassação de Bolsonaro no TSE


Bastidores: Bolsonaro prepara ‘cavalo de pau’ no governo

O controverso inquérito que apura ameaças, ofensas e fake news contra ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) pode pavimentar o caminho da cassação do presidente Jair Bolsonaro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A avaliação entre ministros do tribunal é a de que, caso seja autorizado, um compartilhamento das provas do STF com a Justiça Eleitoral deve dar um novo fôlego às investigações que apuram o disparo de mensagens em massa na campanha presidencial de Bolsonaro em 2018. A possibilidade dessas ações serem “turbinadas” com o inquérito das fake news do Supremo já acendeu o sinal de alerta do Palácio do Planalto.

O ministro Alexandre de Moraes é um personagem-chave nos dois tribunais. Relator do inquérito das fake news, o ministro do Supremo determinou a quebra do sigilo bancário e fiscal de empresários bolsonaristas no intervalo de julho de 2018 a abril de 2020, abrangendo, portanto, o período das últimas eleições presidenciais. Na próxima terça-feira, Moraes deixa a vaga de substituto e vai assumir uma cadeira de ministro titular do TSE, o que vai lhe garantir a participação no julgamento das ações que investigam a campanha de Bolsonaro e do seu vice, Hamilton Mourão.

Moraes é visto com desconfiança e considerado um ministro “militante” por aliados de Bolsonaro devido à sua proximidade com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). O ministro também é relator de um inquérito que investiga atos antidemocráticos que ocorreram em abril em todo o País - Bolsonaro participou de um deles em Brasília, diante do quartel general do Exército.

Se a chapa Bolsonaro-Mourão for cassada ainda neste ano pelo TSE, novas eleições deverão ser convocadas e caberá à população brasileira ir às urnas para definir o novo ocupante do Palácio do Planalto. Caso o presidente e o vice sejam cassados pelo tribunal em 2021 ou 2022, o Congresso fica com a escolha do novo chefe do Executivo. Até hoje, o TSE jamais cassou um presidente da República. Segundo fontes ouvidas pela reportagem, o cenário atual dentro do tribunal é favorável à manutenção do mandato de Bolsonaro.
Compartilhamento

Ao todo, ainda tramitam no TSE oito ações que investigam a campanha de Bolsonaro e Mourão - duas delas, sobre o hackeamento no Facebook do grupo “Mulheres unidas contra Bolsonaro”, que reunia 2,7 milhões de pessoas, devem ser julgadas nas próximas semanas pelo plenário. A tendência é que sejam arquivadas, mesmo destino de outras sete que já foram julgadas.

As ações mais delicadas são as que tratam do disparo de mensagens em massa pelo WhatsApp. O PT já pediu ao relator dos processos, ministro Og Fernandes, o compartilhamento das provas do Supremo com o TSE. Em agosto, Og vai deixar o tribunal e vai ser sucedido por Luís Felipe Salomão, que assumirá a relatoria dos casos.

O compartilhamento de provas do Supremo com o TSE já aconteceu nas ações que investigavam a chapa presidencial de Dilma Rousseff e Michel Temer em 2014. Naquela ocasião, os depoimentos de delatores da Odebrecht e do casal de marqueteiros João Santana e Mônica Moura incrementaram as ações, que investigavam suposto abuso de poder político e econômico.

A maioria dos ministros, no entanto, desconsiderou na etapa final do julgamento as provas colhidas nessas delações, por concluir que elas eram “alheias” ao objeto inicial da investigação - a chapa Dilma-Temer acabou absolvida por 4 a 3. Desta vez, por outro lado, ex-ministros do TSE e advogados eleitorais ouvidos reservadamente pela reportagem apontam que as provas colhidas no inquérito das fake news têm, sim, relação com as investigações em curso na Justiça Eleitoral.

Uma fonte da cúpula da Procuradoria-Geral da República (PGR) aponta que, até agora, as acusações de disparo de mensagens em massa não estão comprovadas. Já um ex-ministro do TSE observa que não basta identificar a irregularidade, mas considerar a sua escala. Por se tratar de uma campanha presidencial, a dimensão da irregularidade deveria ser alta o suficiente para se constatar a quebra da normalidade da legitimidade do pleito, justificando, dessa forma, a cassação.

Dos atuais sete ministros titulares da Corte, dois foram nomeados por Bolsonaro - Sérgio Banhos e Tarcísio Vieira. Os demais são ministros do STF e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que acumulam os tribunais de origem com o TSE em um esquema de rodízio.

No Estadão

22 de abril de 2020 – Dia Nacional do Horror


Jair Bolsonaro durante reunião ministerial ocorrida no dia 22/04/2020
 e citada pelo ex-ministro Sergio Moro em depoimento à PF Marcos Corrêa/PR

Nesse dia, nós brasileiros atentos que acompanhamos as notícias diárias, tivemos certeza de quem são os componentes do ministério Bolsonaro & Filhos. Sabíamos que a maioria não era flor que se cheire, mas não sabíamos até que ponto eram insalubres. Depois de ver o vídeo da reunião ministerial desse dia 22, tivemos a certeza de quem são.

Claro está que a maioria é a imagem e semelhança do chefe, o Presidente da República com o menor vocabulário que já se viu num político. Para ele, porra é vírgula. Sua falta de instrução é absoluta e dá até pena ver o esforço que faz no cercadinho do Alvorada, para completar uma frase, sempre enfeitada com palavras chulas.

Mas voltemos à já célebre reunião.

Começo com Paulo Guedes, ministro da Economia que, em tom enfático e agressivo, declarou sua opinião sobre o Banco do Brasil. Para ele, essa instituição criada em 1808 por Dom João VI, “aquela porra”, como ele a definiu, devia ser vendida. Além disso, ele exprimiu seu apoio ao presidente para a criação, em Angra dos Reis, de uma Cancún tupiniquim, com jogos de azar e belas raparigas preparadas para agradar aos frequentadores do resort. Será que nós precisávamos de um Posto Ipiranga formado em Chicago, um leitor de Keynes (“no original” como ele fez questão de exibir) para dar uma opinião tão favorável ao desenvolvimento econômico do Brasil? Custo a crer.

