Escondido atrás de um contracheque do Planalto desde que deixou o comando do Ministério da Saúde, o general Eduardo Pazuello atingiu o ápice do deleite: recebe mensalmente o contracheque sem o dissabor de ter que oferecer a contrapartida do derramamento de suor. O ócio remunerado está estampado na agenda oca de assessor, que exibe há um mês dois apontamentos: "Sem compromisso oficial" e "recesso". O escudo é fornecido pelo Exército, que sonega desde o ano passado acesso ao processo que premiou com a impunidade a indisciplina do general.
Já está entendido que as Forças Armadas preferem se desmoralizar a desagradar Bolsonaro. Mas a ideia de proteger a indignidade militar de Pazuello com um sigilo de cem anos é algo que não faz bem à democracia nem à República. A forma reiterada como o Exército se nega a levantar o sigilo centenário que impôs ao processo sobre a participação de Pazuello num comício ao lado de Bolsonaro desrespeita a inteligência alheia e desfigura o princípio republicano da transparência.
Submetido a requisições do jornal Folha de S.Paulo, o Exército negou novamente acesso aos papeis sobre a transgressão disciplinar do general, que escalou o palanque num ato político no Rio de Janeiro, em 23 de maio do ano passado. Alega-se que o caso envolve informações pessoais. Lorota.
A Controladoria-Geral da União, instância recursal, indefere todos os recursos. A CGU ignora o entendimento que vinha adotando em casos semelhantes de desrespeito à Lei de Acesso à Informação. Antes de Pazuello, o órgão vinha adotando o entendimento segundo o qual processos administrativos só devem permanecer em sigilo enquanto durar a apuração.
Consumado o veredicto, qualquer pessoa poderia requerer acesso à íntegra do processo. Costuma-se vedar apenas a divulgação de dados bancários e fiscais, além de "informações pessoais sensíveis de terceiros". Ou dados que possam levar "à identificação de eventual denunciante."
O único "terceiro" relevante envolvido no ato político de que participou o ex-ministro da Saúde é Bolsonaro. Não há denunciante no caso. O general produziu provas contra si mesmo ao ornamentar um comício fora de época de Bolsonaro. Algo que é expressamente proibido a militares da ativa.
É como se o Exército, ao impor sigilo a um caso banal, pedisse aos brasileiros para fazer como os generais do Alto Comando, fingindo-se de bobos para não atiçar os maus bofes de Bolsonaro. É preciso questionar judicialmente esse vexame.
Por Josias de Souza
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