sexta-feira, 6 de outubro de 2023

Brasil consolida-se como mais antigo país do futuro do mundo



Celebrou-se neste 5 de outubro de 2023 o aniversário de 35 anos da Constituição que Ulysses Guimarães batizou de "cidadã". Reuniram-se no Congresso para celebrar a data os caciques da República. Estão em pé de guerra. Mas simularam harmonia. "Não vejo nenhuma crise", disse Rodrigo Pacheco. Para Luís Roberto Barroso a cerimônia demonstrou que há "plena harmonia e independência" entre as instituições. Coube a Arthur Lira sinalizar que a concórdia é cenográfica: "Um Poder não pode ser a bigorna e outro o martelo."

Difícil saber quem faz o papel de bigorna. Mas não há dúvida de que o martelo maltrata a cabeça dos brasileiros. O cidadão não aguenta mais a euforia cívica que costuma inundar a alma das autoridades a cada aniversário da Constituição de 88. Restaram duas escassas alternativas. Ou você é otimista ou é inteligente o bastante para detectar a empulhação. No momento, o grande avanço é a percepção de que a esperança é a última que mata.

Embora esteja repleto de imperfeições, o texto constitucional não é o problema. Nele, há um pote de mel repleto de direitos. O livrinho conserva a aparência de um guarda-chuva sob o qual o cidadão encontra proteção contra todas as intempéries. A questão é que a ausência de autoridades com disposição para converter palavras em inclusão social e aprimoramento institucional acaba convertendo a democracia moderna numa espécie de ferrão de abelha.

Em 1985, no alvorecer da redemocratização, não havia no Brasil telefone celular, TV a cabo, antena parabólica e cerveja em lata. Hoje, o progresso tornou-se um bem mal compartilhado. Em plena Idade Mídia, as redes sociais converteram-se em plataformas de promoção do ódio. O veneno infectou os valores democráticos.

A perspectiva de prosperidade é anterior à Constituição de 88. Stefan Zweig, autor austríaco mundialmente conhecido, publicou em 1941: "Brasil, País do Futuro." Nessa obra, Zweig anotou que o Brasil "quase não deveria ser qualificado de um país, mas antes de um continente, um mundo com espaço para 300, 400 milhões de habitantes, e uma riqueza imensa sob este solo opulento e intacto, da qual apenas a milésima parte foi aproveitada."

A opulência sob o solo já não está tão intacta. Trama-se até a prospecção do óleo armazenado nas profundezas da foz do Amazonas. Mas o proveito das riquezas é para poucos. O Brasil pós-Zweig ainda é um país desigual. O escritor já não está entre nós. Suicidou-se. Com os olhos voltados para o futuro, Zweig não suportou o presente de oito décadas atrás.

No momento, a proteção constitucional de 1988 revela-se precária como um guarda-chuva sem o pano que o recobre. Por ele passam, sem anteparos, a insensatez e todas as marteladas que maltratam os brasileiros e sua democracia. Vivo, Stefan Zweig talvez constatasse que o Brasil se tornou o mais antigo país do futuro do mundo.

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