O "Despacho do Presidente da República" nº 423 veio seco, árido, sem nem suspeita de afago: solicitava ao Congresso Nacional "providências para a dispensa da senhora deputada Beatriz Kicis Torrentis de Sordi da função de vice-líder no Congresso Nacional".
Trata-se da notória Bia Kicis. Não há indigência intelectual e política que este governo tenha praticado até hoje que esta senhora não tenha apoiado com folga e com sobra. Por ela, Bolsonaro seria ainda mais reacionário, mais truculento, mais agressivo.
Ganhou relevo quando Joice Hassellmann (PSL-SP) caiu em desgraça junto ao bolsonarismo — a propósito: estaria em curso um movimento de reaproximação, sei lá... Kicis apoiou os atos dos golpistas em Brasília, endossou a tresloucada cruzada do presidente contra o distanciamento social, costuma inflamar as redes contra o Supremo...
Em suma: parece ter se descoberto mais bolsonarista do que Bolsonaro.
Mas deveria ler Augusto dos Anjos e ter aprendido alguma coisa com a trajetória de Joice, sua colega de bancada: "O beijo, amigo, é a véspera do escarro".
O governo, como escrevi aqui ontem, tentou resistir ao Fundeb. Arthur Lira (AL), líder do PP, lutou para obstruir o quanto pôde a votação a serviço do Planalto. Bolsonaro está em plena fase de aquisição de parlamentares do centrão. Ocorre que o grupo só é o que é porque nunca foi burro. Governista, sim, sempre que possível. Contra a educação, com o risco de gerar uma paralisia num setor que já vive uma realidade dramática, aí não.
Paulo Guedes também tentou emplacar alguns reacionarismos. Não deu certo. Quando viu que iria perder, o governo, então, resolveu negociar e apoiar o texto. Reacionários e oportunistas, sim, mas espertalhões o bastante, Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e Carla Zambrelli (PSL), por exemplo, votaram a favor da PEC.
Mas um grupo de sete bolsonaristas mais ogros do que o ogro-rei decidiu dizer "não": além de Bia, contam-se Márcio Labre (PSL-RJ), Luiz Phillipe de Orleans e Bragança (PSL-SP), Júnio Amaral (PSL-MG), Filipe Barros (PSL-PR), Chris Tonietto (PSL-RJ) e Paulo Martins (PSC-PR).
Falando cada vez a menos gente no gargarejo às portas do Alvorada, o presidente afirmou:
"Seis ou sete votaram contra. Se votaram contra, eles devem ter os seus motivos. Só perguntar para eles por que votaram contra. Agora, alguns dizem que a minha bancada votou contra. A minha bancada não tem seis ou sete, não. A minha bancada é bem maior do que essa aí".
Vale dizer: a turma decidiu não ceder e não acompanhou o governo na mudança de posição.
Grandes Varões e varoa de Plutarco! Se é para dar mais dinheiro para a Educação, eles dizem " não" ainda que Bolsonaro mande dizer "sim". Quando era para dar apoio a atos golpistas, aí o presidente nem precisava pedir.
E veio a destituição de Kicis.
O beijo, senhora, é a véspera do escarro.
Por Reinaldo Azevedo
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