Não adianta. Eles são quem são, querem que a imprensa comente, e a imprensa deve fazê-lo, sim, a título também de registro histórico. São personagens de uma era que tem de ser devidamente caracterizada. Para que seja um dia superada.
O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), o Zero Três do presidente Jair Bolsonaro, pré-candidato a embaixador do Brasil em Washington, foi visitar o pai no hospital Vila Nova Star, na zona sul de São Paulo.
Em foto divulgada no Twitter, ostenta na cintura uma pistola.
O especialista em semiologia Roland Barthes tem um estudo sobre fotografia: "A Câmara Clara". Desenvolve a teoria do "punctum" — plural: "puncta". Os pontos de atração de uma foto, os "púncta", são os elementos que atraem o olhar.
Convenham: a nossa atenção já não é mais aguçada para um Bolsonaro numa cama de hospital, meio descomposto, exercendo o papel da vítima — o que, no caso, ele efetivamente é: ainda sofre as consequências da facada que recebeu de Adélio Bispo de Oliveira. O evento tem aspectos dramáticos, sim. Mas perdeu a atração da novidade.
De resto, já vimos a foto de Bolsonaro ao lado de outro filho, Flávio, na mesma cama, no mesmo hospital.
A novidade é Eduardo. É ele o elemento novo da cirurgia da hora. Sua mão está na guarda da cama, que, por sua vez, estabelece uma linha reta e descendente para o verdadeiro "punctum" da foto: a pistola na cintura.
Político pode andar armado? Segundo o Estatuto do Desarmamento, não. Mas policial federal sim. Eduardo é escrivão licenciado da PF. Certamente usa essa condição como justificativa. Não faz tempo, participou de um quadro no programa Silvio Santos ao lado de Flávio. Na foto de bastidores, lá estão os dois, com o empresário-apresentador entre eles. Eduardo traz a arma na cintura.
Bolsonaro é hoje o homem mais bem-guardado do país. É compreensível. O hospital em que está virou quase uma zona militarizada. Quem circula por lá constata a existência de agentes federais em cada canto. Qual a necessidade de Eduardo exibir, de forma tão ostensiva, a arma? Resposta: nenhuma! Está fazendo, queira ou não, um discurso político.
Só para lembrar: o decreto de Bolsonaro que amplia enormemente as categorias que podem andar armadas — incluindo os políticos — foi retirado e virou projeto de lei. Ainda não foi aprovado.
Mesmo que Eduardo apele à sua condição de escrivão da PF para portar uma arma, é evidente que, num hospital, onde se salvam vidas em vez de tirá-las, o decoroso seria que mantivesse escondida a arma, ainda que a portasse. Poderia, como fazem muitos policiais, mantê-la na parte de trás da cintura. Não! Ele faz questão de exibi-la — inclusive em desconformidade com a recomendação da própria PF.
Na página do órgão, encontra-se a seguinte recomendação sobre porte de arma:
"O titular de porte de arma de fogo para defesa pessoal não poderá conduzi-la ostensivamente ou com ela adentrar ou permanecer em locais públicos, tais como igrejas, escolas, estádios desportivos, clubes, agências bancárias ou outros locais onde haja aglomeração de pessoas em virtude de eventos de qualquer natureza."
Eduardo é o nome escolhido pelo pai para ser o titular da embaixada do Brasil em Washington.
Eis aí. O deputado exibe as suas melhores armas intelectuais para o cargo.
Por Reinaldo Azevedo
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