Na era do jornalismo de compensação, versão negativa de "O bêbado e a equilibrista", dá para adivinhar. Vai-se dizer o mais confortável: tanto as centrais como os bolsonaristas levaram às ruas menos do que o esperado. E pronto: decreta-se o empate e, assim, busca-se não comprar briga com a Bozolândia. Mas não há empate. Manifestação à esquerda em 1° de Maio é quase burocracia, como prova o resto do mundo. Já os minions prometeram um novo 7 de Setembro, mas desta feita seria para valer. Moristas, inclusive, fizeram terror: seria arrasador, suposta culpa da polarização — leia-se: "culpa de Lula", claro? Afinal, Moro ainda sonha. E o arraso não aconteceu. Ainda não foi desta vez que se deu o assalto às instituições e ao Judiciário. A extrema-direita prometeu o "agora vai". E não foi.
"Então quer dizer, Reinaldo, que, em outubro..."
Não quer dizer nada. Eleição é outra parada. Mas a imprensa dos últimos dias mostra a eficiência da canalha para pautar o terror, especialmente nas colunas de notas, aquelas que dispensam um segundo parágrafo em que se deveria, ao menos, contextualizar o primeiro e único — geralmente uma fofoca sem fonte, plantada por hortelões da República em busca de ouvidos de aluguel. E como os há. Sobretudo para provar a bolsonaristas golpistas que, afinal, existe neutralidade na imprensa: a tal neutralidade entre a corda e o pescoço. Trata-se de um monte de valentes que se dizem, claro!, a favor do pescoço, mas fazem seu "hedge" em... corda.
A simples tentativa de estabelecer critério único para avaliar as duas manifestações (a das centrais e a dos bolsonaristas) expõe uma imoralidade inata. Uma, a das entidades sindicais — ou, se quiserem, a das esquerdas — só existe porque existe e resiste a democracia. Sem ela, o ato seria proibido, como foi durante muitos anos, no curso da ditadura. E foi a emergência dos movimentos dos trabalhadores a indicar as fissuras do regime ditatorial.
Já a outra manifestação, a dos bolsonaristas, quer justamente pôr fim ao regime democrático, que permite que seus adversários se manifestem. O suposto grito em favor da liberdade não resiste ao exame dos cartazes em favor do que seria, afinal, uma ditadura, já que se pedia abertamente, entre outras delicadezas, o fechamento do Congresso e do Supremo.
Bolsonaro compareceu ao ato micado de Brasília. Não discursou. Em São Paulo, com um pouco mais de gente — mas, sem dúvida, a menor de todas as manifestações golpistas desde 2019, quando começaram — exibiu-se um vídeo seu. E lá estava ele a vomitar indignidades obviamente golpistas, garantindo "lealdade a todos vocês" e que irá "aonde vocês estiverem". E se ouviu o papo do governo que "respeita os militares, defende a família e deve lealdade a seu povo". Mais do mesmo.
ATERRORIZANDO
Infelizmente, a máquina de plantar fake news e terror está funcionando. Não tenho como avaliar se isso interfere mesmo no resultado das eleições -- e ninguém tem, com certeza. Mas o filtro da imprensa profissional para reter as impurezas decorrentes da pura plantação estão desaparecendo. Não direi que são "ineficazes" porque, para tanto, seria preciso que houvesse a disposição para distinguir fascistoides de democratas.
Não há. Deliberadamente se tenta "normalizar" o bolsonarismo como um dos modos de ser do direito à opinião, ignorando-se as ameaças abertas que Bolsonaro faz a democracia — e as fez de novo neste domingo — e a pauta de seus seguidores.
E há ainda a extrema-direita de vertente morista, que pretende, contra os fatos, que o STF também tem culpa no cartório. Seria este, em parceria com Lula, em último caso, o responsável pelo golpismo bolsonariano, o que é uma tese delinquente.
Mas isso fica para outro artigo.
A conversa de que os atos bolsonaristas seriam arrasadores era só "fake news" anabolizada por "fake opinion". Golpismo "flopou" outra vez. Que a militância extremista a tanto se dedicasse, vá lá. Que o jornalismo profissional tenha, em parte, caído na conversa, aí só se explica por burrice, conivência ou soma das duas coisas.
Por Reinaldo Azevedo
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