Em poucos minutos, Paulo Guedes disse uma coisa e o seu contrário. "Eu só saio abatido à bala, removido à força. Eu tenho missão a cumprir", disse o ministro da Economia num evento do mercado. "Agora, se o presidente desistir da agenda, se o Congresso interditar a agenda, falar que não quer fazer a agenda, eu não tenho o que fazer, tenho que ir para casa", ele desdisse.
No antagonismo das duas falas, Guedes expôs uma perigosa opção pela teatralidade. Oscila entre dois personagens. Ambos incompatíveis com a gravidade do momento. Num instante, o ministro é protagonista de um enredo épico, o herói disposto a dar a vida pelas reformas. Noutro, é vítima de um fiasco anunciado.
Só Guedes sabe o tamanho do seu desconforto. Mas o pior que pode acontecer um instante em que se discute a reforma tributária, é um negociador que não enxerga as próprias culpas no espelho.
Foi o ministro da Economia quem se acorrentou a ideias-fixas sem apoio (a nova CPMF), promessas irrealizáveis (quatro grandes privatizações em 90 dias) e quiromancias econômicas (a retomada do crescimento em "V").
Guedes sabe que Bolsonaro não tolera o imposto sobre transações digitais, neologismo para a velha CPMF. O ministro também não ignora que seu chefe está mais próximo do populismo eleitoral do que das reformas liberais.
Na campanha eleitoral, Guedes parecia acreditar na fantasia do Posto Ipiranga. No governo, entre uma dúvida e outra, levou o capitão a sério sempre que ele repetiu o lero-lero de que a economia é "100% com o Paulo Guedes." Tomado pelo teatro ambíguo, o ministro parece conscientizar-se de sua própria fragilidade.
Ou Guedes atrai Bolsonaro para sua agenda e vai à luta no Congresso ou oferece gasolina com os aditivos desejados pelo chefe. Há sempre a hipótese limpar as gavetas. Mas o melhor é que isso seja feito em silêncio. Do contrário, fica parecendo chantagem.
Por Josias de Souza
Nenhum comentário:
Postar um comentário