E continua o desembarque do capital da, se me permitem um clichê inescapável, nau dos insensatos de Jair Bolsonaro. A Febraban (Federação Brasileira de Bancos) decide enfrentar a intimidação e faz a coisa certa.
Como sabem, a Fiesp havia elaborado um manifesto intitulado "A Praça é dos Três Poderes". Não há ali um só ataque a Bolsonaro — e olhem que ele merece uma penca deles. Ao contrário até: o texto chama à harmonia entre os Três Poderes. Como o Supremo e o Congresso não ameaçam ninguém, o único que merece ter puxadas as grandes orelhas é mesmo Jair Bolsonaro. E ele as sentiu puxadas e reagiu.
Eis o problema: os termos do manifesto elaborado originalmente pela Fiesp — e depois miseravelmente negociado por Paulo Skaf com o governo — procede a uma defesa quase protocolar da democracia. Mas, ao fazê-lo, evidencia que o mal-estar toma o ambiente. E, como resta claro, só uma personagem responde por isso: o próprio presidente da República.
Assim, Bolsonaro resolveu tomar, notem o despropósito, a defesa da democracia como uma provocação pessoal, numa confissão — já nem se sei se involuntária — de que democracia ele não quer.
Como é sabido, os bolsonaristas Pedro Guimarães, presidente da Caixa, e Fausto Ribeiro, presidente do Banco do Brasil, se insurgiram contra a disposição de a Febraban endossar o documento da Fiesp. Contaram com o apoio de Paulo Guedes, ministro da Economia, que contou uma lorota, afirmando tratar-se de um documento contra o governo. Guimarães e Ribeiro ameaçaram desfiliar os dois bancos públicos da federação. Escrevo de novo se não ficou claro: eles se rebelaram contra a disposição de endossar um documento em favor da democracia.
Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, entrou em campo, e Skaf adiou, sem data, a divulgação do texto, embora já contasse com a adesão de mais de 200 entidades. E o fez sem consultar ninguém. Nem preciso discorrer sobre a impropriedade de tal comportamento.
Pois bem: a Febraban faz a coisa certa e reafirma a sua adesão aos termos daquele documento e à defesa da democracia.
Eis a nota divulgada há pouco pela federação de bancos. Depois dela, segue a íntegra do manifesto que já contava coma a adesão de mais 200 entidades empresariais e que Skaf decidiu amoitar..
A Federação Brasileira de Bancos (FEBRABAN) reafirma o apoio emprestado ao manifesto "A Praça é dos Três Poderes", cuja adesão se deu, desde o início, dentro de um contexto plurifederativo de entidades representativas do setor produtivo e cuja única finalidade é defender a harmonia do ambiente institucional no país.
A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP) assumiu a coordenação do processo de coleta de assinaturas e se responsabilizou pela publicação, conforme e-mail dirigido a mais de 200 entidades no último dia 27 de agosto.
A FEBRABAN considera que o conteúdo do manifesto, aprovado por sua governança própria, foi amplamente divulgado pela mídia do país, cumprindo sua finalidade. A Federação manifesta respeito pela opção do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal, que se posicionaram contrariamente à assinatura do manifesto.
Diante disso, a FEBRABAN avalia que, no seu âmbito, o assunto está encerrado e com isso não ficará mais vinculada às decisões da FIESP, que, sem consultar as demais entidades, resolveu adiar sem data a publicação do manifesto.
A FEBRABAN confirma seu apoio ao conteúdo do texto que aprovou, já de amplo conhecimento público, cumprindo assim o seu papel ao se juntar aos demais setores produtivos do Brasil num pedido de equilíbrio e serenidade, elementos basilares de uma democracia sólida e vigorosa.
O MANIFESTO CONHECIDO E ABORTADO
"A praça dos três Poderes encarna a representação arquitetônica da independência e harmonia entre o Legislativo, o Executivo e o Judiciário, essência da República. Esse espaço foi construído formando um triângulo equilátero, cujos vértices são os edifícios-sede de cada um dos poderes.
Esta disposição deixa claro que nenhum dos prédios é superior em importância, nenhum invade o limite dos outros, um não pode prescindir dos demais. Em resumo, a harmonia tem de ser a regra entre eles.
Este princípio está presente de forma clara na Constituição Federal, pilar do ordenamento jurídico do país. Diante disso, é primordial que todos os ocupantes de cargos relevantes da República sigam o que a Constituição nos impõe.
As entidades da sociedade civil que assinam este manifesto veem com grande preocupação a escalada de tensões e hostilidades entre as autoridades públicas.
O momento exige de todos serenidade, diálogo, pacificação política, estabilidade institucional e, sobretudo, foco em ações e medidas urgentes e necessárias para que o Brasil supere a pandemia, volte a crescer, a gerar empregos e assim possa reduzir as carências sociais que atingem amplos segmentos da população.
Mais do que nunca, o momento exige do Legislativo, do Executivo e do Judiciário aproximação e cooperação. Que cada um atue com responsabilidade nos limites de sua competência, obedecidos os preceitos estabelecidos em nossa Carta Magna. Este é o anseio da Nação brasileira.
Como se verifica, o texto da Fiesp não traz nem sombra de crítica a Bolsonaro -- redigido que foi, afinal, por um bolsonarista, coisa que a economia não consegue explicar.
Ocorre que a distribuição equânime de responsabilidades não serve ao presidente. Afinal, um golpista é, por natureza, essencialmente irresponsável.
Por Reinaldo Azevedo
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