Vivemos na era do surrealismo jurídico. A 69ª fase da Lava Jato, denominada Mapa da Mina, deflagrada desta terça-feira, tem o objetivo declarado de investigar se houve repasses ilegais de recursos da Oi e da Vivo para arcar com despesas de familiares do ex-presidente Lula. Para tanto, teriam sido usadas empresas que pertencem a Jonas Suassuna e a Fábio Luiz da Silva, um de seus sócios e filho de Lula.
Vamos lá.
Qual é a função da força-tarefa, também conhecida como Lava Jato? Investigar desvios de recursos ocorridos na Petrobras.
Quando é que a 13ª Vara Federal de Curitiba é o foro para a tomada de decisões judiciais? Quando estas dizem respeito à investigação de ilegalidades ocorridas na estatal.
O que têm a ver com a dita-cuja os alvos dessa nova fase da Lava Jato? A resposta inescapável, irremediável, incontestável é esta: ABSOLUTAMENTE NADA!
Suassuna é um dos donos do famosíssimo sítio de Atibaia, que fez com que Lula fosse condenado pela segunda vez em segunda instância, acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
As empreiteiras Odebrecht, OAS e Schahin fizeram melhorias no sítio, que era usado pelo ex-presidente e seus familiares. As benfeitorias aconteceram? Sim! Ao todo, ficaram pouco acima de R$ 1 milhão. A Polícia Federal e o Ministério Público conseguiram vincular esse desembolso aos contratos que as empresas mantinham com a Petrobras? Não.
Mesmo assim, a 13ª Vara Federal de Curitiba condenou Lula a 12 anos e 11 meses de prisão, pena majorada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região para 17 anos, um mês e dez dias. Insista-se: não há uma só prova que ligue as benfeitorias à Petrobras. Portanto, a exemplo do apartamento de Guarujá, também o caso do sítio não deveria estar a cargo da força-tarefa de Curitiba. Nem era a 13ª Vara Federal seu foro natural.
O que já era, portanto, uma espetacular forçada de barra para manter Lula na berlinda se transforma agora em verdadeiro deboche.
E se desfechou, sob o silêncio cúmplice da quase totalidade da imprensa — quando não com o aplauso —, esta 69ª fase da Operação que Nunca Vai Terminar.
Se vocês lerem as reportagens a respeito, verão que se investigam pagamentos de duas empresas de telefonia — a Oi e a Vivo — à Gamecorp e à Goal Discos. A primeira é uma sociedade entre Lulinha e Suassuna; a outra pertence apenas ao segundo.
O Ministério Público Federal sustenta que não há serviços prestados às telefônicas que justifiquem os desembolsos e investiga se estes não estão ligados a decisões tomadas por Lula quando presidente da República.
Muito bem! Estou eu aqui a descartar que tenha havido alguma irregularidade? A resposta, obviamente, é "não". Mas sou jornalista, não porta-voz da PF e do MPF. É de causar espécie, claro!, que uma operação que tem como alvo um dos filhos de Lula seja desfechada apenas agora, logo depois de ele deixar a cadeia.
Sim, é verdade: a PF havia pedido mandados de busca e apreensão e a preventiva de Lulinha em junho de 2018 — dois meses depois da prisão de seu pai. O MPF solicitou, então, mais prazo. A autorização só foi dada pela juíza Gabriela Hardt, da 13ª Vara Federal, em setembro deste ano. Os procuradores não viram a necessidade de prender o filho do ex-presidente, com o que concordou a juíza. Alguns problemas operacionais fizeram com que a coisa fosse para a rua só agora.
Voltemos ao centro da questão. Por que diabos esse caso está com a Lava Jato e por que seu foro é a 13ª Vara Federal de Curitiba? Resposta: POR CAUSA DO SÍTIO DE ATIBAIA. Parece uma brincadeira meio sinistra, mas é assim.
Então notem: a causa original que diz respeito ao imóvel e que levou Lula à segunda condenação já não tem vínculo nenhum com a Petrobras. A ação penal ficou com a turma porque as empreiteiras que reformaram o sítio, afinal, tinham contratos com a estatal. A justificativa é, por si, absurda.
E por que os pagamentos das telefônicas às empresas de Lulinha e Suassuna também estão sendo investigados pela turma? Porque parte do dinheiro recebido teria sido usada por Suassuna e por Kalil Bittar, seu sócio, para comprar o sítio. Ainda que assim fosse e que houvesse uma grana carimbada das empresas de telefonia para comprar o imóvel de Atibaia, pergunta-se: O QUE ISSO TEM A VER COM A PETROBRAS?
Resposta: nada! Logo, ainda que haja o que investigar, não é uma atribuição da força-tarefa, e o foro, por óbvio, não é a 13ª Vara Federal de Curitiba.
Caso se comprovem as safadezas, que cada um arque com o peso daquilo que fez. O que não é aceitável é que MPF e Justiça manipulem escancaradamente uma investigação para manter Lula refém da Lava Jato e da 13ª Vara. Não é decente fraudar a Justiça sob o pretexto de fazer justiça.
Por Reinaldo Azevedo
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