O STF divulgou a seguinte nota do ministro Celso de Mello nesta segunda:
"Recebi a Equipe da Polícia Federal, chefiada pela Dra. Christiane Correa Machado, em meu gabinete, na data de hoje (18), que me atualizou sobre o andamento das investigações criminais e entregou-me um pen drive contendo vídeo e áudio da reunião ministerial de 22/04/2020. Após esse encontro, comecei, agora, a assistir ao vídeo, devendo liberar minha decisão até esta próxima 6ª feira, dia 22/05, talvez antes!"
VOLTO
Alinho-me, obviamente, com aqueles que defendem a divulgação da íntegra do vídeo. Deve ser das poucas concordâncias que tenho com o ex-ministro Sergio Moro, ainda que por razões, posso apostar, distintas. Eu não sou pré-candidato à Presidência da República nem fui fiel servidor de um governo fascistoide em busca de redenção para me viabilizar como um nome do centro.
Estou apenas apegado à lei, que de Moro nunca foi fã incondicional.
Se a regra prevista na Constituição é a publicidade, e o sigilo, a exceção, e se o próprio presidente não tomou os devidos cuidados para, então, fazer de sua reunião algo sigiloso, não há lei em que o ministro possa se amparar para determiná-lo.
Conhecemos frases soltas do presidente, transcritas pela AGU, que se referem ao inquérito aberto. Mas me parece que não se pode compreender adequadamente a qualidade e o sentido de um romance ou de um poema lendo-se apenas um trecho.
Aquela reunião tinha um espírito, tinha um sentido, tinha uma razão de ser. Dados os fatos posteriores, a gravidade da acusação e novas denúncias relacionadas ao caso, o interesse público cobra a divulgação da íntegra, ou sempre restará no ar a suspeita de algum arranjo — o que seria estupidamente injusto com Celso de Mello.
"Ah, mas há coisas sensíveis sobre política externa!" É mesmo? Coisa sensível debatida em meio a mais de duas dezenas de pessoas, que ali não estavam para decidir nada sobre o tema? Tudo indica que o que se viu e ouviu foram vitupérios a indicar a baixa qualidade moral e ética disso a que chamamos, por hábito, "governo"
Um ministro de Estado teria defendido, por sua vez, que os 11 ministros da Corte fossem presos; outra pediu cadeia para governadores e prefeitos...
OBRIGAÇÃO DO DECORO
O decoro é uma obrigação do homem público. É coisa tão séria que sua quebra rende perda de mandato no Legislativo e denúncia por crime de responsabilidade no caso do Executivo. A ele estão obrigados presidente e ministros. Não cabe a Celso de Mello, um firme defensor da ordem democrática, atuar com bedel de quem não consegue conter sua logorréia escatológica. Especialmente em tempos em que uns e outros ameaçam o tribunal com palavras ambíguas e em que o nosso candidato a imperador acha que pode atravessar o Rubicão que separa o STF do Palácio do Planalto, de máscara na cara, para intimidar um Poder da República.
Condescender agora com a irresponsabilidade corresponde a dar azo a novos atos irresponsáveis. Se uma reunião ministerial se realiza em clima de arruaça de cervejaria, não será o Supremo a servir de filtro.
Da solicitação do vídeo a esta data, cresceram as razões para que se conheça a íntegra da reunião. Não se tratava de assunto privado em ambiente privado. De assunto publico em ambiente privado. De assunto privado em ambiente público. Mas de assunto público em ambiente público. Sobre o qual, reitero, não se apelou à lei que garante sigilo.
Exigi-lo, agora, corresponde a tentar corrigir, pela via do oportunismo, um eventual dano no qual não pensaram homens públicos aos quais o decoro é dever, não uma escolha.
Por Reinaldo Azevedo
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