15.fev.2021 - O presidente Jair Bolsonaro em aglomeração em praia em São Francisco do Sul (SC) durante passeio de jet-ski Imagem: Reprodução/Facebook/Saochicoonline |
Bolsonaro engatou uma sequência de medidas e declarações que agradou o bolsonarismo-raiz e gerou indignação no naco racional da sociedade. Dois anos depois, reedita a tática carnavalesca do "golden shower", usando outras polêmicas para disfarçar a incompetência e a falta de rumo de seu governo.
Quem vê um presidente andando de jet ski e causando aglomerações propositais no litoral de Santa Catarina, na segunda (15) e no sábado (13), imagina que está tudo bem com a nação que ele "governa".
Porém, o Brasil ostenta: a) quase 240 mil mortos (oficialmente) por covid-19; b) uma média móvel com mais de mil óbitos por dia nos últimos 26 dias; c) a demora no retorno do auxílio emergencial que poderia tirar pessoas da fome causada pela pandemia; d) várias cidades interrompendo a imunização de idosos porque simplesmente não há mais vacina disponível.
Vale lembrar que quando era a hora de fechar com mais laboratórios acordos de compras de imunizantes, Bolsonaro preferiu fazer propaganda de remédios ineficazes no tratamento da covid e atacar a própria vacina, colocando em dúvida a sua segurança. Por causa da decisão do presidente, idosos permanecem em risco sem poder se vacinar.
Na esteira da cloroquina e da ivermectina, Bolsonaro anunciou, também nesta segunda, que vai testar com brasileiros um spray nasal que está sendo estudado por um centro de pesquisas em Israel para o tratamento da covid-19. O produto é usado contra o câncer de ovário.
A eficácia ainda não foi comprovada, mas o que importa é que o presidente tenha algo novo para apresentar no lugar da vacina. E empurrar todos de volta à vida normal, mesmo que a segunda onda ainda afogue multidões, diariamente em hospitais.
Feriado de carnaval acabou sendo usado na estratégia de comunicação de Bolsonaro
Nesta sexta (12), ele publicou quatro decretos, que aumentaram o limite de compra de armas e de munição por pessoa, além de ter dificultado a fiscalização de arsenais particulares. Milicianos e traficantes, que herdam armas adquiridas no mercado legal, e a galera que está na pilha de fuzilar a democracia caso o capitão perca a eleição de 2022, celebraram a decisão.
Ela deve ser revista no Congresso Nacional ou no Supremo Tribunal Federal. Mas até lá, pessoas vão usar o seu texto para comprar armas e o presidente usará o bafafá gerado para animar a base.
Bolsonaro também atacou a imprensa, afirmando, nesta segunda, que "o certo é tirar de circulação" jornais e sites que ele considera "fábricas de fake news". Claro que o fato de ele ter citado veículos de comunicação que denunciam os crimes que seu governo comete não é só um detalhe.
Disse, contudo, que não faria isso porque se considera um "democrata" - sim, Jair tem um senso de humor tão mórbido quanto sua visão de mundo. Gerou mídia na própria mídia.
Causar aglomerações nas praias, defender remédios experimentais, atacar a imprensa e, principalmente, editar decretos que liberam armas são formas de o presidente sequestrar a pauta, no momento em que sobe o tom de cobrança da população sobre o governo por conta da escassez de vacinas, de oxigênio, de auxílio emergencial e de vergonha na cara.
Excitados e felizes por conta de um presidente que atende sua pauta antidemocrática e violenta, um naco de seus seguidores mais fiéis acaba também por ignorar que o seu líder, eleito prometendo uma política sem tom-lá-da-cá, alugou a ala fisiológica do Congresso Nacional para fugir do impeachment e pavimentar sua reeleição.
Fomentar a impressão de batalha constante contra o mal é fundamental para que a base do bolsonarismo, que esteve com o presidente desde que ele perdeu a guelras e saiu da água, mantenha-se coesa e orientada a ficar firme com ele. Como lemingues suicidas.
Em 2019, Bolsonaro promoveu um vídeo de cunho sexual e depois elevou "golden shower" à categoria de polêmica nacional, afirmando que aquilo era a prova da baixaria do carnaval.
Com isso, alegrou uma parte dos eleitores radicais, renovando as promessas de apoio. Jogou fumaça naquilo que é impopular em seu governo, disfarçando a letargia em áreas importantes. E conseguiu avançar um pouco na disputa simbólica de sua pauta ultraconservadora.
Dois anos depois, aqui vamos nós de novo.
Em tempo: Bolsonaro montado num jet ski tornou-se uma das imagens icônicas do negacionismo presidencial após ele ter feito isso, no dia 9 de maio do ano passado, quando o país atingiu seus primeiros 10 mil óbitos por covid. Queria passar a imagem de normalidade para forçar a população a voltar às ruas. Acabou transmitindo que, em 9 de maio, não estava nem aí para as mortes. E que, neste 15 de fevereiro, continua não se importando.
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