No dia em que assumiu o Ministério das Relações Exteriores, Ernesto Araújo citou a Bíblia em grego, rezou a Ave Maria em tupi e viajou na maionese em português. Num discurso delirante, o chanceler misturou Tarcísio Meira, Renato Russo, Dom Sebastião e Raul Seixas. A performance espantou a plateia e inaugurou uma era de vexames no Itamaraty.
Discípulo de Olavo de Carvalho, Araújo aplicou a cartilha da extrema direita na diplomacia. Prometeu uma “política externa do povo”, mas subordinou o interesse nacional às crenças de uma seita radical.
O chanceler hostilizou nações amigas, endossou teorias conspiratórias e isolou o Brasil em fóruns internacionais. Na ONU, o país passou a boicotar resoluções que defendiam os direitos humanos. Alinhou-se a teocracias que oprimem mulheres e perseguem minorias.
O fanatismo também pautou a relação do ministro com o chefe. Num discurso banhado em lágrimas, Araújo chegou a comparar Jair Bolsonaro a Jesus Cristo. Aos soluços, descreveu o capitão como a “pedra angular” de um “novo Brasil”.
A vassalagem não o salvou de humilhações públicas. Numa visita à Casa Branca, o chanceler foi barrado no encontro com Donald Trump. Enquanto ele esperava no corredor, o deputado Eduardo Bolsonaro acompanhava o pai no Salão Oval.
A submissão a Trump foi um capítulo à parte na gestão Araújo. Para bajular o republicano, o ministro traiu países vizinhos, aceitou taxas abusivas e abriu mão de espaço em organizações multilaterais. Quando Joe Biden venceu, ele endossou a falsa tese de fraude eleitoral. A birra aumentou a má vontade da nova administração americana com o Brasil.
Durante dois anos, o Congresso e a elite empresarial fecharam os olhos enquanto Araújo babava na gravata. Num governo cheio de lunáticos, os desatinos do chanceler foram tratados como um exotismo a mais. A omissão durou até o agravamento da pandemia.
Com mais de 300 mil mortos pela Covid, o Brasil sofre para conseguir vacinas e medicamentos. Parte do drama se deve à antidiplomacia de Araújo, que inviabilizou acordos com a China e a Índia. Agora Senado e Câmara exigem a demissão do ministro. Mas não basta afastá-lo do cargo. Ele precisa ser responsabilizado como um dos cúmplices da tragédia.
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