terça-feira, 25 de julho de 2023

Pacote pró-democracia completa trabalho iniciado na urna de 2022



Na definição de Heráclito, a lei é como uma cerca: quando é forte passamos por baixo; quando é fraca passamos por cima. A ideia de que a delinquência será resolvida com novas leis é como o sonho. A melhor maneira de realizá-lo é acordar para a realidade. Nesse contexto, o grande mérito do pacote antiarmas e pró-democracia anunciado pelo governo é a percepção de que o Estado brasileiro voltou a operar no modo racional.

O miolo do embrulho do ministro Flávio Dino, subscrito por Lula, contém um decreto desarmamentista, que entra em vigor imediatamente, e três propostas que dependem de aprovação no Congresso. Uma facilita o confisco de bens e a venda desses bens para reparação de danos causados por atentados contra a democracia. Outra endurece as penas previstas no Código Penal para os crimes contra autoridades e o Estado Democrático de Direito. A terceira proposta transforma em crimes hediondos os homicídios e as lesões corporais praticados dentro de escolas.

Num instante em que a preservação ambiental é vista pelo mundo como um ativo brasileiro, o pacote inclui também um plano para combater a criminalidade na Amazônia. Envolve investimentos de R$ 2 bilhões e a mobilização de 6 mil agentes, entre policias federais e estaduais. Todas essas iniciativas levam água para um moinho que se move num sentido contrário ao das engrenagens que levaram à institucionalização do regime de vale-tudo que vigorou nos quatro anos da Presidência de Bolsonaro, bloqueando o projeto de reeleição.

No pedaço que restabelece o controle de armas e atualiza a legislação de combate aos crimes contra a democracia e as autoridades do Estado, o pacote retira o Brasil dos trilhos da venezuelização de direita idealizada por Bolsonaro e traduzida no bordão segundo o qual "o povo armado jamais será escravizado".

Assim como o capitão brasileiro, Hugo Chávez, um coronel golpista, chegou ao poder pelo voto. No início, simulou respeito às instituições. Aos pouquinhos, corroeu a democracia por dentro. Comprou os militares, anulou o Legislativo, calou a imprensa e cooptou o Judiciário. Milícias bolivarianas armadas pelo governo passaram a vigiar e amedrontar a população. Mantido por Nicolás Maduro, sucessor de Chávez, esse modelo eterniza a autocracia venezuelana, dita de esquerda.

No Brasil, o projeto autocrata de ultradireita foi desmobilizado pelo eleitor nas urnas da sucessão presidencial de 2022. Ao contestar o sistema eleitoral, insuflando a animosidade antidemocrática que desaguou no 8 de janeiro, Bolsonaro sinalizou que detesta a realidade. Por uma emboscada da sorte, o eleitorado percebeu que a realidade é o único lugar onde se pode obter algo que se pareça com normalidade. O pacote desembrulhado nesta sexta-feira orna com a vontade manifestada pela maioria dos brasileiros.

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