A menos de uma semana da realização da prova que testará os conhecimentos de mais de 3 milhões de candidatos a vagas nas universidades públicas do Brasil, Bolsonaro declarou em Dubai que as questões do Enem "começam agora a ter a cara do governo." Conseguiu tornar ainda mais feio o já horroroso processo de desmonte do Inep, o instituto que cuida das provas do Enem. E tornou inevitável a convocação do ministro da Educação, Milton Ribeiro, para dar explicações no Congresso.
Os comentários do presidente chegam nas pegadas dos pedidos de exoneração de 37 servidores do Inep. Na véspera, alguns deles foram ouvidos pelo Fantástico. Contaram ao programa da TV Globo que pelo menos 20 questões da prova que será aplicada nos dais 21 e 28 de novembro foram alteradas por pressão política. Nas palavras de um dos entrevistados, as perguntas modificadas tratavam sobretudo da história recente do Brasil "dos últimos 50 anos."
Os servidores sustentam que a troca de perguntas não chegou a aviltar tecnicamente o exame. Será? Foi contra esse pano de fundo que Bolsonaro declarou que o Enem tem a cara do seu governo. Segundo ele, "ninguém precisa estar preocupado com aquelas questões absurdas do passado, temas de redação que não tinham nada a ver com nada."
Além de cuidar do Enem, o Inep produz as estatísticas sobre Educação no Brasil. Deveria ser visto como órgão de Estado, não de governo. Bolsonaro enferruja a credibilidade do instituto ao tratá-lo como propriedade particular, sujeita à sua visão arcaica do mundo.
Antes de despejar sobre os microfones as declarações tóxicas sobre o Enem, Bolsonaro conversou por telefone com Milton Ribeiro. A Comissão de Educação da Câmara deve convocar o ministro. O colegiado já ouviu na semana passada o presidente do Inep, Danilo Dupas, que não conseguiu explicar o apagão que levou à exoneração em massa dos servidores.
Agora, o ministro terá a oportunidade de explicar o que disse a Bolsonaro para inspirar a conclusão de que o Enem passou a ser o reflexo de um governo que já teve quatro ministros da Educação e não conseguiu produzir senão ruídos, inépcia e desmoralização.
Não é difícil imaginar como seria um Enem à imagem e semelhança de Bolsonaro. pelo menos uma questão de múltipla escolha seria incontornável. Rachadinha é:
A) Desvio de parte dos salários dos servidores do gabinete do Flávio;
B) Assalto à folha do gabinete do Carlos;
C) Uma modalidade de peculato que Jair implantou na Câmara e vem passando de pai para filho;
D) Todas as alternativas.
Por Josias de Souza
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