sexta-feira, 14 de agosto de 2020

Veja por que cresceu a popularidade de Bolsonaro, como aponta o Datafolha


Datafolha/Folha

Pode até ser revoltante, dadas a ruindade do governo e, em muitos aspectos, a sua malignidade, mas é verdadeiro: pouco dias depois de o Brasil ultrapassar o umbral dos 100 mil mortos de Covid-19, a popularidade do presidente Jair Bolsonaro nunca foi tão grande. Isso é um sinal de que seus críticos estavam todos errados, e seus puxa-sacos, certos? Não! É precisamente o contrário. Certos estavam os críticos; errados, os puxa-sacos.

Se Bolsonaro continuar a ouvir quem não gosta dele e a ignorar seus adoradores, pode crescer ainda mais. Talvez os sensatos devêssemos fazer o contrário e incentivar o presidente a voltar a ouvir Olavo de Carvalho e aquela caterva que vai babar seu fel às portas do Palácio da Alvorada.

Vamos ver: segundo pesquisa Datafolha realizada em 11 e 12 de agosto, com 2.065 brasileiros adultos que possuem telefone celular em todas as regiões e estados do país, são 37% os que acham o governo ótimo e bom. É a maior marca atingida desde o início do mandato. Em junho, eram 32%. No mesmo período, caíram de 44% para 34% os que o consideram ruim ou péssimo. A aprovação subiu 5 pontos, e a reprovação caiu 10: uma mudança de 15 pontos favorável ao governo.

Pode ser melancólico, mas não é surpreendente. As razões são até bastante evidentes:
1: a auxílio emergencial tem um peso enorme nessa mudança de ânimo, embora não explique sozinho os números;
2: em muitos aspectos, Bolsonaro mudou radicalmente a postura;
3: a duração da pandemia acabou jogando a seu favor

O AUXÍLIO EMERGENCIAL
Há dados do levantamento que são bastante eloquentes, como observam Mauro Paulino e Alessandro Janoni, respectivamente diretor-geral e diretor de pesquisas do Datafolha, em texto na Folha.

Embora tenha havido uma melhora no desempenho do presidente em quase todos os estratos, três dos cinco pontos de elevação do índice de ótimo e bom "vêm dos trabalhadores informais ou desempregados que têm renda familiar de até três salários mínimos, grupo alvo do auxílio emergencial pago pelo governo". A coisa não vai durar para sempre. A última parcela é paga em setembro e se discute a possibilidade de três outras, mas de R$ 200.

Atentem para este outro dado do texto de Paulino e Janoni:
"A solicitação do auxílio chega a 40% na população como um todo, taxa que alcança 75% entre desempregados que procuram emprego, 71% entre assalariados sem registro e 61% entre autônomos e profissionais liberais, grupos em que são identificadas as maiores variações pró-governo. Entre os que hoje estão sem ocupação, por exemplo, a reprovação caiu 9 pontos, e o apoio subiu 12."

Convenham: não é de hoje que se sabe que coisas como Bolsa Família — ou, como está em curso, o auxílio emergencial — podem alavancar a popularidade de um governante.

Entre os beneficiários da ajuda oficial, a aprovação do presidente é de 42%, seis pontos acima daqueles que não receberam e cinco a mais do que a média nacional.

BOLSONARO PAZ E AMOR
Embora lidere um governo que não poderia ser mais inepto, há dois Bolsonaros desde a sua chegada ao poder. O candidato ao impeachment governou de 1º de janeiro de 2019 até 18 de junho deste ano, data da prisão de Fabrício Queiroz.

Esse Bolsonaro não queria papo com o Congresso, comportava-se como arruaceiro, estimulava com a própria presença manifestações golpistas, articulava ele mesmo um espaço para o autogolpe — e, segundo a revista Piauí, chegou a tomar a decisão, mas foi dissuadido pelo general Augusto Heleno.

Eis que Fabrício é preso, e o presidente silencia a sua cantilena. Apontei isso no programa "O é da Coisa" no dia seguinte à prisão (aqui). Ficou claro a Bolsonaro que as Forças Armadas não endossariam uma aventura intervencionista para salvar um presidente amigo do amigão das milícias. Os militares nunca se rebaixaram tanto nestes dias, é fato, mas não a tal ponto.

O Bolsonaro amado pela extrema direta — agressivo, falastrão, ameaçador — desapareceu. Em vez de endossar o pedido para fechar o Congresso, ele iniciou conversas com o Centrão para formar uma base de apoio. Cessaram as afrontas ao Supremo e até se buscou um entendimento nos bastidores, sem muito sucesso.

O presidente amenizou, assim, alguns de seus defeitos, apontados pelos críticos, mas incensados por seus seguidores. O resultado, obviamente, é positivo para ele. Deixou de ser visto como o principal fator de instabilidade da própria gestão.

A PANDEMIA
Acertou quem previu que o coronavírus provocaria morticínio em massa. Mas ninguém esperava chegar a agosto com uma média de mortes em 24 horas superior a mil pessoas e uma enorme angústia sobre o futuro. Isto aponto eu, não a pesquisa: se a pandemia tivesse terminado em maio, os mortos teriam sido 29.341, encontrando Bolsonaro no auge de seus delírios negacionistas e de sua pregação golpista. Não custa lembrar, adicionalmente, que sua aprovação nunca foi inferior a 30%.

A renitência da pandemia entre nós, o número de mortos a tal ponto elevado que fez setores consideráveis da população migrar da estupefação para a indiferença e uma certa sensação errada, nesses grupos, de que o distanciamento, no fim das contas, pode ter sido irrelevante... Bem, tudo isso contribuiu para diminuir a resistência a Bolsonaro.

Em si, os números não são espetaculares, mas são bastante robustos quando se consideram a ruindade do governo, a irresponsabilidade do presidente e a tragédia social e econômica em curso.

Por Reinaldo Azevedo

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