Ou Jair Bolsonaro tem uma estratégia capaz de causar inveja aos líderes dos países civilizados que correm para providenciar vacinas contra covid-19 ou o presidente brasileiro está acorrentado a uma tática suicida. Bolsonaro lida com a vacinação da mesma forma como lidou com todos os outros problemas, na base da transferência de responsabilidades.
Falando aos devotos do cercadinho do Alvorada sobre vacinas, Bolsonaro declarou: "Se tiver um efeito colateral ou um problema qualquer, já sabem que não vão poder cobrar de mim." Um presidente convencional diria algo assim: "O brasileiro deve ficar tranquilo, porque meu governo está agindo para prover vacinas rapidamente. E a Anvisa zelará para que elas sejam seguras e eficazes."
O país precisa de reformas econômicas? Bolsonaro diz que o governo já fez a sua parte. E transfere a responsabilidade para o Congresso. A ausência de vacina impõe a tática do isolamento social? O presidente se apressa em dizer que governadores e prefeitos terão de responder pelo tombo na economia. Chegou a hora da vacinação? Bolsonaro se auto-converte em garoto-propaganda do direito de não se vacinar. E passa a trombetear o risco de efeitos colaterais.
Se Bolsonaro estivesse certo na sua aversão à necessidade de assumir responsabilidades, ele seria um candidato imbatível não à reeleição, mas ao posto de gênio da humanidade. Se estiver errado, como a derrota de Donald Trump nos Estados Unidos faz supor, corre o risco de cair na sua própria armadilha.
Na próxima semana, os brasileiros assistirão pela TV ao início da vacinação dos ingleses. Na sequência, os telejornais exibirão franceses e alemães na fila da vacina. São Paulo diz que suas vacinas, uma vez certificadas pela Anvisa, começarão a ser aplicadas em janeiro. O governo federal prevê que não terá imunizantes a oferecer antes de março.
Bolsonaro imagina que desestimula a vacinação com suas declarações anti-vacina. Na verdade, seu lero-lero tóxico pode acabar provocando um benfazejo efeito colateral: um clamor pela vacina. O presidente pode ter de fazer por pressão o que proibiu o ministro Eduardo Pazuello (Saúde) de fazer por opção quando firmou convenio com o Butantan para a compra de milhões de doses da CoronaVac, a "vacina chinesa do João Doria."
Por Josias de Souza
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