E o Ricardo Salles, ministro do Meio-Ambiente? Esse sujeito disse, muito calmamente, e com ares de quem estava sendo um grande ministro, que devíamos aproveitar que a Imprensa estava ocupada com a pandemia provocada pela Covid 19 para passar logo a boiada e acabar com essa delicadeza em relação ao meio-ambiente. Chega de proteger nossas matas e nossos rios. Vamos logo ganhar dinheiro!

Não posso esquecer de falar na Damares que, trepando numa goiabeira, viu Jesus. Ela sugere que se processe e prenda todos os governadores e prefeitos! Para que servem essas pessoas, não é, dona Damares? Basta, para administrar o país, os bolsonaristas de raiz, como ela. Sempre com o dedinho em riste, como velha mestra que foi.

E o titular da Educação? Aquele que quando encontra uma palavra com dois esses ou ç fica em dúvida sobre qual a grafia usar? E que sempre erra. Aquele que se acha tão lindo que já se fotografou fazendo a barba para postar em suas redes sociais. Pois esse ministro, de nome Weintraub, disse, em tom apropriado a ator de filme de terror, apontando para a Esplanada dos Ministérios e falando do STF : ‘Eu, por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia, começando no STF’. (Já eu, por mim, botava o Weintraub na cadeia…).

Enquanto esses ministros e outros davam suas breves e estúpidas declarações, Bolsonaro não parava de falar e de exibir seu vasto conhecimento de palavras escatológicas. O homem é um moinho de baixarias. Eu só me lembro que logo após sua eleição, numa entrevista, um jornalista perguntou à sua mulher como era conviver com pessoa tão difícil. E ela respondeu, sorridente: “Vocês ainda verão como erram em relação a ele. Meu marido é um príncipe”!

Será que agora ela já se convenceu que ele pode ser tudo, menos um príncipe? Sei lá. Há gosto para tudo. Até para ser a mulher de um Bolsonaro!

Bolsonaro & Filhos diz, em meio a um ‘porra’ e outro, que ninguém mais do que ele tem compromissos com a democracia. E que graças a essa qualidade extraordinária, não há inquérito que vá incomodar sua família ou seus amigos. “Chega, porra, basta!”

Ele vai proteger, ao lado dos seus zeros, a única mídia que o apoia, segundo ele. Bem, sejamos justos. Ao menos isso ele já percebeu…

Por Maria Helena Rubinato Rodrigues de Sousa

Coronel do Exército comanda serviço paralelo de informação para Bolsonaro


TRABALHO SECRETO - Marcelo Câmara (destacado no círculo): assessor especial para investigações, dossiês e caça a petistas infiltrados no governo Marcos Corrêa/PR

Coronel, qual é exatamente a sua função? Sou assessor especial do presidente da República, do gabinete pessoal. A gente trata de assuntos de referência ao presidente.

Que tipo de assunto? A gente faz trabalhos pessoais.

Assuntos de inteligência? Não. Trabalho como assessor do presidente, mas não com o tema de que você está falando.

O senhor apura informações para o presidente? Não tem nada disso.

O senhor pode citar um exemplo do seu trabalho? O gabinete pessoal trabalha com as coisas do presidente. Se tiver uma demanda, a gente faz um assessoramento, a parte de compliance. É só isso.

Compliance? Pesquise o que é compliance.

Primeiro a pesquisa: compliance, segundo o dicionário Aurélio, é um neologismo que significa a “ação de cumprir uma regra, procedimento, regulamento, geralmente estabelecidos por uma instituição e para ser cumpridos por quem dela faça parte”. O profissional de compliance é o encarregado de observar se as normas estão sendo seguidas. O trabalho do coronel do Exército Marcelo Costa Câmara é bem diferente disso. Ocupando uma sala no 3º andar do Palácio do Planalto, a poucos metros do gabinete do presidente, ele é um assessor mais do que especial. Por determinação de Jair Bolsonaro, conduz investigações, reúne informações e produz dossiês que já provocaram a demissão de ministros e diretores de estatais, debelaram esquemas de corrupção que operavam em órgãos do governo e fulminaram adversários políticos. Tudo de maneira muito discreta, sem alarde, praticamente às escondidas.

Pessoas próximas ao presidente costumam se referir ao coronel Câmara como “o cara da inteligência”. “Ele só cuida disso. Todas as denúncias que chegam, de dossiês a relatórios de informação, vêm dele”, conta um auxiliar de Bolsonaro. O trabalho de “compliance” do militar surgiu no início do governo, a partir de uma reclamação antiga do presidente que se tornou pública em meio às acusações de que ele tenta impor maior ingerência em órgãos como a Polícia Federal. Bolsonaro jamais confiou nos canais oficiais de informação, com destaque para a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), por acreditar que é composta de servidores ainda fiéis à gestão petista. Estaria, portanto, cercada de inimigos, e o presidente precisaria de alguém de sua estrita confiança para lhe passar informações verdadeiras, encaminhar demandas sobre assuntos delicados e orientar inclusive assuntos de sua segurança pessoal. Marcelo Câmara foi escolhido para a missão. Ex-assessor parlamentar do comando do Exército, o coronel foi nomeado para o cargo em fevereiro do ano passado. Dois meses depois, já mostrava a que veio.

