quarta-feira, 26 de abril de 2023

Bolsonaro adota mantra sobre 8/1: 'Nada a ver'



Bolsonaro coleciona dois encontros com a polícia em menos de um mês. No dia 5 de abril, foi inquirido sobre as joias sauditas. Nesta quarta-feira (26), lida com a suspeita de ser mentor intelectual do 8 de janeiro. Noutros tempos, falava dez vezes antes de pensar. Liberdade de expressão, dizia, enquanto produzia provas contra si mesmo. Hoje, está condenado à meia palavra. Ou a palavra nenhuma. A liberdade constitucional que mais aprecia é o direito de não se autoincriminar. Em relação ao quebra-quebra golpista, Bolsonaro acorrentou-se a um mantra: "Nada a ver". Pouparia o tempo dos interlocutores se gravasse essa expressão na testa.

Bolsonaro não tem nada a ver com os ataques aos prédios dos Três Poderes, como não teve nada a ver com o acampamento de bolsonaristas na frente do QG do Exército. Em 9 de dezembro, numa das várias falas dúbias que produziu após a derrota, disse aos devotos: "Quem decide para onde vão as Forças Armadas são vocês. [...] Vamos vencer. Se Deus quiser, tudo dará certo no momento oportuno". Mas ele não tem nada a ver com barracas armadas quando estava recluso no Alvorada. Nada a ver com o quebra-quebra, pois se encontrava no autoexílio da Flórida.

Uma minuta de golpe foi apreendida dentro do armário do ex-ministro da Justiça de Bolsonaro. Documentos e depoimentos confirmam que Anderson Torres mapeou as cidades onde Lula foi mais votado no primeiro turno. No segundo round, armou barricadas da Polícia Rodoviária Federal para dificultar o encontro de eleitores de Lula com as urnas. Nessa época, Anderson encontrou-se várias vezes com o chefe. Mas Bolsonaro não tem nada a ver com isso.

No depoimento sobre as joias, em 5 de abril, Bolsonaro fez pose de pobre-coitado. Alegou que, mantido no escudo por Bento Albuquerque, o ministro que transportou presentes como se fossem contrabando, tentou reaver na última hora os diamantes retidos na alfândega apenas para evitar o "vexame diplomático" de um inexistente leilão. No caso do golpe, Bolsonaro faz pose de cachorro chutado, como se apanhasse mesmo quando não tem nada a ver com nada. O problema é que, no seu caso, nada tornou-se uma palavra que ultrapassa tudo.

Bolsonaro foi incluído no inquérito que investiga a autoria intelectual dos atos golpistas por ter compartilhado no Facebook, dois dias depois dos ataques às sedes dos Três Poderes, um vídeo que sugeriu que a vitória de Lula foi fraudulenta. Ironicamente, esse é o único tópico do passivo judicial de Bolsonaro sobre o qual ele poderia dizer "nada a ver". Não foi o capitão quem realizou a postagem, mas o filho Carlos Bolsonaro, que gerencia os seus perfis eletrônicos.

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