A gestão do procurador-geral da República Augusto Aras promove uma revolução. Já se sabia que, sob Aras, a Procuradoria adquiriu o hábito de desprocurar. Súbito, inventou a desdenúncia. O primeiro beneficiário da novidade é o deputado Arthur Lira. No intervalo de apenas três meses, este líder do centrão, aliado do Planalto, migrou da condição de denunciado para a de desdenunciado.
O prefixo 'des' empresta às palavras um sentido contrário. A Procuradoria desqualifica provas que havia considerado qualificadas. Desfaz o trabalho que fizera. Braço direito de Aras na Lava Jato, a subprocuradora-geral da República Lindora Araújo foi à jugular de Arthur Lira com a gana de um vampiro de Düsseldorf. Ao recuar, ganhou a aparência de uma reles bebedora de groselha.
O deputado foi acusado de receber propinas de R$ 1,6 milhão da construtora Queiroz Galvão. Coisa provada "para muito além de meras palavras de colaboradores", anotou uma Lindora sanguínea na denúncia de 32 páginas que protocolou em junho no Supremo Tribunal Federal.
Em sua versão groselheira, a mesma Lindora passou a identificar uma "fragilidade probatória quanto aos fatos imputados ao deputado." A doutora levou a Procuradoria a atingir o ápice da autossuficiência. Ela mesma acompanhou o inquérito, ela mesma cotejou os achados com os argumentos da defesa, ela mesma denunciou o acusado ao Supremo, ela mesma providenciou a desdenúncia.
Já houve na Procuradoria-Geral da República uma administração engavetadora. Houve também uma gestão que tratava denúncias como flechas. Quando se imaginava que a marca da Era Aras seria desprocurar, sobreveio a desdenúncia. O ineditismo é tão grande que talvez merecer uma atenção da Corregedoria.
Por Josias de Souza
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