sexta-feira, 28 de janeiro de 2022

Bolsonaro hipoteca o futuro (Editorial do Estadão)



Cortes na educação em 2022 afetam especialmente a educação básica. Bolsonaro despreza até o que seria,segundo o discurso, uma prioridade do governo

O governo Bolsonaro é ruim em muitas áreas, mas é especialmente sofrível na educação. Ao longo desses três anos, o presidente deu mostras seguidas de que desconhece a importância da educação para o presente e o futuro do País, como também não faz ideia do papel que a União deve ter na coordenação e no diálogo com Estados e municípios a respeito das políticas educacionais. Trata-se de um escândalo completo, mas é também a natural decorrência da própria natureza do bolsonarismo. Um grupo que só se dedica a destruir é necessariamente incompetente para lidar com uma área cuja essência é construir.

O governo Bolsonaro destrói até o próprio discurso. Sem nunca ter apresentado nenhuma proposta para a educação, o bolsonarismo optou pelo caminho das ideias simplistas – e equivocadas. Por exemplo, mais de uma vez, o Ministério da Educação de Bolsonaro criticou a ampliação do acesso ao ensino universitário, como se fosse um capricho caro, desnecessário e incapaz de contribuir para a produtividade do País. A prioridade bolsonarista seria a educação básica, que inclui as três etapas iniciais: educação infantil, ensino fundamental e ensino médio.

É uma obviedade, diga-se de passagem, priorizar o ensino básico. Ninguém discorda dessa ideia, nem mesmo quem defende ampliar o acesso à universidade. Afinal, a educação básica de qualidade é condição para qualquer avanço na formação das novas gerações.

No entanto, nem mesmo aquilo que seria, em tese, uma prioridade do governo Bolsonaro é levado a sério. Os vetos de Jair Bolsonaro relativos ao orçamento do Ministério da Educação de 2022 atingiram especialmente a educação básica. De um total de R$ 739,9 milhões de cortes na área educacional, R$ 402 milhões referem-se à educação básica, segundo o Todos Pela Educação.

A entidade emitiu um parecer mostrando preocupação com a decisão do governo. “A retomada das aulas presenciais, com todas as implicações decorrentes da pandemia, não suporta o corte no montante previsto e aprovado pelo Congresso na forma de emendas de comissão e de previsão de despesas discricionárias. Foram atingidas pelos vetos ações de responsabilidade do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) relacionadas ao desenvolvimento da Educação Básica (R$ 325 milhões), infraestrutura (R$ 55 milhões) e transporte escolar (R$ 22 milhões). Essas ações são utilizadas para apoiar Estados e municípios na educação básica, especialmente em programas estratégicos, como o fomento às escolas de ensino médio em tempo integral”, disse a nota.

Além disso, essas programações de investimento já vinham sendo objeto de baixa execução por parte do Ministério da Educação. Por exemplo, até o segundo quadrimestre de 2021, houve queda de 63% na dotação discricionária de infraestrutura da educação básica. O Todos Pela Educação alerta que a falta de prioridade do governo em relação à educação básica coloca Estados e municípios “à mercê das indicações de emendas impositivas e de relator”.

Esta é a realidade do governo Bolsonaro: incompetência, omissão e confusão. Nunca é demais lembrar que Jair Bolsonaro chegou ao acinte de nomear para a chefia do Ministério da Educação o sr. Abraham Weintraub, aquele que, no cargo, bateu recordes de ineficiência e agressividade e ainda saiu às pressas do País, após ser incluído como investigado no inquérito referente a ameaças contra o Supremo Tribunal Federal. Como se isso não bastasse, o sr. Milton Ribeiro, sucessor de Weintraub, é também especialmente hábil em manifestar sua absoluta falta de afinidade com a administração de políticas públicas educacionais.

Enquanto corta verbas do ensino básico, Bolsonaro se esforça para manter e até mesmo ampliar os recursos requeridos por parlamentares para se promoverem e disputarem eleições. Ou seja, Bolsonaro hipoteca o futuro das crianças – que não votam – para pagar a conta de sua sobrevivência política. Assim, a passagem de Bolsonaro pelo poder deixará sequelas terríveis nas próximas gerações.

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