O ministro Paulo Guedes (Economia) considera inoportuna a CPI da Covid. "Estamos em meio à pandemia. Isso é equivalente a fazer um tribunal de guerra durante a guerra contra o vírus", disse ele, em entrevista ao jornal O Globo.
Para Guedes, os responsáveis pela CPI sofrerão desgaste político. "Você acha que a classe política vai sair bem disso? Foi o que eu sempre falei: subir em cadáveres para fazer política numa hora dessas... Acho que a população brasileira não vai apreciar isso. Ela quer resolver o problema. Ela quer a preservação da vida e dos empregos."
Perguntou-se ao ministro se a investigação legislativa não pode levar à correção de rumos na gestão da pandemia. E ele: "Eu acho que levantar o tema, de que nós vamos fazer uma CPI, já estimularia a correção de rumos. Temos um desafio difícil pela frente: evitar que a politização da crise piore a gestão da crise."
Guedes manifestou o receio de que a CPI paralise as reformas econômicas que tramitam no Congresso. "Vacinação em massa e reformas é o ganha-ganha. Acho que precisa desse equilíbrio: de um lado, vamos fazer a CPI que eles acharem que é oportuno fazer, mas, por outro, não paralisem as reformas."
Ironicamente, a análise das reformas já estava paralisada no Congresso antes da pandemia e da CPI. Durante a entrevista, o ministro reconheceu que o próprio Bolsonaro não apoia 100% a agenda de reformas liberais prometida em 2018. "O presidente mesmo brinca que já foi 99% (o apoio às reformas). Agora é 97%, ele fala. Aí eu brinco: 'Não, presidente, o senhor está em 65%'."
O que Guedes não disse é que o suposto interesse pelas reformas ressurge justamente como reação à CPI. O governo tenta evitar que a investigação legislativa monopolize o noticiário. Faz isso com a ajuda do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), adversário político do relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL).
Guedes fala sobre as reformas como se uma mágica fosse fazê-las decolar. "Temos nos próximos 90 dias as reformas administrativa e tributária e os marcos regulatórios para destravar os investimentos."
Do modo como se expressa, o ministro parece preparar o discurso que fará num futuro próximo, para culpar alguém pelo fiasco do seu plano reformista. "Quer fazer a agenda de CPI, pense que estamos no meio de uma pandemia. Faça, mas com alguma moderação pra não desorganizar tudo. Tanto as medalhas quanto as avaliações nos tribunais de guerra são feitas logo após a guerra."
Crivado de críticas, assediado por pressões do centrão para desmembrar o seu mega-ministério e às voltas com baixas frequentes em sua equipe, Paulo Guedes não cogita deixar o governo. O ministro considera a si mesmo como um personagem indispensável ao governo Bolsonaro e ao país.
"Sem falsa modéstia, eu sei que fui crucial em momentos decisivos. Eu tenho um senso de responsabilidade muito grande. Não só com a pessoa que confiou em mim, que foi o presidente. Mas principalmente com quem ele representa, que são 200 milhões de brasileiros."
Guedes prosseguiu: "O senso de responsabilidade e compromisso com os brasileiros que estão lá fora são muito maiores que a preocupação de ficar bem na fotografia. É muito fácil falar: 'Não privatizaram duas ou três empresas, vou sair porque não estão me atendendo.' Como é que vai sair no meio de uma pandemia, com pessoas morrendo?"
Resta saber até quando Bolsonaro considerará o trabalho do ex-superministro da Economia essencial. A pergunta de Paulo Guedes —"Como sair com pessoas morrendo?"— não impediu o capitão de instalar no estratégico Ministério da Saúde uma porta giratória pela qual já passaram o ortopedista Henrique Mandetta, o oncologista Nelson Teich e o general Eduardo Pazuello. O cardiologista Marcelo Queiroga é o quarto ministro da Saúde. E não há segurança de que seja o último.
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