Um governante que se preocupa demais com o espelho acaba vendo apenas a si mesmo. No caso de Jair Bolsonaro, o espelho está nas redes sociais. É ali, na sua bolha, que o presidente se enxerga. Para assegurar que o seu prazer narcísico se prolongue, Bolsonaro fornece aos seus adoradores a matéria-prima que torna o reflexo das suas redes sociais tão fiel à sua própria imagem. Foi nesse contexto que Bolsonaro enfiou no debate sobre a TV Escola a figura do filósofo e educador Paulo Freire. É preciso entender o método de Bolsonaro.
A TV Escola é um canal de televisão. Já pertenceu à estrutura do MEC. Desde 2015, esse canal é gerido por uma associação de direito privado chamada Roquete Pinto. Em teoria, a TV Escola serve para aperfeiçoar o trabalho de professores e melhorar a qualidade do ensino. O contrato do MEC com a associação vence no final do ano. E o governo decidiu que não vai renovar.
A renovação do contrato custaria algo como R$ 70 milhões por ano. No total, custaria R$ 350 milhões. Num cenário de penúria fiscal, pode ser uma boa ideia interromper esse contrato. O mais adequado, porém, seria que o governo expusesse os dados técnicos que fundamentaram a decisão, explicando para onde será transferida a verba e o que será feito para equipar professores e melhorar o ensino.
Em vez de explicações, Bolsonaro se limita a dizer que a TV Escola é "totalmente de esquerda" e "deseduca" o público. E cita Paulo Freire, chamando-o de energúmeno e responsabilizando-o pelos péssimos resultados dos alunos brasileiros no Pisa, o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes.
Ora, Paulo Freire morreu há 22 anos. Notabilizou-se por desenvolver um método de alfabetização de adultos. Transformá-lo no demônio que fez da educação brasileira um inferno melhora o reflexo de Bolsonaro nas suas redes sociais. E libera o presidente da tarefa de expor ideias para o setor educacional. O que sobra é a impressão de que Bolsonaro não tem ideias para essa área tão prioritária.
Por Josias de Souza
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