Depois do “Esqueçam o que escrevi”, Jair Bolsonaro lançou o “Esqueçam o que assinei”. No domingo à noite, o presidente editou uma medida provisória que permitiria suspender contratos de trabalho e salários por quatro meses. Em menos de 24 horas, ele informou que revogaria o próprio autógrafo.
A medida já começava a ser chamada de MP da Fome. A pretexto de socorrer as empresas, o Planalto empurraria a conta da crise para os trabalhadores. Durante 120 dias, eles ficariam em casa sem remuneração e sem garantia de voltar ao emprego.
A ideia ia na contramão do que têm feito outros países diante do choque do coronavírus. No Reino Unido, o governo conservador assumiu o pagamento de 80% dos salários de quem recebe até £ 2.500, o equivalente a R$ 14.900. Nos EUA, a Casa Branca promete enviar cheques às famílias mais vulneráveis.
No Brasil de Bolsonaro, o patrão “poderia” conceder uma “ajuda compensatória mensal” ao empregado. Em português claro, isso significaria trocar salário por esmola. A reação foi forte, inclusive em setores que aplaudiam a agenda de Paulo Guedes.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, chamou a MP de “capenga”. Pelo WhatsApp, senadores de diversos partidos iniciaram um movimento para devolvê-la ao Planalto. Seria uma humilhação e um sinal de derretimento do governo.
Em março de 2015, o Senado devolveu uma MP que reduzia a desoneração da folha de pagamento. Foi o início da derrocada de Dilma Rousseff. Cinco anos depois, Bolsonaro sentiu o risco de repetir o destino da antecessora. Ele recuou, mas não conseguiu evitar o sétimo dia seguido de panelaços.
O vaivém mostra um governo perdido na pandemia. Bolsonaro desperdiçou semanas preciosas com o discurso de que o coronavírus era “fantasia”. Agora que parece ter caído na real, não sabe o que fazer para amenizar os efeitos do tombo. O presidente decide e recua de improviso, ao sabor das redes sociais. Seu apelo a Guedes (“Tira porque eu estou apanhando muito”) ficará nos anais de uma gestão sem rumo.
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