ESCÂNDALO - Alertado pela inteligência, Bolsonaro demitiu o general Juarez Cunha e três diretores dos Correios Renato S. Cerqueira/José Cruz/Agência Brasil

Havia uma disputa de poder entre o então ministro-chefe da Secretaria de Governo, general Carlos Alberto Santos Cruz, e Carlos Bolsonaro, o filho do presidente, que suspeitava que o militar conspirava contra o pai. Na época, circularam mensagens de WhatsApp, atribuídas ao ministro, com críticas pesadas a membros do governo. Incentivado pelo filho, Bolsonaro quis demitir o general, mas decidiu antes acionar o coronel Câmara, que investigou o caso e descobriu tratar-se de uma armação contra o ministro, que ganhou uma sobrevida. Mais tarde, porém, a mesma mão que salvou o general fez chegar ao presidente a informação de que Santos Cruz o havia criticado numa conversa com colegas das Forças Armadas durante um evento em São Paulo. O ministro foi demitido.

O governo gosta de propagar que há mais de um ano não se registra um escândalo de corrupção, o que, de fato, é algo louvável. Uma das ações bem-sucedidas do coronel evitou que um caso embrionário pudesse estourar. Foi de sua pequena sala que saiu o alerta, em meados do ano passado, de que havia desmandos nos Correios. Em setembro, a suspeita foi materializada em uma operação da Polícia Federal que investigou a atuação de um grupo de funcionários do órgão pela prática de corrupção e concussão. Segundo a PF, os servidores instavam clientes a romper contratos com os Correios e a contratar o serviço postal de uma empresa ligada ao grupo criminoso. Antes de a operação estourar, porém, uma limpeza já havia sido feita no órgão. Bolsonaro demitiu o presidente da estatal, general Juarez Cunha, e três diretores. A ação que impediu o primeiro grande escândalo de corrupção no governo foi creditada ao aviso prévio de seu hoje braço direito e assessor especial.

INIMIGO - Há dois meses, a inteligência advertiu Bolsonaro de um caso de corrupção que resultou na operação que teve como alvo o governador Witzel Reprodução/Silvia Izquierdo/AP/.

O presidente Jair Bolsonaro tem certo fascínio por serviços de inteligência. Quando ainda estava no Exército, na década de 80, o ex-capitão foi transferido para Nioaque, Mato Grosso do Sul, onde ganhou a função de “oficial de informações”. A sua missão era produzir relatórios sobre a fronteira. Na famosa reunião realizada no último dia 22 de abril com seus ministros, Bolsonaro queixou-se de que não estava recebendo informações como gostaria. Disse que o único serviço que funcionava era “o meu particular”. Após essa declaração, o presidente foi cobrado a se explicar sobre o que seria esse sistema de informações privado. Indagado sobre o assunto na última terça-feira, 26, ele desconversou: “O meu serviço de informação reservado, particular, são as mídias sociais, é o meu WhatsApp, são amigos que tenho pelo Brasil”, afirmou — o que também não deixa de ser verdade (veja quadro na pág. 38).

Marcelo Câmara, de 50 anos, não trabalha sozinho. Dois assessores ajudam a cumprir as demandas do presidente — um capitão das Forças Especiais do Exército e um ex-­policial do Bope do Rio de Janeiro. No Planalto, o coronel não usa farda e apenas um grupo restrito sabe, ainda assim muito por alto, o que ele realmente faz. “É um agente de inteligência do presidente”, conta um ministro. Outro lembra que várias vezes já ouviu Bolsonaro, diante de um problema, apontar para a sala ao lado e dizer que ia “acionar o meu pessoal”. E o pessoal dele esteve em ação para averiguar com lupa cada passo de Luiz Henrique Mandetta no comando da Saúde. Desde o início do ano, o presidente tem sido municiado com informações sobre suspeitas de desvio de dinheiro público tanto no ministério como no Estado do Rio de Janeiro. Antes da pandemia, o então ministro já estava na mira. A Covid-19, revelou a VEJA um assessor do presidente, ao contrário do que se sabe, deu sobrevida a Mandetta no cargo.

Em abril, Bolsonaro recebeu em seu WhatsApp um vídeo de um apoiador que denunciava contratos atípicos de aquisição de respiradores assinados pela Secretaria de Saúde do governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, adversário do presidente. A mensagem, como de praxe, foi encaminhada para o coronel Câmara, que constatou que ela tinha procedência e havia indícios de crime. Pouco tempo depois, o Ministério Público do Rio deflagrou uma operação para prender os empresários e funcionários do governo estadual supostamente envolvidos. Ao puxarem esse fio, os investigadores trouxeram junto um novelo envolvendo um monumental esquema de corrupção. Na terça-feira 26, a Polícia Federal realizou buscas na casa do governador. A suspeita é que uma empresa contratada para construir hospitais de campanha durante a pandemia pagou propina para ganhar os contratos emergenciais. Witzel e sua esposa, Helena Witzel, são investigados como parte do esquema.

TESOUREIRO - A advogada Kufa, dirigente do partido Aliança: “Não sei qual é a função dele aqui” Pedro Ladeira/Ueslei Marcelino/Reuters

Além de farejar potenciais focos de corrupção, a pequena Abin do presidente vasculha o histórico de pessoas com quem Bolsonaro tem contato ou que são nomeadas pelo governo. No ano passado, essa checagem salvou o presidente do que poderia se tornar no mínimo um grande constrangimento. Em uma viagem a Manaus, o cerimonial agendou um almoço de Bolsonaro em um restaurante cujos donos eram empresários ligados ao narcotráfico. Depois da intervenção do coronel Câmara, o evento foi cancelado. Mais recentemente, o militar recebeu a missão de verificar se os integrantes da equipe da então secretária de Cultura, Regina Duarte, mantinham relações pretéritas com partidos de esquerda. Logo depois de concluído o trabalho, a atriz pediu para deixar o governo. Esta, aliás, é mais uma obsessão do presidente: a desconfiança de que é sabotado por adversários. O coronel costuma fazer uma varredura nas redes sociais de ocupantes de cargos de confiança para tentar descobrir “petistas infiltrados”. Já identificou vários — todos imediatamente afastados.

