Não é a primeira e não será a última vez que gente do Planalto, graúda, vaza informações para depois acusar a imprensa de espalhar mentiras. Fez isso ao plantar a demissão do ministro da Educação Abraham Weintraub, ao confirmar desavenças com o ministro da Justiça Sérgio Moro e com o presidente da Câmara Rodrigo Maia, e outras tantas. O episódio Fox News só escancarou a prática.
O canal, reconhecido como porta-voz da direita e trumpista de carteirinha, divulgou a notícia de que o primeiro teste para Covid-19 do presidente Jair Bolsonaro dera positivo. Atribuiu a informação ao deputado Eduardo Bolsonaro. Obviamente, a notícia se espalhou na mídia brasileira, confirmada no anonimato por fontes do Planalto.
Pouco depois, o 03 tirou o corpo fora, negando que falara com a emissora. O correspondente da Fox News na Casa Branca, John Roberts, retrucou e, ainda que com delicadeza, chamou o filho do presidente de mentiroso ao vivo e em cores.
Na porta do Alvorada, um Bolsonaro despido da máscara que usara na live da quinta-feira, mostrou o laudo negativo do teste. De novo, deu uma “banana” para os jornalistas, como se eles tivessem inventado – até por torcida – o teste positivo que a Fox News noticiara. Mais tarde, mesmo depois de entrevistar Eduardo, a emissora manteve a informação.
A confusão é reveladora.
Ou Eduardo falou com a Fox News e foi aconselhado a voltar atrás, o que faz muitas pulgas pulularem por trás das orelhas – o presidente, mesmo com teste negativo, terá de ficar recluso no Alvorada por sete dias e realizar outro exame -, ou nada disse. Nessa hipótese, deveria acusar o jornalista americano e a Fox com a mesma ferocidade com que costuma rugir para a mídia nacional. Mas, ao contrário, foi às redes para afirmar que ninguém conseguirá intrigá-lo com a emissora querida dos amantes de Donald Trump.
O verdadeiro enredo talvez não venha à tona jamais. Mas o episódio deixa claro como o cerco do presidente age.
Faz correr notícias que serão negadas, como se elas fossem invenção da mídia, cujo intuito seria o de derrubar o presidente. Com tática semelhante à que usa para denegrir os políticos e a política, trabalha com afinco para tentar desacreditar o jornalismo sério e independente, que não reza o evangelho do presidente.
Mas a imprensa, a mesma que Bolsonaro e os seus insultam cotidianamente, é e continuará sendo a maior e a melhor aliada na prevenção ao novo coronavírus.
O ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, que tem desenvolvido um trabalho exemplar a despeito de seu chefe ter minimizado e chamado o surto de fantasia, fala todos os dias com jornalistas. Dá entrevistas, divulga fatos e números, repisa cuidados. O próprio presidente, acostumado às redes, já teve, por duas vezes, de se render à audiência televisiva para falar sobre o vírus para além de sua tribo.
No caso da batalha contra o novo coronavírus, a tentativa de desmoralizar a imprensa, bancando notícias falsas para depois enxovalhar jornalistas, é mais do que jogar abaixo da cintura. É inocular o gravíssimo vírus da desinformação. Da mentira.
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