A rachadinha, eufemismo para roubo de dinheiro público, é uma prática disseminada nas casas legislativas do Brasil. Mas nenhum outro político conseguiu executar o desvio com a sofisticação empreendedora de Bolsonaro. Ele chegou à Presidência da República como chefe de uma organização familiar que administra há três décadas uma holding da rachadinha. Fundado no mandato de Bolsonaro na Câmara Federal, o empreendimento ganhou pelo menos duas filiais nos gabinetes dos filhos Flávio e Carlos Bolsonaro.
A revelação de Marcelo Luiz Nogueira dos Santos, que conta ter sido obrigado a devolver mensalmente 80% de seu salário quando trabalhou no gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro, é a reiteração de um vício já dissecado. Diante de um escândalo tão escancarado, cada vez que Bolsonaro dá uma de cachorro louco constrange alguém no Brasil.
O Supremo Tribunal Federal precisa explicar, por exemplo, por que contribuiu com decisões que adicionaram mais de um ano de protelação no Bolsa Prescrição, o projeto criminal idealizado pela holding da rachadinha. O Superior Tribunal de Justiça fica devendo uma justificativa aceitável para o fato de ter enviado à lata de lixo documentos que atestaram desvios de mais de R$ 6 milhões no antigo gabinete do primogênito Flávio.
O próprio Bolsonaro, quando rosna para as instituições ao declarar que chama seus devotos às ruas no 7 de Setembro para defender a liberdade de expressão, deveria se sentir obrigado a explicar a dificuldade de se exprimir sobre as mordidas da rachadinha, incluindo as dentadas que chegaram à conta da primeira-dama Michele.
Mais embaraçoso do que o silêncio do patriarca sobre as perversões familiares, é ausência de Carlos Bolsonaro, um especialista em barulho que perdeu a língua depois que a Justiça concedeu ao Ministério Público autorização para apalpar seus dados bancários e fiscais. O Judiciário abandonar o papel de estorvo para que a primeira-família possa fornecer ao país as explicações que está devendo.
Por Josias de Souza
Nenhum comentário:
Postar um comentário