Com a mesma discrição, o coronel ainda cumpre uma missão fora do Planalto. Pelas mãos de Bolsonaro, Câmara foi nomeado como segundo tesoureiro do Aliança pelo Brasil, o partido do presidente. O que ele faz lá também é um mistério. “Não sei qual é a função dele aqui”, confessa Karina Kufa, que, além de dirigente da sigla, é advogada pessoal de Jair Bolsonaro. Embora na sombra, o fato é que o coronel Marcelo Câmara é um personagem importante no organograma do poder. Antes de encerrar a entrevista em que tentou minimizar suas atividades secretas como um simples trabalho de compliance, ele sugeriu que um resumo de suas atribuições estava disponível na agenda publicada no site da Presidência da República. De fato, está tudo lá. Do início da manhã ao final do dia, durante toda a semana, durante todo o mês, a agenda é quase totalmente dedicada a “despachos internos”. Despachos internos? “Se não ficou claro é porque são coisas pessoais sobre as quais não vou falar”, disse o espião do presidente antes de educadamente agradecer e desligar o telefone.

Com reportagem de Marcela Mattos

Olhar estrangeiro



Na política internacional, credibilidade e previsibilidade são dois fatores essenciais para o sucesso. Eles servem para estimular a cooperação entre nações, proporcionar acesso a decisões de grande impacto na diplomacia e — principalmente — atrair capital estrangeiro. Quanto maior a estabilidade, obviamente, mais segurança um país transmite aos seus parceiros. Nas últimas décadas, o Brasil obteve algumas importantes vitórias nesse caminho. Conseguiu estabilizar sua moeda, comprovou seguidamente a solidez de suas instituições e desenvolveu políticas respeitadas e aplaudidas no exterior, com destaque para os temas ligados à desigualdade social e ao meio ambiente. Com a eleição de um governo liberal em 2018, defensor de uma filosofia mais receptiva ao capital, parecia que o país finalmente deslancharia rumo ao Éden, depois de alguns anos de forte recessão econômica. Parecia.

Do ano passado para cá, infelizmente, a imagem do Brasil no exterior vem sofrendo uma série de arranhões — todos por uma postura belicosa ou equivocada do governo Bolsonaro. A primeira grande trombada internacional deu-se em relação à política ambiental, com o aumento das queimadas e o desmatamento na Amazônia. O descaso brasileiro levantou protestos em todas as partes do mundo, especialmente na Europa, o que provocou o cancelamento de fundos internacionais para o desenvolvimento da sustentabilidade na região e prejuízos ao agronegócio (que só não foram piores graças ao esforço da ministra da Agricultura, Tereza Cristina). Mais recentemente, e de forma absolutamente inexplicável, tivemos muitas rusgas com o governo chinês em razão das declarações de um dos filhos do presidente, Eduardo Bolsonaro, e de ministros da ala ideológica deste governo, todos esquecidos de que a China é hoje nosso maior parceiro comercial. Há poucos dias, mais um revés: em decorrência do descontrole no combate à pandemia, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, supostamente um grande aliado de Bolsonaro, fechou as fronteiras com o Brasil, proibindo as viagens de cidadãos não americanos àquele país.

Estamos com os olhos do mundo voltados para cá — e a visão não é boa. Neste momento, o Brasil é o país com o maior número de mortes diárias causadas pelo novo coronavírus. O combate à Covid-19, aliás, é um dos aspectos que reforçam a percepção de incompetência, de instabilidade e de desorganização, com o presidente num caminho negacionista e irresponsável, enquanto o país ruma firme para a casa dos 30 000 mortos. Como se o desafio humanitário e sanitário já não fosse gigantesco, vivemos uma balbúrdia política, com as entranhas do governo expostas por um vídeo de uma reunião ministerial. Nos trechos que vieram a público, ficam patentes o desrespeito que alguns integrantes desta administração nutrem pelas instituições, a total ausência de compostura com que se sentam à mesa para (supostamente) debater os destinos do país e os instintos mais primitivos do presidente, que enxerga um eterno “nós contra eles” e defende o armamento da população que o apoia. Bolsonaro, por sinal, tem sido o maior inimigo da estabilidade de que precisamos para recuperar nossa imagem internacional e os investimentos que tanto nos fazem falta. Embora exista liquidez financeira no mundo, e oportunidades claras de bons negócios por aqui, o capital tem medo de lugares que não inspiram confiança, cujos cenários podem se alterar da noite para o dia, com os poderes se estranhando. Atualmente, como mostra a reportagem que começa na página 28, o Brasil é visto exatamente desta forma: um país instável e imprevisível.

quinta-feira, 28 de maio de 2020

Sara Winter, a loura fake


A youtuber Sara Winter quer "trocar socos" com o ministro do Supremo e incentiva "o povo" a usar armas e mentiras para defender Bolsonaro contra os outros poderes
A youtuber Sara Winter quer "trocar socos" com o ministro do Supremo e incentiva "o povo" a usar armas e mentiras para defender Bolsonaro contra os outros poderes | Divulgação

Quem é Sara Winter, aquela que quer “trocar socos” com um ministro do Supremo e o xinga abertamente como “fdp arrombado”? Tudo é fake nessa mulher de 27 anos que já foi anarquista, comunista, nazista, olavista. Sempre oportunista. Abraçada por Jair Bolsonaro e pela ministra Damares como milagre ambulante, “ex-feminista” curada pela igreja evangélica. Uma legítima representante da nova mulher bolsonarista fanática. 

Agora, Sara é formalmente investigada na CPI das Fake News, em inquérito aberto por Alexandre de Moraes, do STF. Teve seu celular e computador apreendidos pela PF. Por que uma figura desmiolada, autointitulada líder de uma milícia que quer “exterminar a esquerda”, está aqui como personagem, alvo do Supremo junto com parlamentares do PSL? Porque Sara só pode existir e prosperar num Brasil em que o presidente e seus filhos defendem sites fake e estimulam mensagens de ódio contra a democracia. 

