quarta-feira, 2 de fevereiro de 2022

Barroso diz que dados do TSE vazados por Bolsonaro 'auxiliam milícias digitais e hackers'


O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso Foto: EVARISTO SA / AFP / 22/11/2021

Na primeira sessão do ano, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso, criticou o presidente Jair Bolsonaro, em razão do vazamento de dados de uma investigação sigilosa que apura um ataque hacker à Corte. Segundo Barroso, a atitude de Bolsonaro expôs dados que ajudam "milícias digitais e hackers" que queiram invadir o sistema do TSE.

— Ninguém fornece informações que possam facilitar ataques invasões, e outros comportamentos delituosos. Tudo aqui é transparente, mas sem ingenuidades. Sempre lembrando que informações sigilosas que foram fornecidas à Polícia Federal para auxiliar uma investigação foram vazadas pelo próprio presidente da República em redes sociais, divulgando dados que auxiliam milícias digitais e hackers de todo o mundo que queiram invadir nossos equipamentos — disse Barroso.

Em seguida, acrescentou:

— O presidente da República vazou a estrutura interna da TI [tecnologia da informação] do Tribunal Superior Eleitoral. Tivemos que tomar uma série de providências de reforço da segurança cibernética dos nossos sistemas para nos proteger. Faltam adjetivos para qualificar a atitude deliberada de facilitar a exposição do processo eleitoral brasileiro para ataques criminosos.

A divulgação das informações levou o TSE a pedir uma investigação de Bolsonaro, que atualmente está em curso no Supremo Tribunal Federal (STF). Na semana passada, o presidente da República faltou ao depoimento marcado para que pudesse falar sobre o assunto. A Advocacia-Geral da União (AGU), que defende Bolsonaro, diz que a investigação do ataque hacker não estava em segredo. Já a delegada da Polícia Federal responsável pelo inquérito para apurar a conduta do presidente diz que o caso era sigiloso sim.

Bolsonaro tornou as informações públicas com o objetivo de atacar a credibilidade das urnas eletrônicas, embora não houvesse relação do ataque com o funcionamento das urnas. Em relatório de novembro, mas tornado público semana passada, a delegada Denisse Dias Ribeiro, da PF, afirmou que Bolsonaro teve "atuação direta, voluntária e consciente" na prática do crime de violação de sigilo funcional.

Nesta terça-feira, Barroso afirmou que o voto impresso, que já foi defendido por Bolsonaro é um retrocesso que permite fraudes.

— Inovações como a urna eletrônica e a biometria asseguram a confiança, a rapidez e a eficiência na coleta e apuração de votos — afirmou o presidente do TSE.

O ministro atuou como observador na eleição recém-ocorrida em Portugal. Ele elogiou a organização e aproveitou para dar uma indireta a Bolsonaro, que já deu sinais de que pode não aceitar uma derrota na eleição presidencial de 2022.

— Um show de organização e democracia. Debate público de qualidade que não foi dominado pelo ódio e pela desinformação disseminados pelas mídias sociais. Ao contrário do que ocorre em outros países, as mídias sociais em Portugal têm muito menos peso. Apesar da surpresa, todos aceitaram o resultado surpreendente, com civilidade e respeito aos vencedores, sem acusações infundadas de fraudes, sem grosserias.

Barroso também defendeu a necessidade de ampliar a participação da mulher na política. E lamentou o aumento de casos e mortes na pandemia de Covid-19. Em outra indireta a Bolsonaro, Barroso elogiou a vacinação contra a doença "mesmo contra as forças contrárias e as narrativas sem amparo científico". A sessão foi por videoconferência em razão da pandemia.

Sem citar nomes, ele criticou o aplicativo de mensagens Telegram. O TSE estuda entrar em ação para proibir seu funcionamento no Brasil, como parte das ações de combate às notícias falsas durante as eleições. Desde 2018, a Corte tenta notificar os responsáveis pela empresa, sem sucesso. Internamente, magistrados da Justiça Eleitoral consideram que o Congresso deveria agir para aperfeiçoar a legislação sobre o tema.

— Plataformas que queiram operar no Brasil têm que estar sujeitas à legislação brasileira e às autoridades judiciais do país. Nenhuma mídia social pode se transformar num espaço mafioso, onde circulem pedofilia, venda de armas, de drogas, de notas falsa, ou de campanhas de ataques à democracia, como foi divulgado pela imprensa nacional, que por semanas observou durante semanas o que circulou em redes que pretendem atuar no Brasil — disse Barroso.

Ele afirmou ainda que houve dificuldades para a fabricação de urnas eletrônicas para substituir os equipamentos mais velhos, em razão da escassez de matéria-prima, mas a questão foi resolvida após negociação com as empresas automobilísticas, que também usam esse material nos carros.

— Foram meses de tensão e negociação com a empresa automobilísticas. Felizmente conseguimos todas as peças de que precisávamos — afirmou Barroso.

Em O Globo

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