quinta-feira, 5 de outubro de 2023

A pretexto de enquadrar o STF, Senado piora o que já melhorou


Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) realiza reunião com 15 itens. CCJ do Senado aprovou na manhã desta quarta-feira (4) uma PEC que altera as regras para pedido de vista e para decisões individuais.Mesa:presidente da CCJ, senador Davi Alcolumbre (União-AP);senador Paulo Paim (PT-RS).Foto: Pedro França/Agência Senado

Operando no modo chantagem, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou em 42 segundos proposta de emenda à Constituição que interfere no funcionamento do Supremo Tribunal Federal. A pretexto de aperfeiçoar o sistema decisório da Corte para prover segurança jurídica, os senadores pioraram o que Rosa Weber havia melhorado. Ignoraram resolução aprovada pelo Supremo em dezembro de 2022.

A proposta prevê que pedidos de vista passem a ser coletivos. E fixa prazo para a devolução dos processos em nove meses -seis, renováveis por mais três. Um retrocesso. Na resolução aprovada sob Rosa, o antídoto contra os pedidos de vista-bloqueio é mais eficaz. Manteve-se a prerrogativa dos ministros de requisitarem a vista. Mas, para evitar o engavetamento indiscriminado, os processos serão automaticamente liberados para análise dos demais ministros após um prazo de 90 dias.

A emenda do Senado proíbe a concessão de decisão monocrática que suspenda leis ou atos normativos que atinjam a coletividade, atos do presidente da República ou dos presidentes da Câmara, do Senado e do Congresso. Prevê também que decisões liminares tomadas individualmente sejam submetidas ao colegiado em até quatro meses. Na resolução providenciada por Rosa, medidas cautelares decididas na canetada por apenas um ministro precisarão, em casos de urgência, ser imediatamente submetidas à análise dos demais integrantes do plenário ou da Turma responsável.

Líder da chantagem, o senador Davi Alcolumbre, presidente da comissão de Justiça, não está interessado em melhorar o Supremo. Olha para o próprio umbigo. Candidato à presidência do Senado, opera para obter a simpatia e os votos da bancada bolsonarista.

Luís Roberto Barroso, o sucessor de Rosa Weber, reagiu instantaneamente. Declarou-se contra ideias controversas como a fixação de mandato para os magistrados e extravagantes como um projeto que autoriza o Congresso a derrubar decisões não unânimes do Supremo — uma bizarrice que vigorou no velho Estado Novo, durante a ditadura de Getúlio Vargas. Evocou em defesa do Supremo a ação redentora contra o negacionismo que infelicitou os brasileiros durante a pandemia e o golpismo que ameaçou a democracia. 
Tudo verdade.

Referindo-se especificamente ao conteúdo da PEC aprovada na votação relâmpago da comissão de Justiça, Barroso declarou não ver razões para mexer no funcionamento do Supremo. Meia verdade. É preciso levar a sério os avanços obtidos sob Rosa.

Por exemplo: Em decisão individual, o ministro Nunes Marques suspendeu as quebras de sigilo que a CPI do Golpe impôs ao bolsonarista Silvinei Vasques, o ex-chefe da Polícia Rodoviária Federal. Diante da péssima repercussão, Nunes Marques liberou a liminar para apreciação da Segunda Turma. O início do julgamento foi marcado para 20 de outubro, dois dias depois da data de encerramento da CPI.

Ou seja: A blindagem fornecida por Nunes Marques a Silvinei foi assegurada, pois a CPI não poderá mencionar em seu relatório final os dados sobre os sigilos bancário, fiscal e telemático do suspeito.

Todo brasileiro comprometido com o aperfeiçoamento institucional deve torcer para que a esquisitice aprovada na comissão de Justiça seja bloqueada no plenário do Senado. Simultaneamente, convém cobrar seriedade das togas. Para exigir respeito externo, o Supremo precisa se dar ao respeito.

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