segunda-feira, 26 de setembro de 2022

Um voto pela terceira via (de 2026)



Como devem agir, no primeiro turno, eleitores democratas de direita diante de uma disputa que, na prática, está reduzida a um enfrentamento entre um esquerdista (Lula) e um nacionalista autoritário (Jair Bolsonaro)?

Para esses eleitores, as eleições de 2022 ficaram com sabor de um campeonato em que ambos os finalistas são seus maiores rivais. O time do coração ficou pelo caminho. Restaria torcer pelo time pequeno, simpático, mas inexpressivo.

Mas essa analogia esportiva é limitada. Na realidade brasileira, temos razões de sobra para temer a campanha de segundo turno que dará prazo extra para que um extremista como Jair Bolsonaro parta para o tudo ou nada.

Mais fácil é prever o que ocorrerá caso ele vire o jogo e alcance a reeleição: não há, na história global recente, uma democracia que tenha reeleito alguém de vocação tão inequivocamente autoritária como Jair Bolsonaro, e, ainda assim, sobrevivido sem se descaracterizar.

Eleitores de direita que desejam ter a chance de, no futuro próximo, votar em liberais verdadeiros, conservadores genuínos e democratas honestos, com candidaturas competitivas, devem agir para que Jair Bolsonaro sofra logo a mais rápida e humilhante das derrotas, sendo batido no primeiro turno.

A derrota vergonhosa de Bolsonaro já no dia 2 de outubro será estratégica para a reorganização da direita brasileira. A humilhação de ser o único presidente a perder a reeleição, ainda mais sem nem sequer chegar ao segundo turno, fatalmente abalará sua liderança no campo direitista e conservador.

Isso dará a outros políticos de direita, mais comprometidos com a civilidade democrática, a chance de sair da sombra bolsonarista que hoje os ofusca. Derrotar Bolsonaro logo é votar hoje pela terceira via de amanhã.

Ao contrário de Donald Trump, outro populista sem apreço pela democracia, Jair Bolsonaro não tem um grande partido para lhe manter relevante quando perder o cargo. Podem apostar: Arthur Lira e Ciro Nogueira não gastarão nem capital político, nem dinheiro, nem tempo para manter cheia, em 2023, a bola de um Bolsonaro humilhado nas urnas.

Fora do cargo, sem o apoio do Centrão, sem a proteção institucional da Presidência da República e sem a camaradagem de uma Procuradoria-Geral da República que perderá, inclusive, competência jurídica sobre seus casos, Bolsonaro responderá a processos sem fim por tudo o que fez na Presidência. É bem possível que acabe condenado e inelegível, perdendo ainda mais relevância. Ninguém trabalhará para reabilitá-lo em defesa da democracia, pois é ele próprio quem a ameaça.

Sem partido, sem cargo e quiçá inelegível e multicondenado, sua liderança política terá dificuldades para se sustentar com grande força. Líderes ganham importância quando sua perspectiva de poder é crescente, porém fenecem quando essa perspectiva é decrescente. Lula foi exceção; a regra está mais para Aécio Neves.

Com uma derrota bem aplicada a Bolsonaro, talvez a direita mais radical e antidemocrática se recolha a ser o que era anos atrás: apenas uma franja marginal da política institucional, deixando de ser mainstream. Talvez se reduzam a uma falange sem tanto poder, liderada por uma família de radicais chafurdada em negócios suspeitos – mistura tropical dos Le Pen com os Sopranos. Talvez suas facções se decomponham em conflitos intestinos, pois os herdeiros do olavismo não se entendem com os filhos do capitão – e, para atrapalhar ambos os lados, haverá sempre um Weintraub, uma Janaína Paschoal.

Livre do abraço de afogados deste exército de Brancaleone que é o “bolsolavismo”, a direita civilizada poderá se reagrupar para fazer aquilo que se espera da oposição numa República funcional: fiscalização, pressão e negociação. Batalhará para que o ministro da Economia de Lula 3 seja mais Meirelles, e menos Mantega; para que o indicado ao Supremo Tribunal Federal (STF) seja mais Menezes Direito, e menos Dias Toffoli; para que Venezuela e Nicarágua sejam reconhecidas como ditaduras que são; para que órgãos de controle e combate à corrupção recuperem dentes e garras que Bolsonaro limou.

Lula, para confirmar seu compromisso com a sobrevivência da democracia brasileira além das eleições, haverá de reconhecer, respeitar e dialogar com essa direita democrática, até mais do que fez antes. Ele, que vê longe, sabe que, em algum nível, também depende dele e de seu governo a reabilitação da direita não extremista, que é essencial para uma democracia plural.

Há temas urgentes nos quais negociações honestas e esforços comuns entre esquerda e direita podem render frutos: uma reforma tributária que ataque desigualdades e melhore o ambiente de negócios, ou um plano ambicioso para proteção ambiental com estímulo à economia verde.

Imaginem que avanço quando forem esses os assuntos a nos ocupar. Quanto antes, melhor.

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