Sara Winter, pseudônimo de Sara Fernanda Giromini, filiada ao DEM, confronta o ministro: “Pois você me aguarde, senhor Alexandre de Moraes. O senhor nunca mais vai ter paz na vida. A gente vai infernizar a sua vida. A gente vai descobrir os lugares que o senhor frequenta. A gente vai descobrir quem são as empregadas domésticas que trabalham para o senhor. A gente vai descobrir tudo da sua vida até o senhor pedir pra sair. Hoje, o senhor tomou a pior decisão da sua vida”. 

A fala violenta de Sara não é liberdade de expressão. Faz parte da “bostalização” da política promovida pela família Bolsonaro, com a aquiescência dos ministros civis e militares. Sara convoca pessoas com armas e treinamento militar para defender Bolsonaro e atacar os poderes Judiciário e Legislativo. Diz ser inspirada pela guerra civil na Ucrânia. Mas na verdade ela imita o presidente, que em reunião ministerial defendeu armar o povo para se insurgir. 

Sara é apenas um pouco mais desbocada que o deputado federal e terceiro filho Eduardo Bolsonaro. Eduardo é o padrinho importante do Queiroz, acusado de arrecadar grana na ilegal e corrupta “rachadinha”. É o ex-fritador de hambúrguer nos EUA que seria, por vontade esdrúxula do ‘paipai’, nosso embaixador em Washington. Eduardo propaga os tuítes do blogueiro Allan dos Santos, outro indiciado por disseminar fake news. Em live com Eduardo, Allan chamou Alexandre de Moraes de “moleque, careca, idiota, burro imbecil”. 

Eduardo Bolsonaro é aquele que, antes mesmo da eleição, disse que bastava um cabo e um soldado para fechar o STF, “nem jipe precisava”. Eduardo diz agora nas redes que é inevitável a ruptura democrática, a cisão, o conflito, o caos. “Falando bem abertamente, não é mais uma questão de ‘se’ mas sim de ‘quando’ isso vai ocorrer”. O pai pensa igual.

Em meio à tragédia da Covid-19, ignorada pela presidência da República, que sequer nomeia um ministro da Saúde, os Bolsonaro interferem na Polícia Federal, criam um sistema paralelo de informações em benefício próprio, defendem intervenção militar e manipulam informações. Num país como esse, é natural que surja uma Sara Winter como líder da milícia acampada na Praça dos Três Poderes, chamada “os 300 do Brasil”. Para “tomar o poder para o povo”. 

Sara transformou em flor uma tatuagem de inspiração nazista. Foi expulsa do movimento Femen, criado na Ucrânia por ativistas topless, acusada de ter embolsado dinheiro indevidamente. Foi defenestrada até pela amiga Damares, por se indispor com a deputada Carla Zambelli em quiproquó com Olavo de Carvalho. 

Só em ambiente de desonra pública do presidente e seus ministros, vicejam nas redes personagens como Sara Winter. Elas acham graça nos palavrões, nas calúnias, na falta de empatia e solidariedade com as famílias dos mais de 25 mil mortos até agora. Ou com os desempregados, os indígenas, os pobres, os servidores. Se os ministros do Executivo menosprezam a democracia e insultam juízes da mais alta corte, por que não ela?

Bolsonaro criou o gabinete dos aloprados. Não é só o ‘gabinete do ódio’, insuflado pelo filho Carluxo. Existem malvados inteligentes e eles não estão no governo. Sara Winter é a versão feminina dos filhos de Bolsonaro.

General Santos Cruz - O Militar e a Política


Santos Cruz
O general Carlos Alberto dos Santos Cruz durante cerimônia de diplomação de Jair Bolsonaro no Tribunal
Superior Eleitoral (TSE). Foto: REUTERS/Adriano Machado (10/12/18)

Todos os militares são eleitores, do soldado/marinheiro ao general-de-exército/brigadeiro/almirante. E todos votam com total liberdade de escolha nos seus candidatos e partidos de preferência. É o exercício da cidadania, na mais absoluta liberdade. É um dos pontos altos da democracia. É quando cada cidadão, em seu voto e por seu voto, vale o mesmo, independente de qualquer consideração de classe social, credo, etnia, etc. Mas a democracia é mais que isso. É também o funcionamento harmônico das instituições. É também a liberdade de imprensa e de associação. É também um processo coletivo de construção, a partir da diversidade da nossa sociedade, de um País mais justo, próspero e tolerante.

Na cultura militar, não existe propaganda nem discussão política sobre preferência de candidatos e partidos dentro dos quartéis. Quando o cidadão coloca a farda e representa a instituição, ele tem compromisso institucional e constitucional. Seu compromisso é com a Nação.

As Forças Armadas são instituições permanentes do Estado brasileiro e não participam nem se confundem com governos, que são passageiros, com projetos de poder, com disputas partidárias, com discussões e disputas entre Poderes ou autoridades, que naturalmente buscam definir seus espaços e limites. No jogo político, muitas vezes os atores são levados por interesses de curto prazo, influenciados por emoções, limitados por suas convicções. Isso é normal no ambiente democrático.

O militar da reserva, seja qual for a função que ocupa, não representa a instituição militar. O desempenho de qualquer função, quando o militar está na reserva, é de responsabilidade pessoal. As instituições militares são representadas pelos seus comandantes, que são pessoas de longa vida militar e passaram por inúmeras avaliações durante a vida profissional, seguramente escolhidos entre os melhores do seu universo de escolha. O processo seletivo acontece em todos os níveis, desde a escolha de soldados para o Curso de Formação de Cabo até a promoção para general-de-exército. A estrutura hierárquica e a conduta disciplinar são baseadas no exemplo, no respeito, na liberdade de expressão e na união de todos. A união é que realmente faz a força. Mesmo com orçamento reduzido, basta entrar em qualquer instalação para ver a educação, a dedicação e o zelo com que o patrimônio público é mantido e administrado.

