quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

Desmatamento e terras indígenas ampliam denúncia contra Bolsonaro em Haia



O avanço do desmatamento e da invasão de terras indígenas passam a fazer parte das denúncias apresentadas contra o presidente Jair Bolsonaro no TPI (Tribunal Penal Internacional). Numa iniciativa submetida nesta semana, a Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), com apoio da Comissão Arns e do Coletivo Advocacia em Direitos Humanos, protocolou a nova comunicação, com o objetivo de atualizar a denúncia original e ampliar o detalhamento das ações realizadas por Bolsonaro.

A nova onda de denúncias ocorre pouco mais de um mês depois que em Glasgow, durante a Conferência da ONU para Mudanças Climáticas, o governo brasileiro lançou uma operação de sedução para tentar convencer a comunidade internacional de que Brasília estava comprometida com a proteção das florestas.

Escondendo os dados sobre desmatamento e ignorando a situação dos povos indígenas, ministros do governo Bolsonaro adotaram um discurso positivo em relação às negociações. Mas que foi recebido com alto grau de desconfiança por parte de governos, importadores de commodities e ambientalistas.

Em agosto, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil já tinha apresentado uma queixa contra o presidente brasileiro por crime de genocídio e crimes contra a humanidade contra os povos indígenas.

Na atualização entregue agora são detalhados os fatos praticados por Bolsonaro e seu governo entre os meses de julho e novembro de 2021 que levaram ao crescimento do desmatamento e destruição ambiental, da invasão em terras indígenas por garimpeiros e à morte de indígenas.

Desde 2020, o presidente é alvo de diferentes denúncias no TPI. Por enquanto, a procuradoria da corte ainda não tomou uma decisão se abre oficialmente um inquérito contra Bolsonaro. Mas está avaliando as informações recebidas para tomar uma decisão. Por ano, Haia recebe cerca de 700 queixas de todo o mundo, sobre dezenas de casos.

Fontes na corte confirmaram à coluna que cinco casos referentes ao presidente brasileiro estão em avaliação preliminar de jurisdição. Um deles foi descartado. Mas uma das tendências é de que a procuradoria opte por unificar todas as informações submetidas por diferentes grupos brasileiros e estrangeiros para avaliar se existe uma base razoável para abrir uma investigação.

Também precisa ser avaliado se o suposto crime é de competência do Tribunal Penal Internacional. Nessa etapa prévia, é realizada a análise sobre critérios de admissibilidade e se a investigação servirá aos interesses da Justiça.

O governo brasileiro vem tomando uma postura de que a corte apenas pode ser acionada se os instrumentos legais internos de um país são inexistentes, o que não seria o caso brasileiro.

Mas, para ONGs, ativistas e indígenas, a incapacidade de conduzir hoje um processo contra o presidente no país justifica levar a queixa até Haia.

"O pedido de vistas ao julgamento da tese do Marco Temporal e o relatório final da CPI da Pandemia e outros estudos técnicos subsidiam a atualização da denúncia, reforçando a incapacidade do sistema de justiça brasileiro em responsabilizar Jair Bolsonaro pelos crimes cometidos e em interromper o processo de genocídio contra os povos indígenas atualmente em curso no país", declaram as entidades.

"A comunicação sustenta que, sob a liderança de Bolsonaro, o governo federal adotou uma política anti-indígena de desmonte institucional dos órgãos de controle, que levou a intensificação da destruição ambiental e violência contra indígenas levando a impactos negativos sobre a vida e os territórios indígenas."

No novo texto submetido, a Apib, a Comissão Arns e o Coletivo Advocacia em Direitos Humanos trazem dados sobre episódios como a morte de duas crianças ianomami, que foram sugadas por uma draga operada ilegalmente no rio de sua comunidade, além do assassinato de dois indígenas dos povos isolados Moxihatëtëma por garimpeiros e a morte de um jovem indígena decorrente de atropelamento causado por um avião do garimpo ilegal.

"Paralelamente, há apresentação de atos de Jair Bolsonaro que explicitam sua política anti-indígena, como a visita presidencial a uma região de garimpo ilegal dentro da Terra Indígena Raposa Serra do Sol e os constantes acenos à ampliação do garimpo em terras indígenas", explicam as entidades.
Mortalidade e pandemia

Na petição, as organizações ainda apontam para a alta taxa de mortalidade entre os indígenas durante a pandemia da covid-19. Segundo eles, o índice chegou a ser até 150% mais elevado do que entre os não indígenas. Para os grupos, isso está relacionado ao desvio de vacinas destinadas a esses povos para garimpeiros em troca de ouro. Os fatos foram revelados pela CPI da Pandemia.

"A APIB imputa ao presidente Jair o cometimento do crime de genocídio contra os povos indígenas brasileiros e de crimes contra a humanidade (arts. 6º, b, c e 7º, b, h , k do Estatuto de Roma)", dizem as entidades.

Por Jamil Chade no UOL Notícias

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