domingo, 22 de dezembro de 2019

Impeachment ou parlamentarismo, o que se desenha



Um dia, o presidente Jair Bolsonaro diz que se seu filho Flávio Bolsonaro “errou e for provado”, lamentará como pai, mas que “ele terá de pagar o preço por aquelas ações que não temos como aceitar”. Foi em 23 de janeiro último, em Davos, na Suíça, onde Bolsonaro estava para participar do Fórum Econômico Mundial.

Em outro dia, Bolsonaro diz que há um abuso do Ministério Público nas investigações sobre o desvio de dinheiro público que envolve Flávio e Queiroz e que pode atingir a família presidencial. E que é preciso controlar o Ministério Público. Foi ontem. E desabafou: “Agora, se eu não tiver a cabeça no lugar, eu alopro”.

Controlado, Bolsonaro jamais foi desde que, afastado do Exército por indisciplina entrou para a política e viveu quase 30 anos como deputado federal. Mas ao fim do seu primeiro ano de governo, ele dá sucessivos sinais de um descontrole exacerbado, o que levanta dúvidas sobre se terá condições de completar seu mandato.

Na última sexta-feira, Bolsonaro atacou um jornalista dizendo que ele tinha cara de homossexual. Nesse sábado, convidou jornalistas para uma conversa e disse, entre outras coisas, que é “um político tosco” e que na economia seu patrão é o ministro Paulo Guedes. Desejou Feliz Natal “mesmo sem carne para alguns”.

Não ficou por aí. Admitiu que está infeliz como presidente da República porque a vida “é muito sacrificante”. À parte os generais presidentes da ditadura militar de 64, presidente algum da redemocratização do país para cá queixou-se tanto do cargo e revelou-se tão pouco capaz de exercê-lo.

A facada de Juiz de Fora fez muito mal a ele. Mais à cabeça do que ao resto do corpo. Bolsonaro tornou-se um paranoico. Enxerga ameaças à sua vida por toda parte. Evita passear na área externa do Palácio da Alvorada com medo de ser assassinado por um drone. Veste colete à prova de balas. Tem sempre armas por perto.

“Não dá para saber tudo o que acontece dentro do governo”, constata. Desconhece que um presidente não precisa saber tudo o que acontece dentro do seu governo, apenas o principal. Que não precisa entender de tudo, mas cercar-se de quem entenda. Mas que há de ter bom senso e noção de para onde quer conduzir o país.

São qualidades que ele não tem. Sua eleição foi um acidente, resultado de uma conjuntura que não se repetirá. Seu governo é acidental. Parte dos que votaram nele já se arrependeram. A mais recente pesquisa IBOPE revelou que cresce a desaprovação ao seu desempenho. A palavra “impeachment” começa a ser ouvida.

O impeachment parece improvável em um país onde dois presidentes acabaram no chão no curto período de 23 anos. A adoção do parlamentarismo como sistema de governo não parece assim tão improvável. Quando nada porque, na ausência de um presidente funcional, é nessa direção que se caminha.

A não ser seus devotos mais fiéis e irascíveis, Bolsonaro não deixará órfãos se cair ou se acabar ficando como um presidente decorativo.

Por Ricardo Noblat

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