sábado, 28 de maio de 2022

Bolsonaro fala de evangélicos como se eles não frequentassem o supermercado



Político em campanha que reclama de pesquisa eleitoral é mais ou menos como comandante de navio que se queixa do mar. Sacudido pelo maremoto de dados negativos que o eleitorado lançou sobre sua campanha por meio do Datafolha, Bolsonaro chamou de "canalhice" o pedaço da pesquisa que revela a divisão do eleitorado evangélico: 39% fechados com ele, 36% com Lula.

Agarrando-se a um jacaré como se fosse um tronco, Bolsonaro rosnou para a realidade: "Vai falar que os evangélicos estão divididos? Não sou unanimidade, não sou o dono da verdade, não sou a última palavra, o último biscoito do pacote. Mas falar que estão divididos?"

Os evangélicos somam 31% do eleitorado. Coisa de 45 milhões de votos. Olhar para essas almas como um bloco uniforme e monolítico não é o único equívoco a que está sujeito Bolsonaro. Equívoco maior é imaginar que a religiosidade imuniza os irmãos contra os efeitos da crise econômica.

"No tocante a evangélico, o lado de lá defende aborto, o lado de cá o contrário", disse Bolsonaro. "O lado de lá falou que vai colocar os militares, pastores e padres nos seus devidos lugares. Do lado de lá, os governadores do PT foram unânimes e fecharam templos e igreja".

O que Bolsonaro pede a Deus não é que seja feita a Sua vontade, mas sim que Ele se submeta à vontade de um presidente precário que demora a perceber que está sujeito à condição humana.

"O lado de cá não fala da boca pra fora, fala com o coração: Deus, pátria, família... O lado de cá defende família. O lado de lá, não. O lado de lá defende ideologia de gênero. Vai falar que os evangélicos estão divididos?"

Um pedaço do eleitorado evangélico tem muito respeito por Deus para considerar que Ele pode ser cúmplice da inépcia. Os cristãos não estão trancados nos templos. Eles também frequentam os supermercados. Ali, diante da gôndola, a carestia bate igual nos bolsos de quem tem fé e nas carteiras dos ateus.

O que impede o Todo-Poderoso de enviar um segundo dilúvio é a percepção fornecida pelo Planalto de que o primeiro não adiantou nada. Hoje, Ele prefere despejar raios e trovões sobre as pesquisas.

Por Josias de Souza

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