quarta-feira, 18 de março de 2020

"Liberalismo pão com leite condensado e macarrão instantâneo" dá indigestão


Paulo Guedes dá uma de suas explicações sobre amanhãs sorridentes, e Jair Bolsonaro olha para o nada, pensando-se sabe-se lá o quê...  - Foto: Marcos Corrêa/PR/Flickr

Jair Bolsonaro está desesperado. E, ainda que, com outra inflexão, Paulo Guedes não menos. Um contava com um crescimento robusto da economia para levar adiante seus planos de reeleição. O outro tinha a fórmula perfeita que conduziria o país ao paraíso do liberalismo à moda antiga, que ele cultiva com tanta sobranceria intelectual.

As coisas já não vinham bem. E vão piorar muito, no mundo e aqui, com a pandemia da Covid-19. Depois de ensaiar resistência, Guedes parece que se verga ao óbvio: não há como o governo dar uma resposta quase burocrática apenas, a exemplo daquele seu pacote mandrake, que, na prática, não injeta um tostão na economia. 

A Bolsonaro, restou entrar no modo "negação". Onde deveria estar um estadista, então, que buscasse convencer a população da gravidade do quadro — solidarizando-se com as vítimas do vírus e buscando, claro, ao mesmo tempo, evitar o pânico —, encontramos um ser reativo, irado, convencido de que uma grande conspiração está em curso. Vive cercado de extremistas de direita, que colonizam aquele deserto que mantém entre as duas orelhas com lixo conspiratório.

Alguém, em algum momento, pode ter vocalizado ao presidente o raciocínio correto de que não se pode, sob o pretexto de combater o coronavírus, inviabilizar o país. Sim, é verdade! Mas isso nada tem a ver com atacar as medidas corretas que estão sendo tomadas pelos governadores e o esforço de reduzir ao máximo a interação entre as pessoas e sua circulação.

Ou por outra: pensar na economia não está em oposição a combater o vírus. Ao contrário: a melhor maneira de o Brasil reencontrar logo o caminho do crescimento — que já não se mostrava... — é enfrentar essa crise. Dos países atingidos, em que pese o bom trabalho de Luiz Mandetta, o Brasil é quem tomou as medidas mais suaves. Ontem à noite, Bolsonaro decidiu fechar a fronteira com a Venezuela. Não perde a chance do baixo proselitismo ideológico. "Não deveria fechar?" Respondo: deveria. Mas não só com a Venezuela, eis o ponto.

O presidente escolheu ficar sozinho, como uma espécie de herói da negação. Assim, mantém a adesão de seus fanáticos, que também não acreditam no vírus, e torce para que a pandemia pegue leve com o Brasil — nada indica que será assim — para que possa depois dizer: "Não falei que era exagero?" Acontece que ele só poderá dizer isso se as medidas a que se opôs surtirem efeito.

Temos de atuar, de fazer a coisa certa e, vá lá, de torcer um tanto para que não se dê o pior. É claro que o processo político e os brasileiros vão querer, no devido tempo, acertar as contas com Bolsonaro.

Qualquer que seja o desdobramento da crise e sua conclusão, cumpre não esquecer: Bolsonaro é aquele que se opôs às medidas racionais, sensatas e pautadas pelo conhecimento científico contra o coronavírus.

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