As Forças Armadas estão presentes na história do Brasil, na defesa da pátria, na pacificação do país, na educação, na ciência, na construção, no desenvolvimento, etc, e até mesmo na política, em tempos passados, com todos os riscos, responsabilidades e desgastes inerentes a isso. Não por acaso, foi justamente no regime militar que as FA decidiram, acertadamente, sair da política e ater-se ao profissionalismo de suas funções constitucionais. As FA também são responsáveis por terem contribuído para o Brasil, com todos os problemas que temos, ser um dos dez maiores países do mundo. O país evoluiu e as Forças Armadas continuam presentes na defesa da pátria, nas diversas situações em que são chamadas para auxiliar a população em emergências e em apoio a algumas políticas de governo. Suas tarefas estão estabelecidas na Constituição – defender a pátria e garantir os poderes constitucionais, a lei e a ordem. O prestígio e a admiração que a sociedade lhes dedica foram construídos com sacrifício, trabalho e profissionalismo.

Nesse período, a democracia brasileira evoluiu e se consolidou. Temos um governo e um Congresso legitimamente eleitos, e as instituições funcionando. Os Poderes não são perfeitos, como é normal. Nunca serão, já que são feitos de homens, não de anjos. Democracia se faz com instituições fortes, buscando permanentemente o seu aperfeiçoamento. No Brasil, existe legislação que permite o aperfeiçoamento das instituições e práticas políticas. As discordâncias e conflitos não estão impedindo o funcionamento das instituições. A busca da harmonia é obrigatória aos três Poderes. É uma obrigação constitucional. As diferenças, o jogo de pressões e as tensões são normais na democracia e as disputas precisam ocorrer em regime de liberdade, de respeito e dentro da lei. Por isso mesmo, a Constituição Federal se sobrepõe aos três Poderes da República para limitar seu emprego, para disciplinar seu exercício. É nesse processo que os três Poderes moderam sua atuação, encontram seus limites e definem as condições de emprego dos demais instrumentos do Estado, inclusive as Forças Armadas, na implementação de políticas públicas.

As Forças Armadas, por serem instituições de Estado, não devem fazer parte da dinâmica de assuntos de rotina política. A dinâmica de governo não é compatível com as características da vida militar. Os militares são unidos, os comandantes são preparados, esclarecidos e mantêm o foco na sua missão constitucional. 

As FA são instituições que não participam de disputas partidárias, de assuntos de rotina de governo, de assuntos do “varejo”.

Nas últimas décadas, as FA cruzaram momentos de hiperinflação, impeachment de presidentes, escândalos de corrupção, revezamento de governos com características diversas, sempre com posicionamento profissional, auxiliando a população, atentas à sua destinação constitucional, contribuindo para o prestígio internacional do País. É um histórico de orgulho do povo brasileiro e das próprias instituições. Por isso mesmo, creio que não se deixarão tragar e atrair por disputas políticas nem por objetivos pessoais, de grupos ou partidários.

Acenos políticos não arranham esse bloco monolítico que é formado por pessoas esclarecidas e idealistas, comprometidas com o Estado e com a Nação, que integram uma das instituições mais admiradas pelo povo brasileiro.


Eduardo: só falta a data do golpe. Olavo: morte a Moraes. Aras aprecia cena


Eduardo Bolsonaro durante live: o golpe já é certo, ele diz. Só é preciso saber quando - Reprodução
Eduardo Bolsonaro durante live: o golpe já é certo, ele diz. Só é preciso saber quando

Os deputados Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e Bia Bia Kicis (PSL-DF) fizeram na noite desta quarta a transmissão do "Terça Livre", um programa na Internet comandado pelo militante bolsonarista Allan dos Santos, investigado no inquérito sobre fake news.

Olavo de Carvalho participava lá da Virgínia, nos EUA. O deputado deu como certo um golpe de estado no Brasil -- só a data não estaria definida -- e disse que altas autoridades estão discutindo o assunto. Sim, é isto mesmo. Afirmou:
"Eu até entendo quem tenha uma postura mais moderada, vamos dizer, para não tentar chegar em um momento de ruptura, um momento de cisão ainda maior, um conflito ainda maior. Eu entendo essas pessoas que querem evitar esse momento de caos, mas, falando bem abertamente, opinião do Eduardo Bolsonaro: não é mais uma questão de se, mas de quando isso vai ocorrer".

O deputado deu a entender que as articulações para o golpe estão em curso:
"Não se engane, as pessoas discutem isso. Essas reuniões que o Allan está falando, entre altas autoridades, até a própria reunião dentro de setores políticos, eu, Bia, etc. A gente discute esse tipo de coisa, porque a gente estuda história, a gente sabe que a história vai apenas se repetindo. Não foi de uma hora para outra que chegou a ditadura na Venezuela".

Então saibam todos vocês: em algum momento, seremos governados, segundo Eduardo, pela ditadura da Família Bolsonaro, escorada, suponho, nas Forças Armadas...

Olavo, a propósito, disse ontem que Alexandre de Moraes tem de ir para a cadeia, ser proibido de falar e condenado à morte. Por quê? Porque ele seria um... "genocida"!!!


O médico bolsonarista Ítalo Marsili também participou. É aquele rapaz que diz ter reprogramado a mente de um pedófilo escolhendo para ele prostitutas com cara de criança; que sustenta que a gerência do Estado piorou depois do voto feminino porque mulher se deixa seduzir com facilidade e que acha inconveniente ter um papa "negão".

Todos "estudam história". É a elite intelectual do golpe, suponho.

Eduardo é ambicioso. Disse que não basta suspender o inquérito sobre ações criminosas no STF. Ele exige punição para o ministro Alexandre de Moraes. Também atacou Celso de Mello, que teria ameaçado levar generais para depor "debaixo de vara". Ele, obviamente, não conhece o sentido que tem a palavra em direito. Ou finge não conhecer, sei lá eu.

Notem que Eduardo é ate condescendente com quem não quer a ruptura, mas ele acha um erro. Está incitando os miliares.

