Quarto ministro da Pandemia na gestão Bolsonaro, Marcelo Queiroga anunciou uma depravação em Brasília —o veto à vacinação de adolescentes— e foi exibir sua obscenidade em Nova York, ao lado do chefe. Antes mesmo do retorno do capitão e de sua comitiva, o Supremo Tribunal Federal deu uma banana para Queiroga, autorizando governadores e prefeitos a manter a rapaziada com mais de 12 anos na fila. Infectado pelo coronavírus, Queiroga não pôde embarcar no avião presidencial. Teve de ficar de molho nos Estados Unidos.
Em resposta a uma ação movida por cinco partidos políticos, o ministro Ricardo Lewandowski anotou em seu despacho que o plenário do Supremo já decidiu que os "entes federados" dispõem de "competência concorrente" para agir no combate à pandemia. Lembrou, de resto, o óbvio: decisões sobre a vacinação devem ser escoradas na ciência, não em argumentos esboçados em cima do joelho.
Pressionado por Bolsonaro na semana passada, Queiroga escorou o recuo na imunização dos adolescentes na alegação de que foram detectados cerca de 1.500 "eventos adversos" num universo de 3,5 milhões de jovens vacinados.
Como a desculpa soou esfarrapada, o ministro levou à mesa um cadáver. Alegou que entre as possíveis adversidades estaria uma jovem de 16 anos que morreu em São Bernardo do Campo depois de se vacinar. O governo de São Paulo e a Anvisa atestaram que a garota morreu de uma doença rara. Nada a ver com a vacina.
Queiroga ficou em situação tão precária quanto a de Bolsonaro que, no ano passado, tratara como evidência de insucesso da CoronaVac a morte de um voluntário que havia cometido suicídio. A despeito do vexame, o ministro manteve o veto à imunização dos adolescentes. Mas atualizou a desculpa. Passou esgrimir a tese segundo a qual é preciso priorizar a vacinação dos maiores de 18 anos.
Na prática, Queiroga reconheceu que mentia quando trombeteou que sobravam vacinas no Brasil. Na verdade, faltam ao redor do país vacinas da AstraZeneca para a segunda dose. Para completar o ciclo de imunização, espetam-se nos braços de adultos aflitos doses da Pfizer, a mesma vacina recomendada pela Anvisa para os adolescentes. Daí o lero-lero de Queiroga.
A banana que o Supremo deu para Queiroga não é senão uma outra versão do gesto exibido pelo ministro ao erguer o dedo médio para os desafetos que azucrinavam Bolsonaro nas ruas de Nova York. O ministro estará livre do coronavírus após cumprir quarentena de duas semanas. Mais difícil será livrar-se do vírus do bolsonarismo.
O gesto de Queiroga para os manifestantes equivale ao velho e bom "vai se f...". Coisa irrealizável e incompatível. De que imaginável maneira alguém poderia praticar a autofornicação, mesmo sendo contorcionista? De que modo alguém poderia considerar compatível com a função de ministro da Saúde um sujeito que se diz médico e não consegue perceber que, por trás do jaleco, deve haver uma noção qualquer de decoro?
A decisão do Supremo terá efeitos relativos, pois governadores e prefeitos já tinham dado uma banana para Queiroga, mantendo os adolescentes na fila da vacinação. O ministro ainda não notou, mas foi desligado da tomada por estados e municípios.
Administrações anteriores, marcadas por perversões e desvios, habituaram os brasileiros a conviver com um tipo específico de governo: o ruim. A gestão Bolsonaro expõe outro modelo de governo: o muito pior. Queiroga virou parte da depravação.
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