O texto-base da chamada Medida Provisória da Liberdade Econômica foi aprovado por 345 votos a 26. Com a devida vênia aos otimistas, não iria gerar um miserável emprego a mais na forma original e também não vai fazê-lo na forma referendada pelos deputados. Destaques ficaram para esta quarta.
Foram mantidos no texto:
– Autorização para trabalho aos domingos e feriados. Passa a ser obrigatório pelo menos uma folga no domingo a cada quatro semanas (era a cada sete semanas na versão anterior do texto). Ou seja, entre as folgas do trabalhador em quatro semanas, pelo menos uma delas tem que ser no domingo. Será possível trabalhar três domingos consecutivos.
– Previsão de que trabalho aos domingos será remunerado em dobro, salvo se empregador der folga compensatória.
– Permissão de registro de ponto por exceção à jornada regular, anotando apenas os horários que não coincidam com os regulares. Isso será feito mediante acordo individual ou coletivo.
– Ampliação de 10 para 20 do número mínimo de funcionários de uma empresa em que é obrigatório controle de jornada de trabalho.
– Exime empreendimento de baixo risco de licenças, autorizações e alvarás prévios para iniciar operação. A definição de baixo risco contempla, por exemplo, depósito e o armazenamento de produtos não explosivos.
– Atividades econômicas podem ser desenvolvidas em qualquer horário ou dia da semana, incluindo feriados, desde que sejam observadas normas ambientais, trabalhistas e de vizinhança, por exemplo
– Permite que as empresas dedicadas à inovação possam testar e oferecer, gratuitamente ou não, seus produtos e serviços para um grupo restrito de pessoas
– Emissão de Carteira de Trabalho preferencialmente em meio eletrônico.
– Libera a operação de agências bancárias aos sábados.
– Extinção do e-social.
Foram retirados do texto:
– Descanso obrigatório aos domingos apenas a cada sete semanas. Nesse caso, uma das folgas do trabalhador deverá ser aos domingos em quatro semanas.
– Previsão de que contratos de quem receber mais de 30 salários mínimos sejam regidos pelo direito civil, e não pelas regras trabalhistas.
– Permissão de trabalhos aos sábados, domingos e feriados em caso de necessidade do agronegócio.
– Fim do adicional de periculosidade para motoboys. A proposta estabelecia o fim do adicional de periculosidade de 30% para motoboys, mototaxistas e quem usa motocicleta para o exercício da profissão.
– Previsão de que multas sejam aplicadas por fiscais do trabalho apenas após a segunda visita, sendo a primeira educativa.
– Definição de que decisões trabalhistas sejam definitivas em primeira instância ao esgotar prazos de recursos.
– Previsão de que a Comissão de Valores Mobiliários poderia reduzir exigências para facilitar o acesso de companhias de pequeno e médio porte no mercado de capitais.
– Autorização para emissão de receitas digitais para compra periódica de um mesmo medicamento.
O QUE HÁ DE RELEVANTE, MAS É IRRELEVANTE?
O que de mais relevante é a questão do trabalho aos domingos. A Constituição trata do assunto no Inciso XV do Artigo 7º. Lá está escrito que o "repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos" é um dos direitos dos trabalhadores rurais e urbanos. Preferencialmente não quer dizer "obrigatoriamente".
O Parágrafo 1º da Lei 605, de 1949, em vigência, define: "Todo empregado tem direito ao repouso semanal remunerado de vinte e quatro horas consecutivas, preferentemente aos domingos e, nos limites das exigências técnicas das empresas, nos feriados civis e religiosos, de acordo com a tradição local."
Também a CLT, no seu Artigo 67, não obriga folga aos domingos nem define um padrão. Lá se lê:
Art. 67 – Será assegurado a todo empregado um descanso semanal de 24 (vinte e quatro) horas consecutivas, o qual, salvo motivo de conveniência pública ou necessidade imperiosa do serviço, deverá coincidir com o domingo, no todo ou em parte.
Parágrafo único – Nos serviços que exijam trabalho aos domingos, com exceção quanto aos elencos teatrais, será estabelecida escala de revezamento, mensalmente organizada e constando de quadro sujeito à fiscalização.
O Artigo 68 da mesma CLT abre brechas para o trabalho aos domingos. Leiam:
Art. 68 – O trabalho em domingo, seja total ou parcial, na forma do art. 67, será sempre subordinado à permissão prévia da autoridade competente em matéria de trabalho.
Parágrafo único – A permissão será concedida a título permanente nas atividades que, por sua natureza ou pela conveniência pública, devem ser exercidas aos domingos, cabendo ao Ministro do Trabalho, Industria e Comercio, expedir instruções em que sejam especificadas tais atividades. Nos demais casos, ela será dada sob forma transitória, com discriminação do período autorizado, o qual, de cada vez, não excederá de 60 (sessenta) dias.
De resto, a Portaria 604, de 18 de junho deste ano, já havia ampliado de 72 para 78 os setores que podem operar livremente aos domingos.
RISCO
A MP exime empreendimento de baixo risco de licenças, autorizações e alvarás prévios para iniciar operação. A definição de baixo risco contempla, por exemplo, depósito e o armazenamento de produtos não explosivos.
A questão é saber que diabo é "empreendimento de baixo risco".
Só para citar um exemplo bem pior, ao gosto destes dias: armazém para guardar Bíblias pode ser considerado de baixo risco, não? Salvo a estupidez interpretativa, o Livro Divino não ameaça ninguém. A menos que as instalações elétricas, por exemplo, sejam impróprias, e se estará estocando material inflamável em condições inadequadas.
Não é uma boa ideia em caso nenhum. O que moderniza o Brasil é acelerar as licenças, autorizações e alvarás, não dispensá-los.
As empresas que já operam aos domingos continuarão a fazê-lo. Duvido que submetam seus empregados ao estresse de trabalhar três domingos seguidos. As que não encontram mercado nesse dia não verão razão para mudar. Ainda que não precisem pagar o dia em dobro, terão de conceder uma folga durante a semana, o que pode criar contratempo, então, em dias úteis.
Mais: as leis nada dizem sobre o trabalho aos sábados. Ainda assim, a esmagadora maioria dos setores que operam de segunda a segunda inclui o dia nos rodízios.
Querem saber? Nos setores formais da economia, nada vai mudar. E o que é informal não depende de Medida Provisória nenhuma.
É um caso de muito barulho por nada.
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