Há no jornalismo uma máxima segundo a qual não existe pergunta constrangedora. O que constrange é a resposta. Jair Bolsonaro não suporta a imprensa que o imprensa. Quando imprensado, insulta, ameaça ou simplesmente sai de fininho, como fez nesta quarta-feira (24/02) em Rio Branco, no Acre.
Um repórter tentou questionar: "Presidente, qual a avaliação que o senhor fez da decisão do STJ ontem de derrubar a quebra dos sigilos fiscais...". Não houve tempo para mencionar o nome do primogênito Flávio Bolsonaro. O presidente cuidou de atalhar: "Acabou a entrevista".
Bolsonaro já deu respostas piores. "Pergunta pra tua mãe o comprovante que ela deu pro teu pai", declarou, por exemplo, quando um repórter quis saber se dispunha de comprovante de um empréstimo de R$ 40 mil que disse ter feito ao operador de rachadinhas Fabrício Queiroz.
"Estou com vontade de encher a tua boca na porrada", disse o capitão ao repórter que ousou inquiri-lo sobre os depósitos feitos por Queiroz e a mulher dele na conta da primeira-dama Michelle. Somaram não R$ 40 mil, mas R$ 89 mil.
A imprensa tem incontáveis defeitos. Mas desperta os instintos primitivos de Bolsonaro por conta de uma de suas principais virtudes: o cumprimento da missão jornalística de ajustar as aparências à realidade e não adaptar a realidade às aparências, como parece preferir o capitão.
Não é papel da imprensa apoiar ou se opor a governos. Sua tarefa é a de levar à plateia tudo aquilo que tenha interesse público. Bolsonaro vive às turras com a imprensa porque é um personagem paradoxal.
Cavalgando a democracia, o capitão já acumula 30 anos de mandatos eletivos. Mas não se constrange de submeter o brasileiro ao constrangimento de ouvir comentários como o que fez no último sábado: "Se tivesse que depender de mim, não seria esse o regime que estaríamos vivendo."
Por sorte, o regime democrático brasileiro não depende de Bolsonaro. Enquanto vigorar a democracia, os presidentes continuarão devendo explicações à sociedade.
O capitão logo perceberá que fugir da imprensa não resolve o problema. Qualquer autoridade com meia dúzia de seguranças pode se livrar de um grupo de repórteres. Difícil mesmo é escapar do espelho, cujo reflexo produz avaliações de uma franqueza irretocável.
Por Josias de Souza
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