O ex-deputado e ex-presidiário Roberto Jefferson resolveu aderir ao bolsonarismo virulento, emprestando — talvez o verbo seja outro — sua voz ao extremismo reacionário, populista e asqueroso. Só precisa tomar cuidado para não despertar os ciúmes de Carlucho. Jefferson, obviamente, é mais rodado e mais preparado intelectualmente do que o chefe da zorra toda na Internet. Seu vocabulário vai além de 500 palavras. Maneja um elenco maior de recursos verbas e estilísticos e pode ir até mais fundo do que o Zero Dois em matéria de infâmia e pusilanimidade, ainda que não com o mesmo alcance. A parceria é evidente, com propósito definido no terreno do "é dando que se recebe".
O homem condenado a mais de 10 anos no processo do mensalão, no entanto, pode ter exagerado. Acho que não me engano ao apontar que se expôs a uma investigação e a um mandado de busca e apreensão em razão do que andou publicando no Twitter. Está cumprindo uma tarefa: Jefferson foi escalado para tentar jogar uma nuvem de fumaça no acordo do governo com o "fundão do Centrão".
Bolsonaro, como resta claro e como o tal vídeo vai evidenciar, decidiu vender uma parte do seu governo. Entrega a mercadoria — cargos —, e os deputados comprados evitam que se forme uma maioria de 342 votos para impichá-lo. Como fazer para que isso pareça, aos olhos das milícias digitais, algo digno — a "dignidade", claro!, de que essa gente é capaz?
Deixem com Jefferson! Será ele o "enganador de bolsomínions", atuando como animador de auditório daquela estranha gente sedenta de sangue e vírus — para os outros.
O FUZIL E A LEI DE SEGURANÇA NACIONAL
Vamos lá. Neste sábado, o valentão aparece no Twitter com um fuzil. A imagem vem acompanhada do seguinte texto:
"Estou me preparando para combater o bom combate. Contra o comunismo, contra a ditadura, contra a tirania, contra os traidores, contra os vendilhões da Pátria. Brasil acima de tudo. Deus acima de todos".
Uau! Que vigor reacionário!
Na foto, parece exibir um crachá de identificação. Talvez estivesse em alguma feira sobre arma, sei lá... O fato é que o doutor passa uma mensagem clara: "Não me contrariem — ou a Bolsonaro: vamos reagir armados".
Mas qual o seu alvo?
Na postagem anterior à do fuzil, Jefferson escreveu:
"Bolsonaro, para atender o povo e tomar as rédeas do governo, precisa de duas atitudes inadiáveis: demitir e substituir os 11 ministros do STF, herança maldita. Precisa cassar, agora, todas as concessões de rádio e TV das empresas concessionárias GLOBO. Se não fizer, cai."
É preciso haver um motivo para cassar concessões, não é mesmo? Qual? Estar descontente com o noticiário não está entre eles. Jefferson, que é advogado, sabe ser isso impossível. Sabe ainda que o presidente não dispõe de meios para substituir os 11 ministros do STF. Nada há a respeito na Constituição.
Ora, que Constituição? Ele, então, está defendendo que o presidente dê um golpe de estado — um autogolpe — , única maneira possível de destituir os ministros do tribunal. Se houvesse alguma dúvida a respeito, o post do fuzil esclarece tudo: ele está propondo luta armada, guerra civil, enfrentamento da ordem legal por intermédio das armas.
Estaria organizando algo nessa linha? Tendo a achar que não. Mas não falarei em lugar dele. Que arque com o peso de suas postagens. Fuzil é arma de uso restrito. Ele tem alguma autorização legal para possuí-la ou empregá-la?
Eu sei, reitero, que está cumprindo a missão de ocupar os bolsomínions com virulência ideológica para ver se estes ignoram a venda do país ao Centrão. Mas é preciso ter limites.
Mais: pouco importam suas disposições subjetivas, Jefferson está anunciando qual o caminho para os que estão descontentes com o Supremo: o fuzil. Em qualquer democracia do mundo, seria preso imediatamente. Na nossa, pode e deve ao menos ser processado com base na Lei de Segurança Nacional, a saber:
Artigo 18: Art. 18 - Tentar impedir, com emprego de violência ou grave ameaça, o livre exercício de qualquer dos Poderes da União ou dos Estados.
Pena: reclusão, de 2 a 6 anos.
Artigo 22: Fazer, em público, propaganda:
de processos violentos ou ilegais para alteração da ordem política ou social;
Detenção de 1 a 4 anos.
Nota: fazer tal pregação, segundo a lei, por meio de rádio e televisão rende aumento de um terço da pena. Um juiz sensato diria que, via Internet, o agfravante está caracterizado.
Artigo 23: Art. 23 - Incitar:
I - a subversão da ordem política ou social;
III - a luta com violência entre as classes sociais
Pena: reclusão, de 1 a 4 anos.
Art. 24 - Constituir, integrar ou manter organização ilegal de tipo militar, de qualquer forma ou natureza armada ou não, com ou sem fardamento, com finalidade combativa.
Pena: reclusão, de 2 a 8 anos.
Art. 27 - Ofender a integridade corporal ou a saúde de qualquer das autoridades mencionadas no artigo anterior. (Nota: o artigo 26 menciona o presidente do STF)
Pena: reclusão, de 1 a 3 anos.
No caso da tipificação do Artigo 24, é preciso investigar se o sr. Jefferson está ou não constituindo milícias armadas ou se está ligado ou trocando mensagens com pessoas que estejam envolvidas com tal crime.
É preciso entrar um pouco no passado de Jefferson para saber quem é esse que posa agora com um fuzil. Faço-o em outro post. A adesão à luta armada é coisa recente. Gordo ou magro, ele se limitava aos volteios retóricos de picadeiro, que valiam, como diria Regina Duarte, por um pum de palhaço. Antes ou agora, fico imaginando qual seria a sua destreza numa guerra civil.
Como seu vigor adesista é matéria de piada e escárnio no mundo político, então resolveu cobri-lo com o, digamos, verniz de um reacionarismo que deve deixar espantados até aqueles tiozões que gostam de molestar enfermeiros.
Pouco importa. O ex-deputado exibe uma arma pesada, sugere que, com ela, enfrentará os inimigos do governo, entre eles, como fica evidente, o Supremo — que, segundo diz, tem de ser demitido pelo presidente. Como não há lei para isso, está pregando golpe de estado de arma na mão. E pouco importa se a foto é antiga. Ademais, é presidente de um partido político que se prepara para integrar a base de apoio ao presidente.
Quanto tempo vai demorar até que o mais ousado deles sugira um atentado contra ministros do Supremo? E o que custa para que o mais ensandecido deles tente executar a tarefa? Pode não haver ainda o convite. Mas é licito concluir que há a sugestão.
Se o Supremo permitir que isso passe em branco — pode e deve agir —, estará estimulando, por omissão, a que esses ousados partam para a ação direta.
Detém os instrumentos legais para punir o absurdo. Se restar alguma dúvida sobre a necessidade da ação, basta indagar e responder: há democracia no mundo que permita esse tipo de coisa em nome da liberdade de expressão? A resposta? Ora, a óbvia!
Um comentário:
“Para tirar meu Brasil dessa baderna, só quando o morcego doar sangue e o saci cruzar as pernas.” - Trecho de samba gravado em 1991 por Bezerra da Silva;
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