Bem, meus caros, o rapaz é filho de quem é: o pai confessou na reunião ministerial do dia 22 de abril que está armando a população tendo como horizonte a guerra civil.

E, claro!, Augusto Aras, procurador-geral da República, não vai mover uma palha. Ou vai: ele quer extinguir o inquérito no STF. Há quem entenda que o Artigo 53, que garante a imunidade a parlamentares por "opiniões, palavras e votos" lhes dá o direito de praticar crimes.

É um jeito de ver o mundo. É a conhecida tolerância com os intolerantes, que, se vencerem, porão fim à tolerância.

Eduardo quer ação:
"A gente não pode permitir que isso aconteça. A gente tem que diagnosticar o problema, deixar a sociedade ciente do problemas e depois tomar algumas atitudes, porque é inadmissível isso que o ministro Alexandre de Moraes e Celso de Mello tão fazendo com a democracia brasileira"

Não deixou claro que atitude pretende tomar. Já há um acampamento, em Brasília, com pessoas armadas, segundo a sua coordenadora, Sara Winter.

Dado o número de baixas no bolsonarismo com menos de um ano e meio de governo, recomendo que Aras e André Mendonça — os novos arautos da liberdade de expressão — e a fatia do Centrão que resolveu lucrar com o governo não se sintam antecipadamente como os barões do novo regime.

Todos eles são candidatos à guilhotina. O bolsonarismo já é tarado por cabeças antes da revolução... Imaginem depois dela.

É evidente que Eduardo e Bia Kicis deveriam ser processados pelo Conselho de Ética da Câmara e cassados por seus pares. Mas não serão.

Quando foi que se viu algo parecido no Brasil?

Eduardo tem razão numa coisa: não se fez uma Venezuela da noite para o dia. Houve tolerância em excesso com o candidato a ditador, que também governou ancorando-se nas Forças Armadas.

Parte considerável da elite vê agora onde amarrou seu jumento.

Eis aí: segundo Eduardo, o golpe é fatal, e "as pessoas discutem isso".

Quais pessoas?

Por Reinaldo Azevedo

Ministro do TCU concede liminar contra ingerência do Príncipe Carluxo no BB


Bruno Dantas, do TCU; Lucas Rocha Furtado, do MPTCU, e Rubem Novas, presidente do Banco do Brasil. É preciso pôr ordem na zorra bolsonariana - Fotos: Dida Sampaio/Estadão; J. Freitas/Agência Senado e Adriano Machado/Reuters
Bruno Dantas, do TCU; Lucas Rocha Furtado, do MPTCU, e Rubem Novas,
presidente do Banco do Brasil. É preciso pôr ordem na zorra bolsonariana

Pois é... Em breve também o TCU passará a ser alvo dos "libertários da expressão" de Jair Bolsonaro, Augusto Aras e André Mendonça... Por que escrevo isso?

A monarquia absolutista bolsonarista se concede todos os direitos ao arrepio da lei. Quando a legalidade decide lhe impor limites, então sai gritando por aí: "Oh, não nos deixam governar".

Ao caso: o movimento Sleeping Giants Brasil — que, em boa hora, chega ao país — alertou para o fato de que publicidade do Banco do Brasil estava sendo veiculada em site dedicado a fake News.

O movimento identifica e avisa empresas que tenham seus anúncios publicados em veículos divulgadores de fake news e com conteúdo racista. O objetivo é evitar a monetização de canais da Internet comprometidos com essas práticas criminosas.

O site em questão é o bolsonarista Jornal da Cidade Online, famoso por seu apego a notícias falsas. A área técnica do Bando do Brasil, então, suspendeu a veiculação. Carlos Bolsonaro, um dos príncipes da Família Real Bolsonarista, reagiu. Fabio Wajngarten, secretário de Comunicação, reclamou no Twitter e cobrou o recuo do banco. Que, ora vejam!, recuou.

É do balacobaco!

O sempre diligente Subprocurador Geral Lucas Rocha Furtado, que representa o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MPTCU), recorreu ao TCU para suspender a veiculação de propaganda em páginas criminosas, acusando "interferência indevida da família do Exmo. Sr. Presidente da República na gestão de publicidade do Banco do Brasil, com intermediação indevida da Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República (Secom)."

DECISÃO
Em decisão impecável (íntegra AQUI), o ministro Bruno Dantas concedeu liminar suspendendo a veiculação de propaganda do Banco do Brasil, ressalvando:
"Ficam excluídas dos determinação do item anterior os portais, sites, blogs e redes sociais vinculados a empresas concessionárias de serviços de radiodifusão, que por serem delegatárias de serviço público, já foram escrutinadas quanto aos critérios de interesse público da informação que veiculam. Excluo, ademais, aqueles vinculados a jornais e revistas que existam há mais de dez anos."

Dantas também se mostra disposto a pôr fim à farra com dinheiro público. Na sua liminar, decidiu ainda:
"determinar à Controladoria-Geral da União que constitua Grupo Interinstitucional de Trabalho com apoio de outros órgãos, em especial da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, da Secretaria de Comunicação Social do Supremo Tribunal Federal, do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional, bem como de entidades da sociedade civil, tais como a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), a Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), a Associação Brasileira de Jornalistas Investigativos (ABRAJI), a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (ABERT), Associação Nacional das Editoras de Revistas (ANER), a Associação Nacional dos Jornais (ANJ) e o Instituto Palavra Aberta, para que, no prazo de 90 (noventa) dias, elabore normativo e manual de boas práticas, os quais devem vincular todos os órgãos do Governo Federal, até mesmo as empresas estatais, sobre certificação de sites, blogs, portais e redes sociais que poderão receber recursos públicos (monetização) via anúncios publicitários e congêneres".

