quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

Bolsonaro tortura fatos para tirar vacina de foco



Com um hirto 't' no início, outro 't' no meio, um 'or' gutural seguido de um 'ur' que evoca dor, TORTURA é uma palavra de cabelo em pé, assustada da própria significação. Desafiada, a ditadura instituída em 1964 converteu a tortura e a execução de adversários em política de estado. Debochar e duvidar dos suplícios impostos à torturada Dilma Rousseff, como fez Jair Bolsonaro, é um ultraje típico do ser desumano em que o personagem se converte sempre que lhe convém.

Há método na indignidade de Bolsonaro. Ele carrega afrontas no bolso desde os tempos de deputado. A diferença é que instilava ódio e desinformação em comícios realizados no plenário da Câmara. Agora, dispõe da tribuna especial que a Presidência da República oferece. Algo que o ex-presidente americano Theodore Roosevelt chamou de bully pulpit —púlpito formidável, numa tradução livre.

De um bom presidente, dizia Roosevelt, espera-se que aproveite a vitrine privilegiada para irradiar confiança e bons exemplos. Bolsonaro faz o oposto. Ele usa o cargo como palanque para envenenar o cotidiano. Produz insegurança e exibe práticas deletérias.

No momento, Bolsonaro tortura os fatos que enodoam o regime de 1964 para retirar de foco a realidade atroz de 2020, com tudo o que o ano evoca: do negacionismo à falta de vacinas. O capitão ainda não notou. Mas a tática é inútil. Negar fatos históricos como a ditadura e a tortura é difícil. Fingir que a inépcia governamental não tem nada a ver com a falta de vacinas é tão impossível quanto esconder mais de 190 mil cadáveres.

Por Josias de Souza

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