Braga Netto, Luiz Eduardo Ramos e Augusto Heleno, os generais do Planalto, vivem um duplo constrangimento. Terão de depor na Polícia Federal. E serão interrogados como testemunhas de um crime. Devem lealdade ao acusado, Jair Bolsonaro. E nutrem admiração pelo acusador, Sergio Moro.
Os depoimentos do trio podem arruinar a Presidência de Bolsonaro. Ou esvaziar a investigação sobre o aparelhamento político da Polícia Federal, de forma a conspirar para que o inquérito resulte em nada. Se optarem pela pizza, os generais sentarão praça no destacamento do capitão.
No depoimento de mais de oito horas que prestou no sábado, Moro declarou que os ministros Braga Netto (Casa Civil), Luiz Ramos (Secretaria de Governo) e Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) presenciaram investidas de Bolsonaro para interferir politicamente em investigações da PF. Daí a necessidade de ouvi-los.
Os generais conhecem o histórico dos filhos de Bolsonaro. E sabem o que o pai é capaz de fazer para defendê-los e preservar a si próprio. Antes da crise que levou Moro a chamar o caminhão de mudança, extinguiram incêndios que retardaram um desfecho que poderia ter ocorrido no ano passado.
Seria mais simples para os três generais construir uma versão contemporizadora se estivesse em jogo apenas um confronto entre a palavra de Moro e a de Bolsonaro. Mas a PF extraiu do celular de Moro mensagens enviadas pelo ex-chefe. Há textos e áudios.
Considerando-se o aperitivo que já veio à luz, o material é tóxico. Sabe-se desde a semana passada que, numa mensagem de WhatsApp, Bolsonaro encaminhou a Moro notícia sobre inquérito que corre no STF. "PF na cola de 10 a 12 deputados bolsonaristas", anotava o título. E Bolsonaro: "Mais um motivo para a troca."
O presidente se referia à troca de Maurício Valeixo, então chefe da Polícia Federal, indicado por Moro, por alguém afinado com o clã Bolsonaro. Moro respondeu que as decisões relacionadas àquele inquérito eram de responsabilidade não de Valeixo, mas do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal.
Moro citou também pelo menos uma reunião em que os três generais testemunharam, em 22 de abril, uma investida de Bolsonaro para obter o escalpo do diretor-geral Valeixo; a troca do superintendente da PF no Rio, berço político de Bolsonaro; e a sistematização do envio diário de relatórios de inteligência da PF para o presidente.
A reunião foi filmada. E o procurador-geral da República Augusto Aras sugeriu ao relator do processo no Supremo, Celso de Mello, a requisição da fita. Participaram do encontro ministros e presidentes de bancos estatais. Moro não citaria a pajelança se o teor da gravação não fosse útil à acusação.
O inquérito que levou o presidente a desnudar suas intenções no WhatsApp apura a criação e difusão de fake news. Além de deputados, envolve filhos do presidente, sobretudo o Zero Dois, Carlos Bolsonaro. Um personagem que vive às turras com os generais do Planalto, incluindo o vice-presidente Hamilton Mourão.
Se exagerarem na muçarela e no orégano, os generais podem enganchar suas biografias e, por tabela, a imagem das Forças Armadas a um forno de assar pizzas. Arriscam-se a sair assados, pois Bolsonaro parece decidido a comprovar a acusação de Moro, cometendo a intervenção na PF.
Por Josias de Souza
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