sexta-feira, 16 de setembro de 2022

Datafolha: até agora, povão dá uma banana aos truques ilegais de Bolsonaro



Qual é o coelho que Ciro Nogueira, ministro da Casa Civil, convertido ao bolsonarismo radical, ainda guarda na cartola? Quando ele iniciar, nesta sexta, o seu dia de hortelão auricular — aquele que planta "offs" no cérebro desocupado de certo colunismo —, vai afirmar o quê? "Olhe, nós temos aqui um pesquiseiro amigo, um pilantra que sempre produz os números que a gente quer ouvir. Publique uma notinha. Nem precisa dar os índices. Só diz que a gente está virando. Quebra essa pra mim, patriota. É nossa luta contra o comunismo".

Então tá.

Não faltam 16 meses para a eleição, mas 16 dias. É verdade: nas duas eleições presidenciais anteriores, os números se mexeram bastante nos 15 dias que antecederam o primeiro turno. Mas havia particularidades relevantes. Um acidente matara Eduardo Campos no dia 13 de agosto de 2014. Marina Silva assumiu a candidatura do PSB. Chegou a liderar as pesquisas de intenção de voto no primeiro e no segundo turnos, o que levou o PT a fazer o tal trabalho de desconstrução da sua imagem, que deixou cicatrizes. No embate de agora, a ex-senadora hipotecou seu apoio a Lula ainda no primeiro turno. Negociou com o petista uma agenda ambiental e reconheceu que derrotar Bolsonaro é um imperativo civilizatório.

Na eleição passada, em 2018, houve não um, mas dois fatores, vamos dizer, exógenos. O TSE só bateu o martelo sobre a inelegibilidade de Lula no dia 31 de agosto. Sergio Moro havia prestado seu grande tributo às forças da reação, condenando Lula sem provas. Mesmo preso, o petista liderava as pesquisas com formidável vantagem. Como, por razões políticas, o PT se negava a lançar outro candidato, houve pouco mais de três semanas para fazer de Fernando Haddad um nome nacional. E conseguiu colocá-lo no segundo turno. No dia 6 de setembro, Adélio Bispo dos Santos desfere a facada que elegeu o presidente do Brasil.

Neste 2022, o próprio governo decidiu se encarregar dos "golpes do destino". A vantagem de Lula se mostrava tão avassaladora nas pesquisas de opinião e estava tão claro que venceria a disputa no primeiro turno que urgia fazer alguma coisa, ainda que ilegal, ainda que inconstitucional, ainda que fraudulenta. A alternativa era aquele tal golpe de Estado, em que Bolsonaro vinha insistindo desde 26 de maio de 2019, quando promoveu o primeiro ato contra o Congresso e Supremo como parte da escalada para expandir o discurso da extrema-direita sanguinolenta.

A articulação golpista com empresários pançudos ou apalhaçados falhou. E então se decidiu jogar, deixem-me ver como chamo, duas "bombas do bem" na economia. Com a PEC do ICMS, derrubar-se-iam os preços dos combustíveis. E, com efeito, eles caíram. Com a PEC dos benefícios, comprar-se-iam os votos dos pobres. Ambas eram e são ilegais. Ambas eram e são inconstitucionais. Mas se tinha a certeza de que o STF não se atreveria, como não se atreveu, a comprar a briga.

E aí, então, pensaram os Liras e Nogueiras, "bastará correr para o abraço". As elites políticas brasileiras, que tiranizam os pobres, têm algumas certezas sobre as suas vítimas:
1: basta dar um dinheirinho, e eles correm para nos agradecer, de joelhos;
2: caso se note algum traço de rebeldia, ameace cortar a quentinha ou lhes tirar o emprego.

Pois é...

As patranhas ilegais de Bolsonaro até contribuíram para devolvê-lo ao jogo eleitoral. Fico cá a imaginar quais seriam os números não fossem as intervenções na economia. Até agora, no entanto, o presidente tem um encontro marcado com a derrota.

Falemos, pois, sobre a mais recente pesquisa Datafolha divulgada na noite desta quinta. O instituto ouviu 5.926 pessoas em 300 municípios entre os dias 13 e 15. A margem de erro é de 2 pontos percentuais para mais ou para menos.

