Impossível enxergar a olho nu traços de racionalidade na crise que Jair Bolsonaro criou com seu partido. O capitão briga com o PSL mais ou menos como o sujeito que salta do décimo andar e, ao passar pelo nono, proclama: "Até aqui, tudo bem."
Adepto do presidencialismo sem coalizão, Bolsonaro tinha no PSL o seu esteio. Imaginou-se que aproveitaria os primeiros meses no Planalto para engordar o partido. Mandou expulsar Alexandre Frota. E não atraiu um mísero parlamentar.
Na Câmara, o presidente vinha dispondo dos votos dos 53 deputados do partido. Ao tomar o caminho da porta de saída, foi seguido por apenas 19 deputados. Trocou o apoio de 100% pela lealdade de 35,8%.
Bolsonaro está obcecado pela ideia da reeleição. Pela lógica, deveria aproveitar a eleição municipal de 2020 para consolidar o PSL nas principais cidades do país. A legenda dispõe de dinheiro e tempo de propaganda no rádio e na TV.
Juntos, o fundo partidário (R$ 113,9 milhões) e o fundo eleitoral (R$ 245,2 milhões) do partido somarão R$ 359 milhões. Em vez de se entender com Luciano Bivarm dono do PSL, Bolsonaro criou um sururu que pode deixa-lo sem bancada e sem dinheiro.
Se deixar o PSL, Bolsonaro não coloca em risco o seu mandato, pois a Justiça Eleitoral já decidiu que ocupantes de cargos majoritários (presidente, senador, governador…) não estão sujeitos às regras da fidelidade partidária. Porém, os deputados que lhe são fieis podem ter os mandatos passados na lâmina.
Num esforço para evitar a queima de recursos e a carnificina de mandatos, Bolsonaro ensaia uma batalha jurídica. Enrola-se na bandeira da transparência e exige uma auditoria na contabilidade do PSL.
Bolsonaro ainda não sabe se conseguirá cavar um pretexto que sirva de "justa causa" para levar os deputados e as verbas do PSL. Mas já conseguiu consolidar-se como um político isento de nexo.
O presidente cobra transparência da direção do partido e, simultaneamente, apoia o filho Flávio Bolsonaro na briga judicial para arquivar o processo que responde por suspeita de peculado e lavagem de dinheiro. Exige rigor na gestão do fundo partidário, mas aplaude a conferência conservadora em que o filho Eduardo Bolsonaro enterrou mais de R$ 1 milhão em verbas públicas do partido.
Em queda livre, Bolsonaro vive, na altura do oitavo andar, a fase da reflexão: "Se nada me ocorreu até agora, continuo na briga", raciocina. Ainda não se deu conta de que, sem uma rede de proteção, o chão é o limite. Até onde a vista alcança, não há benefícios para o presidente na briga com o PSL. Ao contrário. A crise pode ser ruinosa.
Bolsonaro aposta todas as suas fichas no personalismo. No Congresso, fica ainda mais dependente do centrão. Na eleição municipal, pode ficar novamente restrito à bolha das redes sociais. Na sucessão de 2022, se não tiver resultados econômicos a exibir, arrisca-se a não receber dos eleitores nem bom dia, que dirá votos.
Por Josias de Souza
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