quarta-feira, 24 de novembro de 2021

Lula erra e municia rivais ao comparar Ortega a Merkel


O ex-presidente ula em viagem à Europa | Julien de Rosa/AFP

Lula marcou um gol em sua viagem à Europa. O ex-presidente se reuniu com líderes relevantes, recebeu homenagens e mostrou que ainda tem prestígio no exterior. Ao contrário de Jair Bolsonaro, esnobado no G20 e visto como pária na comunidade internacional.

Na última escala do roteiro, o petista pisou na bola. Em entrevista ao jornal El País, relativizou o autoritarismo na Nicarágua. “Por que a Angela Merkel pode ficar 16 anos no poder e o Daniel Ortega não?”, questionou. A jornalista Pepa Bueno desmontou a conversa com uma observação singela: Merkel nunca mandou prender opositores.

Após a correção, Lula admitiu que Ortega estaria “totalmente errado” se tiver prendido rivais. A ressalva não anula o fato de que ele tentou equiparar um autocrata a uma governante que sempre respeitou a democracia. Só em 2018, a repressão política na Nicarágua deixou 355 mortos e 100 mil exilados.

Há duas semanas, o PT festejou a eleição de fachada que validou o quarto mandato de Ortega como uma “grande manifestação popular e democrática”. A nota foi apagada do site do partido, mas Lula reincidiu no erro para defender o velho aliado.

Ao relativizar o arbítrio, o ex-presidente dá munição a quem o acusa de transigir com o autoritarismo de esquerda. E colabora com adversários que tentam compará-lo a Bolsonaro, defensor da tortura e do golpe de 1964.

Lula foi perseguido pela ditadura, subiu no palanque das Diretas e perdeu três corridas presidenciais sem questionar os resultados. Eleito, seguiu as regras do jogo e desautorizou aliados que queriam mudar a Constituição para presenteá-lo com um terceiro mandato. Em respeito à própria história, não deveria proteger antigos companheiros que buscam se eternizar no poder, como o ex-revolucionário Ortega.

A questão democrática estará no centro do debate brasileiro em 2022. Bolsonaro estimula o golpismo e já indicou que tentará virar a mesa se for derrotado. Quem quiser vencê-lo não poderá vacilar na defesa das liberdades civis, aqui ou no exterior. Ao afagar ditadores que se dizem socialistas, Lula alimenta falsas simetrias e agita um espantalho que só interessa ao capitão.

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