Sob Jair Bolsonaro, o anormal vai assumindo ares de uma doce e persuasiva normalidade. Não bastasse manter Fabio Wajngarten no cargo de chefe da Secretaria de Comunicação do Planalto, o presidente permite que a conta da defesa do auxiliar suspeito seja espetada no borderô da Advocacia-Geral da União (pode me chamar de contribuinte).
O PSOL move na Justiça Federal de Brasília ação contra Wajngarten. Pede a intervenção do Judiciário para afastar dos cargos o chefe da Secom e seu adjunto, Samy Liberman, além de anular os atos praticados na gestão do assessor de Bolsonaro, iniciada em abril de 2019. Em vez de guerrear com advogado próprio, Wajngarten encostou sua defesa nas arcas do Tesouro Nacional.
Antes de ganhar um cargo no Planalto, Wajngarten era dono e administrador de uma empresa que presta serviços a emissoras de TV e agências de publicidade que têm contratos com a Secom. Depois de nomeado, Wajngarten manteve-se como dono de 95% das cotas da empresa. E entregou a gerência do negócio ao publicitário Fábio Liberman, cujo irmão, Samy Liberman, virou número 2 da Secom.
Apanhado no contrapé por reportagens da Folha, Wajngarten explicou-se. Alegou ter sido "orientado" pela Subchefia de Assuntos Jurídicos do Planalto, pela Advocacia-Geral da União e pela Controladoria-Geral da União. Pediram "que eu saísse do quadro de gestão" da empresa, disse Wajngarten, sem exibir papeis.
Clientes da empresa de Wajngarten, as emissoras Record e Bandeirantes e a agência Artplan passaram a receber percentuais maiores do bolo de verbas da Secom. Em defesa do secretário, a AGU sustenta que não houve favorecimento. Alega também que Wajngarten entregou declaração confidencial à Comissão de Ética Pública da Presidência. As informações contidas nesse documento preencheriam os "requisitos formais" exigidos para a sua nomeação.
O diabo é que a Folha obteve cópia da tal declaração confidencial. Tem oito folhas. Foi assinada em 14 de maio de 2019. Wajngarten fora nomeado no mês anterior. O documento contém omissões. Por exemplo: o chefe da Secom absteve-se de fornecer dados sobre o ramo de atuação de sua empresa e os contratos firmados com TVs e agências que recebem verbas da secretaria que passou a comandar.
Quando o caso ganhou as manchetes, Jair Bolsonaro informou que manteria Wajngarten no cargo. Deu de ombros para as interrogações: "Se foi ilegal a gente vê lá na frente". Foi como se o presidente declarasse, com outras palavras: "O futuro a Deus pertence." O que não se imaginava é que Wajngarten explicaria o passado nebuloso com o auxílio de advogados que o contribuinte remunera para defender os interesses da União.
Nesta terça-feira (4), descobriu-se que, a pedido do procurador Frederick Lustoza, do Ministério Público Federal em Brasília, a Polícia Federal abriu inquérito para investigar Wajngarten. Deseja-se apurar indícios de corrupção, peculato e advocacia administrativa, que ocorre quando um servidor público usa o cargo para defender interesses privados.
Há uma semana, quando o procurador requisitou a entrada da Polícia Federal no caso, Wajngarten celebrou a novidade como uma "oportunidade" para provar que não infringiu a lei. Reiterou a pregação nesta quarta-feira. Resta agora saber se fará isso por conta própria ou se continuará pendurando sua defesa no bolso dos brasileiros em dia com o Fisco.
Por Josias de Souza
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