quinta-feira, 10 de dezembro de 2020

A nação exige a nomeação da foca para a Saúde; ela é malabarista ao menos



Juro que não sinto prazer nenhum em escrever estas coisas, mais o fato é que Eduardo Pazuello é uma das figuras mais ridículas que já ocuparam a cena pública brasileira. Creio que as Forças Armadas, o Exército em particular, não se dão conta do desgaste de ter alguém como ele, um general da ativa, à frente do Ministério da Saúde. Seu despreparo é de tal ordem que já não pode mais ser considerado apenas um ministro trapalhão: ele se tornou a um só tempo o emblema e a caricatura do governo.

Por emblema, ele reúne as piores características da gestão bolsonarista: despreparo intelectual, ignorância técnica, truculência, aversão à ciência. Por caricatura, todos esses aspectos estão nele numa escala necessariamente ampliada porque, afinal, lida com a mais sensível de todas as matérias: a vida humana. Como a pressão dos fatos é permanente, isso faz dele também um falastrão.

Na reunião com governadores, na terça, este estafeta de capitão chutado do Exército afirmou que a Anvisa levaria ao menos 60 dias para certificar uma vacina, o que deixou a todos alarmados. O Reino Unido já deu início à vacinação emergencial. João Doria, em São Paulo, anunciou um calendário que prevê para 25 de janeiro o início da imunização no Estado.

Nesta quarta, em entrevista concedida à CNN Brasil, Pazuello veio com o que seria novidade, mas que não passa de mistura de desejos e orações subordinadas adverbias condicionais. Disparou a seguinte pérola:
"O uso emergencial pode acontecer agora em dezembro, em hipótese, se nós fecharmos o contrato com a Pfizer. O 'se' é porque o contrato está sendo fechado [...] Se a Pfizer conseguir autorização emergencial e a Pfizer nos adiantar alguma entrega, isso pode acontecer em janeiro, final de dezembro."

O ministro da Saúde do Brasil conversou com a empresa e não sabe se esta vai conseguir a autorização emergencial nem se disporá de vacina em prazo tão curto. Se, até o dia anterior, Pazuello parecia empenhado em tentar retardar a vacinação em São Paulo para tirar de João Doria o eventual benefício político decorrente do pioneirismo, agora, tudo indica, resolveu entrar numa corrida para ver se consegue antecipar ao menos algumas doses emergenciais. É claro que isso vai acontecer se isso, se quilo, se aquilo outro...

Ah, sim: com mais alguns "ses", afirmou este gênio da raça, a vacinação poderia começar em janeiro, quem sabe em fevereiro. Ele não tem a menor noção. Eventuais doses em dezembro seriam em "quantidades pequenas". Não, leitor amigo, você não se confundiu, e nós já estamos em dezembro, no dia 10 para ser preciso. Mais 21, e o mês expira. Parece que está em curso um esforço para mendigar algumas doses de vacina para que o governo negacionista que ele integra possa reivindicar o protagonismo.

Nunca se viu nada parecido no Ministério da Saúde e, acreditem, em Ministério nenhum. Eis aí o nosso especialista em logística. A vacina da Pfizer é a única que começou a ser aplicada. Por isso, o governo correu para ver se consegue alguma coisa. Até a semana passada, não custa lembrar, os valentes alegavam dificuldades técnicas para importar o imunizante porque precisa ser mantido, antes do descongelamento, a 70 graus negativos.

Não sei se entenderam: nesta quarta, o general falou em dar início à vacinação em janeiro ou fevereiro, com algumas agulhadas publicitárias em dezembro... Isso tudo, claro!, se, se, se etc. Há meros dez dias, falava-se que a imunização só começaria em março. Uma foca que soubesse equilibrar uma bola na ponta do nariz poderia ser mais útil na pasta do que o general Pazuello e seus milicos de pijama da Anvisa.

Até agora, fique claro, este professor de logística não conseguiu apresentar um plano nacional de imunização.

Já escrevi e reitero: se necessário, será o Supremo a autorizar as vacinas desde que a ciência ateste a sua eficácia. Em situação emergencial, a lei dispensa até mesmo o registro da Anvisa, conforme deixa claro o Inciso VIII do Artigo 3º da Lei 13.979, sancionada pelo próprio Bolsonaro.

Os governadores que tiverem condições de fazê-lo devem se estruturar para tentar comprar uma vacina — a que for possível. A resposta não sairá do general trapalhão. Ele mal consegue conceder uma entrevista que faça sentido.

Bolsonaro sempre quis um ministro da Saúde que não lhe fizesse sombra. Conseguiu. Pazuello ganha do chefe nos transes do abdômen, não nos dons do pensamento.

Por Reinaldo Azevedo

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