O Brasil assiste a uma transformação sui generis. Eleito com a promessa de promover uma vigorosa reforma fiscal, Bolsonaro passou os últimos dois anos e meio conspirando contra a pauta liberal de Paulo Guedes, seu ministro da Economia. Depois da reforma da Previdência, o governo não conseguiu levar à vitrine nenhuma outra transformação relevante capaz de reverter o cenário de ruína fiscal e produzir folga orçamentária. Agora, mesmo sem dinheiro, Bolsonaro manuseia uma agenda de candidato que não cabe no caixa do Tesouro Nacional.
Acompanhado de um séquito de ministros, Bolsonaro atravessou a via que separa o Planalto do Congresso para entregar ao presidente da Câmara, Arthur Lira, duas propostas que compõem o pacote da reeleição. Numa, sugere turbinar o Bolsa Família sem especificar a cifra. Noutra, propõe transformar dívida em receita, parcelando débitos judiciais do governo. O valor do novo Bolsa Família, rebatizado de Auxílio Brasil, depende do calote de dívidas sacramentadas em sentenças judiciais irrecorríveis.
Num país que convive com quase 15 milhões de desempregados e com o aumento dos índices de pobreza, o reforço do Bolsa Família é uma providência bem-vinda. Mas escorar o reajuste de um programa perene no parcelamento de dívidas é uma variante reciclada de um velho esporte: o ciclismo fiscal. Ao avalizar pedaladas análogas às que levaram Dilma ao impeachment, Paulo Guedes troca a condição de economista liberal pela posição de chefe do comitê de campanha à reeleição.
A movimentação dá uma ideia do que Bolsonaro é capaz de fazer para se manter no Planalto. Pela reeleição, o presidente pode ser a favor de tudo o que já foi contra. Para se contrapor a Lula, reforça um programa de distribuição de renda de aroma petista, que tachava de criminoso e eleitoreiro. E não se importa de reincidir em práticas fiscais que o deixam com uma indisfarçável aparência de Dilmo.
Por Josias de Souza
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