No escurinho do plenário virtual do Supremo Tribunal Federal, o escárnio às vezes adquire uma doce e hedionda naturalidade. Desenvolve-se ali uma coreografia que retarda o check-in de Fernando Collor numa hospedaria do sistema prisional. O penúltimo movimento foi executado por Gilmar Mendes. Com um pedido de vista, ele suspendeu o julgamento de um recurso protelatório contra a condenação de oito anos e dez meses de prisão imposta a Collor pela Suprema Corte.
Essa foi a segunda suspensão. Em fevereiro, numa sexta-feira de Carnaval, Dias Toffoli já havia lançado mão de um pedido de vista-socorro. Decorridos 90 dias, presenteou Collor com um voto generoso. Prevê a redução da pena a menos da metade: apenas quatro anos. Coisa feita sob medida, pois o Código Penal anota que o condenado a pena igual ou inferior a quatro anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto."
Na contramão de Toffoli, o relator do caso, Alexandre de Moraes, e o ministro Edson Fachin votaram pela manutenção da cana superior a oito anos, em regime inicialmente fechado. Gilmar dispõe de 90 dias para expor seu judicioso ponto de vista sobre uma encrenca que começou em 2010, sob Lula 1, e virou escândalo em 2014, sob Dilma. Resultou no desvio de R$ 20 milhões dos cofres da BR Distribuidora, a antiga subsidiária da Petrobras onde Collor acomodou seus prepostos.
Enquanto o Supremo retarda a execução de sua pena, Collor perambula pelos salões de Brasília como se nada tivesse sido descoberto sobre ele. Foi ao Planalto no início de fevereiro, para a posse de Ricardo Lewandowski no cargo de ministro da Justiça. Dias depois, ornamentou com sua ficha corrida o plenário do próprio Supremo, na cerimônia de posse de Flávio Dino.
Quem observa de longe fica com a sensação de que a Justiça tarda, mas não chega para conduzir Collor à cadeia.
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