segunda-feira, 11 de julho de 2022

Bolo macabro, novas mentiras do "Mito" e um vice nas profundezas do inferno



Escrevi um texto e gravei vídeo apontando a óbvia responsabilidade política de Bolsonaro e sua turma no assassinato de Marcelo Arruda. Até certo "jornalismo" prefere responsabilizar substantivos abstratos, como uma certa "radicalização", o que é ou canalhice política, ou covardia ou cumplicidade. Ou, ainda, as três coisas somadas.

O deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que pretende ser o intelectual da família, prova que estou certo. Comemorou seu aniversário no domingo com um bolo que trazia um revólver calibre 38 feito de glacê. "Ah, já estava encomendado antes do assassinato". É provável. Mas a postagem nas redes foi feita depois da morte de Arruda.

O homicida, Jorge José da Rocha Guaranho, é um bolsonarista fanático. Quer "limpar o Brasil" de petistas e esquerdistas, diz-se um cristão legítimo e, vejam vocês!, é um defensor fanático das armas. Nas postagens, misturam-se Deus, amor, revólver e criança.

Resistamos à tentação de "psicologizar" essa gente. O lobby das armas é um dos mais poderosos do mundo, e seus porta-vozes estão entre os mais bem-pagos. É o caso da família Bolsonaro? Não sei.

O que se tem? Velório de um petista assassinado por bolsonarista em Foz do Iguaçu e Eduardo estimulando sua filhinha a apagar a vela de um bolo com um "trezoitão". Também Marcelo Arruda comemorava seu aniversário. Morreu porque era petista. Não foi o extremismo abstrato que o matou. Foi um extremista concreto, estimulado por outros extremistas concretos.

Responsabilidade política é distinta de responsabilidade penal, o que não quer dizer que seja menos grave.

Jair Bolsonaro, o demiurgo da barbárie, ainda não se solidarizou com a família do morto, que deixa quatro filhos. Nem vai fazê-lo. Raramente se referiu às quase 680 mil vítimas de Covid e a seus respectivos familiares de maneira, vá lá, cordata ao menos. Ao contrário: o máximo que conseguiu, mas nem sempre, foi conter a agressividade. Tivesse prevalecido a sua tese, sabe-se lá quantos teriam morrido em decorrência da doença e do caos no sistema de Saúde.

Em conversa com seus apoiadores, preferiu reclamar da repercussão e atacar a imprensa. Afirmou:
"Vocês viram o que aconteceu ontem, né? Uma briga de duas pessoas lá em Foz do Iguaçu. 'Bolsonarista não sei o que lá'. Agora, ninguém fala que o Adélio é filiado ao PSOL, né? A única mídia que eu tenho é essa que está nas mãos de vocês aí".

Está contando mentiras várias e combinadas. A imprensa noticiou fartamente que o autor da facada que o atingiu tinha sido filiado ao PSOL entre 2007 e 2014, quando deixou o partido. À diferença de Bolsonaro, que tenta minimizar o episódio de Foz de Iguaçu, o partido divulgou uma nota no dia em que o então candidato do PSL foi ferido afirmando tratar-se de "um grave atentado à normalidade democrática e ao processo eleitoral". Já houve duas investigações a respeito. Há uma terceira em curso. Todas levadas adiante pela PF no curso do governo de Bolsonaro. Não há a menor evidência de conspiração política.

Há mais: nada há no ideário do PSOL que seja compatível com o ato de Adélio, ainda que ele fosse filiado à legenda à época. Mas não era. E havia tempo. Com efeito, a simples filiação não bastaria para tornar a agremiação corresponsável pelo desatino. Membros de um grupo podem, muitas vezes, fazer besteiras por conta própria.

Não tem a menor relevância saber se Guaranho, o assassino de Marcelo Arruda, tinha uma carteirinha de "Bolsonarista Raiz". Que eu sabia, essa excrescência — não essa — inexiste por enquanto. Reitere-se: não se cuida aqui de culpa à moda do direito penal. Fala-se de responsabilidade política.

Na quinta, Bolsonaro havia feito, na sua "live", pela undécima vez, a apologia das arma como instrumento de libertação política, o que é coisa muito distinta da autodefesa. Fez a mais explícita de todas as ameaças golpistas, dizendo que seus seguidores já sabem muito bem o que tem de fazer, que coincidiria com o que ele tem em mente. Nesta segunda, diga-se, voltou a atacar o TSE e a pôr em dúvida o resultado das urnas.

Bolsonaro não tem adversários políticos. Ou se está com ele ou se está contra ele. E então a pessoa passa a ser tratada como inimiga — o que vale até para ex-aliados. Se o opositor da hora é de esquerda, tanto pior. Porque aí deixa de pertencer à categoria dos humanos para ser tratado como coisa.

Esse é o "chefe de Estado" que se refere a Lula, um ex-presidente da República, como "O Nove Dedos", numa referência a um acidente de trabalho de que o petista foi vítima. O procedimento é amplamente conhecido: desumanize o outro, reduza-o a uma pecha ou a algo que considera desprezível e então o elimine. Como esquecer — e não se trata de comparação, mas de exposição da tese à circunstância extrema — que os nazistas associavam os judeus a ratos? Fica mais fácil eliminar ratos do que humanos, não é mesmo? A Santa Inquisição não queimava corpos humanos, mas carcaças que haviam sido tomadas pelo demônio.

Bolsonaro diz que a eleição deste ano é uma luta do bem contra o mal.

O bolo de aniversário de Eduardo pode estar a indicar que isso faz mesmo sentido.

MOURÃO
Em certa medida, mais do que o próprio Bolsonaro, Hamilton Mourão, o vice, demonstra que tipo de elite está no poder.
Ele resumiu assim o caso:
"É um evento lamentável. Ocorre todo final de semana em todas as cidades do Brasil, gente que provavelmente bebe e aí extravasa as coisas. [Eram] todos da área policial. Um era guarda municipal, o outro agente penal. Vejo de uma forma lamentável isso aí".

É preocupante? Ele resolveu apelar a uma metáfora para explicar por que não:
"Não, não é preocupante. Não queiramos fazer a exploração política disso aí. Vou repetir o que eu estou dizendo e nós vamos fechar esse caixão. Para mim, é um evento desses lamentáveis que ocorrem todo final de semana nas nossas cidades, de gente que briga e termina indo para o caminho de um matar o outro".

Um pai de quatro filhos é assassinado porque o homicida não gostava de suas escolhas políticas, e o vice-presidente, um general quatro estrelas da reserva, quer "fechar logo esse caixão".

Sim, é o fundo do poço. Mas não se enganem: é possível descer ainda mais. Até as profundezas do inferno.

Por Reinaldo Azevedo

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