NOTA
Depois da decisão do TCU, o Banco do Brasil afirmou em nota que "não incentiva a disseminação de fake news, ao mesmo tempo em que não condiciona a exibição de suas propagandas comerciais à concordância editorial com os conteúdos divulgados por qualquer veículo de comunicação. Ainda assim decidiu-se iniciar um estudo interno para aprimorar critérios para exibição da marca em veículos digitais."

Não precisa mesmo concordar com linha editorial. Não pode é permitir que o nome de uma instituição pública financie páginas criminosas.

Dantas atendeu ainda a outro pedido do MPTCU e enviou cópia dos autos ao Supremo para subsidiar o inquérito sobre a indústria criminosa de fake News.

PARA LEMBRAR
Na reunião ministerial tarja-preta do dia 22 de abril, Rubem Novaes, presidente do Banco do Brasil, chamou o TCU de "usina de terror". Sempre com boas avaliações... Sua fala foi a última naquele encontro.

O sábio doutor, que ouviu Paulo Guedes chamar a instituição que preside de "a porra do Banco do Brasil" e até achou graça, resolveu opinar sobre Covid-19. Disse que as mortes, que haviam chegado a 200 por dia, estavam em declínio... Ele previa que a pandemia estava acabando.

Com mais de mil mortes diárias, o Brasil já é o país com o maior registro diário de mortes no mundo e o segundo em número de casos. E, não tarde, será também o segundo óbitos.

Antenadíssimo esse Novaes! É o novo Brasil.

O bolsonarista Aras se insurge contra inquérito legal que apoiou há 7 meses


Augusto Aras: procurador-geral da República transforma a PGR em mero palco dos interesses do presidente da República. Vergonha histórica    -  Foto: Adriano Machado/Reuters

Augusto Aras está há tão pouco tempo no cargo e já está fazendo história! Escrevi nesta manhã que a Procuradoria Geral da República se tornou o palco principal das manobras de Jair Bolsonaro contra os governadores. Pretende-se cobrir com a fumaça da caça aos corruptos a política de saúde homicida adotada pelo presidente da República. A do governo federal, que ele chefia, é ligeiramente distinta. Mas é de uma incompetência assombrosa. Agora, Aras se insurge contra o inquérito aberto para investigar agressões a ministros do Supremo.

Em outubro do ano passado, o doutor defendeu o procedimento. Chamou-o de legítimo. Afirmou: "Ainda que amparado na independência do Poder Judiciário e justificado como temperamento pontual ao princípio acusatório, a instauração atípica de inquérito judicial pelo Supremo Tribunal Federal não pode ser compreendida com auspícios inquisitoriais". 

Em linguagem empregada por mortais — e, quero crer, também imortais —, isso quer dizer "sim".

O mais curioso é que o doutor aproveitou uma ação da Rede Sustentabilidade para, agora, combater o inquérito. Onde já se viu, não é? Afinal, desta feita, a coisa chegou perto daquele que se mostra, a cada dia mais, não um amigo apenas, mas um guia espiritual: Jair Bolsonaro. O inquérito se aproxima do chamado "Gabinete do Ódio", chefiado por Carlos Bolsonaro. E a Rede, do senador Randolfe Rodrigues, presta mais um de seus inestimáveis e constantes serviços à extrema direita. Uma vez, vá lá. Duas, huuummm..., pode ser coincidência. Três? Se não for má fé, é burrice.

A necessidade do inquérito está aí. Sim, ele tem amparo no Artigo 43 do Regimento Interno do Supremo, que tem força de lei, a saber:
"Art. 43. Ocorrendo infração à lei penal na sede ou dependência do Tribunal, o Presidente instaurará inquérito, se envolver autoridade ou pessoa sujeita à sua jurisdição, ou delegará esta atribuição a outro Ministro."

Alguém objetará: "Ah, mas ali fala em 'sede ou dependência do tribunal'". Verdade. É preciso definir o que isso significa em tempos de redes sociais. A ameaça que chega a um ministro por via eletrônica se manifestou na sede do tribunal.
"Ah, mas seria tarefa do Ministério Público cobrar essas investigações, que seriam feitas pela Polícia Federal". Também acho! Mas cadê o Ministério Público? Onde esteve durante todo esse tempo? Como explicar tamanha omissão diante do avanço da extrema-direita fascistoide, que não se limita mais a criticar decisões de ministros? Há ameaças terroristas explícitas.

No dia em que a líder de um tal acampamento, onde há membros admitidamente armados, anuncia que seus seguidores vão perseguir um ministro em sua casa, assediando até empregados da Casa, Aras pede, então, suspensão do inquérito, expressando agora postura diferente de há sete meses?

O que mudou?

O relator do pedido é o ministro Edson Fachin. Espero que faça a coisa certa. Pode ser que a coisa acabe no pleno. Se for o caso, os 11 ministros vão decidir se é preciso um togado estendido no chão para que, então, se deem conta do risco.

Fato: há pessoas dispostas a fazer loucura, e há os financiadores da insanidade.
A PGR virou um puxadinho da Presidência da República.

Vergonha histórica.

Por Reinaldo Azevedo

Confissão de culpa



Fake News nada tem a ver com liberdade de expressão. Uma coisa é você fazer uma crítica impiedosa e até injusta contra quem quer que seja, pessoa ou instituição. Outra bem diferente é você, sabendo muito bem o que faz, criar uma notícia falsa e passá-la adiante. Ou recebê-la, sabendo que é falsa, e passá-la adiante.

O inquérito aberto no Supremo Tribunal Federal não está interessado em descobrir quem cria notícia falsa e a repassa. Está interessado na máquina de fabricação e de distribuição em larga escala de notícias falsas, impulsionadas por robôs, e destinadas a destruir a reputação de ministros da Corte. É o que está em questão.

O Supremo quer saber também quem financia manifestações de rua consideradas antidemocráticas, e sua relação com os que de modo organizado disseminam notícias falsas nas redes sociais. Os bolsonaristas sempre negaram que façam isso. Mas sua reação à operação da Polícia Federal é uma deslavada admissão de culpa.