quinta-feira, 14 de outubro de 2021

Arthur Lira rebatiza de transparência a desfaçatez



Em entrevista radiofônica, o presidente da Câmara, Arthur Lira, declarou nesta quarta-feira que a emenda constitucional que potencializa a interferência política no Conselho Nacional do Ministério Público é boa porque amplia a participação da "sociedade civil" no órgão responsável por fiscalizar a conduta de promotores e procuradores.

É preciso examinar bem os argumentos para não confundir um certo político com político certo. Arthur Lira, um réu que chegou à Presidência da Câmara com o apoio de Bolsonaro, é um personagem de biografia torta, acomodado na poltrona errada, no pior momento.

Na definição de Arthur Lira, a proposta impulsionada por ele traz novidades que aumentam a "transparência nas ações de controle" sobre o trabalho do Ministério Público.

Nos lábios de Lira, "sociedade civil" e "transparência" constituem as mais surpreendentes expressões para traduzir o vocábulo desfaçatez.

Ao elevar de dois para quatro os indicados do Congresso para o conselho do Ministério Público deseja-se ampliar o número de potenciais cúmplices de malfeitores no colegiado.

Ao estabelecer que o corregedor-geral do CNMP será escolhido pelo Legislativo, o que se pretende é contar com alguém que possa anular investigações, brecar inquéritos, abater em pleno voo processos contra políticos desonestos.

Segundo Arthur Lira, a proposta que compromete a independência funcional concedida pela Constituição de 88 ao Ministério Público servirá para acabar com a "impunidade" de promotores e procuradores. Gente que nunca é punida por eventuais transgressões.

Os membros do Ministério Público cometem muitos erros, mas Lira está preocupado com um tipo de impunidade que decorre não das falhas, mas dos acertos de procuradores e promotores.

Primeiro delator da Lava Jato, o engenheiro Paulo Roberto Costa trabalhou na Petrobras por 35 anos. Contou em depoimento que atuou em áreas técnicas por 27 anos sem nenhuma "mácula" em sua ficha funcional.

Paulinho, como Lula chamava o delator, enveredou pela trilha da corrupção quando o então presidente petista permitiu que o PP, partido de Lira, apadrinhasse sua ascensão ao cargo de diretor de Abastecimento da estatal.

Em 2018, Bolsonaro trocou o PP pelo PSL para surfar a onda anticorrupção que o elegeu presidente. Hoje, o mesmo Bolsonaro, depois de entregar cofres da Esplanada ao centrão, ensaia um retorno aos quadros do PP, para disputar a reeleição numa queda de braço com Lula, cuja ficha suja foi lavada pelo Supremo.

É como se a política brasileira entrasse num túnel do tempo, recuando à era da imoralidade antes de atingir o estágio da probidade.

Por Josias de Souza

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