sexta-feira, 22 de novembro de 2019

Aliança pelo Brasil: Bíblia (a deles), bala, antiglobalismo e hipocrisia



Ainda que em fase de criação, quando alguém disser "o partido de Bolsonaro", não estará se referindo ao partido ao qual ele pertence, mas ao partido que pertence a ele. 

O presidente da República também preside agora o "Aliança pelo Brasil", que teve nesta quinta o seu ato inaugural num hotel em Brasília. A vice-presidência fica a cargo do senador Flávio Bolsonaro (RJ). Jair Renan, o Zero Quatro, já dá os primeiros passos na política e foi feito vogal da legenda. Presente, o deputado Eduardo Bolsonaro (SP), ainda filiado ao PSL, não ocupa um cargo de direção porque correria o risco de perder o mandato.

O mesmo poderia acontecer com Carlos, o vereador, filiado ao PSC. Em sua fase reclusa, não deu as caras. Mas emplacou na direção Tercio Arnaud Tomaz, que integra o chamado "Gabinete da Raiva" — aquela turminha que se encarrega das diatribes truculentas no presidente nas redes sociais. 

A criação da nova legenda e seu ideário obedecem rigorosamente às prescrições de Olavo de Carvalho. Tanto quanto é possível fazer uma síntese da sua prefiguração, o Brasil não precisa de um partido de direita — segundo o ideólogo, ninguém saberia direito o que é isso no país, exceto seus alunos —, mas de um partido bolsonarista, que dê sustentação incondicional ao mandatário. Com apoio popular, ele teria condições de liderar uma revolução conservadora. A direita verdadeira nasceria só depois…

O ideário que vai se desenhando é uma mistura de caricatura de legenda de extrema-direita com hipocrisia. Entre os números disponíveis, Bolsonaro escolheu o 38. A alusão ao "trezoitão" é sutil como a família. Uma escultura feita com cartuchos de bala foi exibida no evento com o símbolo e o nome da legenda.

Leio na Folha: 
(…) a Aliança foi apresentada como "um partido conservador e soberanista", contra as "falsas promessas do globalismo" e "comprometido com a autodeterminação" e com as "tradições históricas, morais e culturais da nossa nação brasileira". 
(…)

As bandeiras caras ao presidente —​e que pautaram sua campanha ao Palácio do Planalto em 2018— foram elencadas como tópicos prioritários do programa da sigla. São eles: o "respeito a Deus e à religião", o "respeito à memória, à identidade e à cultura do povo brasileiro", a "defesa da vida, da legítima defesa e da família" e a "garantia da ordem, da representação política e da segurança". 
(…)

Também estão incluídos entre os nortes da sigla a defesa do livre mercado e do armamento da população, além de críticas ao aborto, à chamada ideologia de gênero nas escolas e ao que chamam de "ideologias nefastas" —como socialismo, comunismo, nazi-fascismo e globalismo.

ANTIGLOBALISMO? 
Durante a reunião dos Brics no Brasil, Paulo Guedes, o ministro da economia do presidente que se tornou dono de um partido "antiglobalista", estava a defender uma zona de livre comércio com a China. No documento final da reunião, os países se comprometeram com as metas do "Acordo de Paris". É o globalismo que leva o país a se candidatar a uma vaga na OCDE.

O "antiglobalismo" é hoje uma mera marca publicitária de vários partidos de extrema-direita mundo afora. É, curiosamente, o seu aspecto "cosmopolita". Ao tal globalismo — uma das faces que assumiria o demônio comunista — se atribuem boa parte dos males do mundo. Um dos objetivos desse mal a ser combatido seria a destruições das culturas locais, dos valores da família e da religião. Na sua expressão mais perversa, o dito-cujo se expressa como pacifismo e antiarmamentismo. Afinal, sem um instrumento para a autodefesa, os homens são mais facilmente dominados. Entenderam? Por isso a Bíblia da extrema-direita é irmã gêmea da bala.

Eis aí o ideário do modernizador do Brasil.

Por Reinaldo Azevedo

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