PRIMEIRO TURNO E VOTOS ESPONTÂNEOS
Lula (PT) manteve os 45% da semana passada, e Jair Bolsonaro (PL) oscilou de 34% para 33%. Ciro Gomes (PDT) variou de 7% para 8%. Simone Tebet (MDB) conservou seus 5%, e Soraya Thronicke (UB) foi de 1% para 2%. Os demais não pontuaram. As diferenças numéricas se deram na margem de erro. Lula tem 48% dos votos válidos e persiste a possibilidade de vitória no primeiro turno. Quando se olham os votos espontâneos, talvez esteja em curso uma migração em seu favor: ele obtém seu número mais alto desde maio de 2021: tem 41% contra 39% na semana anterior. Já Bolsonaro oscilou de 31% para 30%. Ciro conserva os 4%.

SEGUNDO TURNO E REJEIÇÃO
No segundo turno, o petista avançou um ponto e tem 54%; Bolsonaro fez movimento oposto: de 39% para 38%. A diferença é de invulgares 16 pontos. Mais uma má notícia para o presidente. A rejeição a seu principal oponente oscilou para baixo: de 39% para 38%. Já aquela a seu nome fez o contrário: foi de 51% para 53%.

E olhem que o homem até tentou parecer mais manso em um bate-papo com aliados, dizendo que exagerou ao afirmar que não era coveiro quando indagado sobre mortos de Covid-19. No mais recente ataque feito por um deputado estadual de sua base à jornalista Vera Magalhães, alguns nomes do seu entorno houveram por bem censurar a boçalidade. Até agora, a maioria parece não acreditar que há uma alma de príncipe no ogro.

OS CORTES
Os truques eleitoreiros de Bolsonaro e de Paulo Guedes, que agora só cuida da reeleição, podem ter chegado tarde, não é? A bolha de crescimento não chegou aos mais pobres, que também não foram beneficiados pela deflação. Entre os que ganham até dois mínimos, Lula tem 25 pontos de vantagem: 52% a 27%. Na faixa entre dois e cinco, os 41% a 37% da semana passada em favor do presidente são agora 40% a 39%, mas é o petista que está com o número maior.

Na faixa de cinco a 10, uma mudança relevante: o ex-presidente vai de 34% para 35%, mas seu principal oponente caiu de 49% para 40%. Até entre os que recebem mais de 10 mínimos, a distância encurtou: Lula cresceu de 29% para 32%, e o atual variou de 42% para 41%. Guedes está certo de que operou um milagre econômico. Falta agora convencer os brasileiros de que isso aconteceu.

A desconexão de Bolsonaro com os pobres também se revela quando se veem os votos segundo a escolaridade: apanha por 54% a 27% entre os que têm o ensino fundamental (38%) e perdeu terreno entre os 40% com ensino médio: de 41% a 37% na semana passada para 44% a 34% agora. Bolsonaro aparece numericamente à frente entre os 22% com ensino superior: 38% a 36%.

O vexame do atual mandatário no Nordeste (27% do eleitorado) parece mesmo irreversível: perde para seu oponente por 59% a 22%. Aquele papo de exaltar os "cabras da peste" só encanta os seus fanáticos. No Sudeste (43%), houve uma mexida, mas em favor de Lula, que foi de 41% para 43%; Bolsonaro, de 36% para 34%.

Na semana em que o trogloditismo bolsonarista, mais uma vez, resolveu avançar contra a jornalista Vera Magalhães, a maioria das mulheres manteve distância do imbrochável. Nada se moveu: 46% a 29% para Lula. Aumentou a diferença em favor do petista entre os homens: de 43% a 39% para 44% a 37% agora.

O casal presidencial foi bem-sucedido em ganhar a maioria do eleitorado evangélico (27% do total), mas parece que a cruzada em favor de uma guerra santa já rendeu o que tinha de render: Bolsonaro oscilou de 51% para 49%, e Lula cresceu três pontos: de 28% para 32%. Ocorre que a vantagem do petista entre os católicos (50%) continua imensa, com ligeira alteração: de 54% para 51%; seu adversário foi de 27% para 28%. No grupo imenso dos sem-religião, em torno de 11%, 55% a 20% contra o "imbrochável cristão". Vale dizer: a pregação fanática que dá voto também tira.

A distância em favor de Lula aumentou no eleitorado jovem: 50% a 28% entre os que têm de 16 a 18 anos (eram 46% a 32%). Na faixa de 24 a 34, há um empate técnico: 42% a 38%. Mas o petista abre 14 pontos entre os que têm de 34 a 44: 47% a 32%.

ENCERRO
Bem, resta a Bolsonaro e à sua turma xingar o Datafolha e evocar, mais uma vez, forças do outro mundo para garantir a vitória, como vêm fazendo, com o sucesso que se vê. Neste mundo, a coisa não está fácil.

Ah, sim, ouvido de plantão: daqui a pouco o Ciro Nogueira liga para passar aquele número quentíssimo.

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