Formou-se no Supremo Tribunal Federal maioria a favor da restauração da moralidade orçamentária. Alheia às ameaças de conflito institucional, a Corte avalizou o despacho em que a ministra Rosa Weber enquadrou Bolsonaro, puxando-o de volta para dentro das quatro linhas da Constituição, e desativou o Pix usado por Arthur Lira, o réu que preside a Câmara, para distribuir verbas públicas à sua camarilha num esquema que deu ao Legislativo uma aparência de Chicago entregue aos caprichos de Al Capone.
Já ecoaram Rosa Weber em seus votos os ministros Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Alexandre de Moraes. Desse modo, prevaleceu o entendimento segundo o qual falta transparência às emendas usadas pelo Planalto para terceirizar ao centrão a compra de apoio parlamentar. As liberações feitas no escurinho violam princípios basilares da Constituição: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
A exemplo do que que sucedia em escândalos anteriores, estrelados pelos mesmos personagens que se juntaram ao redor de Bolsonaro, a perversão é escorada num vocábulo pomposo: governabilidade. Trata-se na verdade de um eufemismo usado para esconder outra palavra reles: safadeza. A pretexto de compor maioria, Bolsonaro institucionalizou uma mesada para os parlamentares que prestigiam os planos do seu governo. Arrebanhou votos até na oposição.
A perversão vinha sendo tolerada. Até que o Planalto e Arthur Lira decidiram usar o Pix secreto para construir, acima do teto de gastos, uma laje de R$ 91,6 bilhões. Dinheiro a ser gasto no ano eleitoral de 2022.
Sentindo-se onipotentes, o capitão e seus operadores esqueceram de maneirar. Alegaram que era preciso financiar o novo Bolsa Família de R$ 400. Lorota. O principal objetivo da emenda constitucional que leva no beiço as dívidas judiciais e manda às favas a responsabilidade fiscal era o de financiar uma nova rodada de emendas secretas no ano de 2022. Coisa de R$ 20 bilhões.
Com a decisão do Supremo, Bolsonaro pode redirecionar o dinheiro das emendas. Em vez de saciar os apetites do centrão e adjacências, pode aplacar a fome dos pobres que se encontram na fila do osso.
De resto, fica faltando cumprir a segunda parte da decisão já referendada pela maioria dos ministros do Supremo. Consiste em levar à vitrine, num prazo de 30 dias, a cara dos beneficiários da partilha orçamentária secreta. Será divertido descobrir quem plantou bananeira dentro dos cofres do Tesouro imaginando que permaneceria no anonimato.
Como o julgamento do Supremo prossegue, a banda bandalha do Legislativo ainda sonha com um voto redentor, que convença a maioria dos magistrados a podar os espinhos da decisão de Rosa. Imagina-se, por exemplo, que a transparência poderia ser adotada para o futuro, mantendo no breu os repasses feitos nos verões passados.
Por alguma desconhecida razão, as raposas do centrão avaliam que o ministro Gilmar Mendes levará ao plenário virtual da Suprema Corte uma posição intermediária. Deve-se torcer para que os encrencados estejam enganados. A imoralidade não comporta visões atenuatórias. O medo da turma das emenda$ dá uma ideia dos escândalos que estão por vir.
Por Josias de Souza
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